Nos planos estava o assalto ao primeiro lugar. A derrapagem do Benfica na noite da Mata Real apimentou a ementa. A casa esteve a romper pelas costuras – sétimo jogo da temporada a superar a marca dos 40 mil espectadores. Tinha tudo para ser uma festa de arromba. Só que o prato principal desiludiu os anfitriões.

Os portistas continuam por fazer o que ainda não foi feito. Este domingo perderam a oportunidade soberana de chegar ao clássico no comando isolado da liga. Na prática, a igualdade a uma bola entre FC Porto e Vitória FC deixa tudo na mesma: um ponto de diferença entre águias e dragões. Vem aí um interregno para os compromissos internacionais. Depois, cimeira da Luz entre os dois principais candidatos ao título. Teoricamente, ambos abalados pelos resultados conseguidos no fim-de-semana.

Carregar à lei da bomba

Cinco dias após a eliminação na Champions, Nuno não foi em meias medidas. Em tripla dose, meteu a carne toda no assador: dois laterais subidos (Layún assumiu a vaga do castigado Maxi Pereira), dois extremos declarados (Corona regressou aos relvados) e dois avançados complementares.

Esbarrou num adversário equilibrado, demasiado concentrado no espaço e em perder tempo. Também claudicou na própria ansiedade, típica de quem não experimenta a liderança isolada há ano e meio. E, apesar do pouco critério, não foi por falta de oportunidades.

Aos poucos, o dragão ganhou ascendente na partida. Um pouco ofuscado pelas constantes interrupções de Bruno Varela e Vasco Fernandes, é certo. Mas ganhou. Primeiro Brahimi (19’), após cruzamento atrasado de André Silva, num lance tirado por Vasco Fernandes em cima da linha.

Depois, perigo ao cubo (28’). Marcano cabeceou ao poste. Felipe rematou contra Santana. Soares obrigou Bruno Varela a defesa apertada. Três momentos de expectativa, projetados num canto de Layún e encerrados na muralha sadina. Mais tarde (32’), André Silva apareceu solto na área e atirou ao lado.

Só à quarta foi de vez. Ditados mudados e alvos revistos, o Porto saboreou o descanso com ritmos hispânicos. Óliver descobriu Corona em carreira de tiro e endossou um cruzamento açucarado. Respondeu o mexicano de primeira, levando as bancadas do Dragão ao rubro. O golo colocava os dragões em vantagem. Justiça proporcional à espetacularidade do tento portista.

Abono sadino colorido de encarnado

Para a segunda parte, o menu prometia mais do mesmo. Brahimi e Corona tentaram 0 2-0, mas a ameaça ficou pelo papel. E num ápice, voltou tudo à estaca zero. Aos 55’, Nuno Pinto descobriu João Carvalho à entrada da área. Felipe escorregou na pior altura e abriu alas ao médio, que picou com subtileza a bola sobre Casillas. Contra qualquer previsão, o Vitória igualava a contenda. Não precisou de forçar muito para gelar o Dragão e matar um borrego: há dez anos que a equipa de Couceiro não marcava no Dragão. Por ironia, foi um jogador emprestado pelo Benfica a quebrar o voo do dragão rumo ao topo da classificação.

O Porto já não sofria golos desde a vitória sobre o Sporting. Foram mais de 500 minutos a manter a baliza inviolada. Nuno Espírito Santo reagiu a pronto, colocando Diogo Jota no lugar de Corona. Pedia-se paciência e mais inspiração na hora de decidir o último passe. André Silva ainda atirou nova bola ao ferro, mas foi curto.

Os nervos tomaram conta dos portistas, dentro e fora das quatro linhas. Como se não bastasse, o antijogo dos sadinos atingiu nova preponderância. A equipa médica do Vitória entrou várias vezes em campo, tendo as três substituições sido efetuadas após assistências no relvado. Não admira, portanto, os 12 minutos de descontos atribuídos por Manuel Oliveira no conjunto das duas partes.

Nos últimos instantes, o técnico da casa esticou a largura do risco. Tirou Layún, colocou Otávio no miolo e pôs Jota a fazer o corredor direito. Depois, trocou André Silva por Depoitre. Contas feitas, programou um ataque numeroso e insistiu no chuveirinho. Esperou por ajuda divina, mas não foi feliz. Ajudou ao desfecho final uma irredutível defesa vitoriana, onde a dupla Venâncio-Fábio Cardoso se evidenciou.

É verdade que o conjunto de Setúbal atravessa a pior fase da época. Já não ganha há sete jornadas e parece ter relaxado com a tábua dos 30 pontos. Igualmente verdade é a queda que a turma do Sado tem para os grandes. Em 2016/17 roubou cinco pontos com o Benfica, quatro ao FC Porto e afastou o Sporting da Taça da Liga.

Quando menos precisava, o Porto acusou o desgaste da viagem a Turim. Interrompeu o ciclo de nove vitórias seguidas na Liga NOS e somou o segundo empate caseiro da temporada. Pela primeira vez Soares não marcou para o campeonato desde que veste de azul e branco. A dependência do killer instinct de Tiquinho é cada vez mais notória. É que, quando o avançado brasileiro não fatura, o Porto não vence.

“Não vi qualquer parte de nervosinho”

O treinador do FC Porto afirma que a equipa teve uma boa primeira parte com muitas oportunidades, mas confessa que “perdemos um bocado o critério na parte final, em que começamos a jogar um futebol que não nos caracteriza”.

Relativamente aos atrasos no jogo, Nuno Espírito Santo vê isso como “algo decorrente que tem acontecido ao longo do nosso campeonato” e acrescenta que o árbitro ao “penalizar as equipas que fazem antijogo” seguiu um critério que devia ser sempre respeitado.

Quando questionado sobre se a vantagem trouxe pressão à equipa, o treinador afirma que ao longo do jogo não viu “qualquer parte de nervosinho”. Por agora a única pressão que existe no caminho dos portistas é “romper um ciclo de muito tempo sem ganhar”.

“Estamos a jogar com equipas que têm 30 vezes mais que o nosso orçamento”

Apesar de reconhecer a existência de paragens ao longo da partida, José Couceiro salienta que “o jogo não passou exclusivamente por aí” e felicita a equipa sadina pelo controlo emocional que demonstrou ao longo dos 102 minutos de jogo.

Aos olhos do treinador do Vitória FC, é evidente que estes jogos suscitam uma maior motivação nos jogadores “são jogos diferentes de todos os outros, são jogos que têm uma exposição mediática muito grande”.

Couceiro realçou o facto de a dimensão dos clubes ser diferente “hoje temos aqui a imprensa praticamente toda, por vezes no Vitória chego a ter um jornalista na sala de imprensa” e de existir um grande desequilíbrio no futebol português “nós estamos a jogar com equipas que têm 30 vezes mais que o nosso orçamento, não há diferenças destas nas grandes ligas europeias”.