Foi a 1 de janeiro de 1973 que o Reino Unido aderiu à União Europeia. 44 anos depois, está de saída dos 28. Esta quarta-feira, o governo de Theresa May entregou a Bruxelas a carta que formaliza o pedido de saída do Reino Unido. Em 60 anos de existência, é a primeira vez que um Estado-membro da União Europeia decide abandonar o projeto.

A carta foi entregue a Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, pelo responsável permanente do Reino Unido na UE, Tim Barrow. São 1472 caracteres que invocam o artigo 50.º do Tratado de Lisboa e marcam oficialmente o início do Brexit, que deve estar concluído em 24 meses.  A partir daí, o Reino Unido deixa de fazer parte dos Tratados.

O esforço passa por conseguir um divórcio que satisfaça ambas as partes e evite uma saída sem acordo com a UE ou, no pior cenário, com um “mau acordo”. As prioridades estão estabelecidas nos dois lados. Para Bruxelas, é necessário dar garantias aos cerca de três milhões de cidadãos europeus a viver no Reino Unido e aos 1,5 milhões de britânicos residentes na União Europeia. Caso as negociações se compliquem as consequências seriam “muito graves”, alertou Michel Barnier, ex-comissário francês que está a cargo da equipa de negociação do Brexit com o Reino Unido.

Theresa May, afirmou, esta tarde, que a parceria pretendida pelos britânicos com a EU será “especial e profunda” e estabelecida “no melhor interesse do Reino Unido e da União Europeia”.

Outro assunto urgente e mais difícil de obter consenso é o acerto de contas. No centro da questão está o pagamento de todos os compromissos que foram assumidos até 2020, no âmbito do orçamento comunitário iniciado em 2014. A isto acrescenta-se ainda o valor das pensões dos funcionários britânicos da UE.  A quantia pode chegar aos 60 mil milhões de euros.

 O Artigo 50.º prevê a possibilidade de um Estado sair voluntariamente da União Europeia. Faz parte do Tratado de Lisboa, que foi redigido a 13 de dezembro de 2007 e entrou em vigor a 1 de dezembro de 2009.

O Estado-membro que tenha intenção de sair da UE deve “notificar o Conselho Europeu” e, com base nas negociações que serão feitas, são definidas as condições em que a saída avança.

Teresa Cierco, professora de Relações Internacionais da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) explica ao JPN que as negociações de saída “têm que acontecer” e “nenhuma das partes irá ganhar seja o que for”.  Para a investigadora, as motivações do Brexit devem-se essencialmente “aos tempos conturbados” que se vivem. “O Reino Unido sempre foi contra o aprofundamento da União Europeia, por isso não é de estranhar o facto de eles quererem sair”, acrescenta.

O que vai acontecer a seguir?

Agora que o pedido foi formalizado, os restantes 27 Estados-membros da União Europeia, segundo Donald Tusk, vão responder em 48h à notificação do governo britânico. No dia 29 de abril está marcada uma cimeira, onde vão ser aprovadas as linhas orientadoras e as prioridades da negociação da saída.

Mas o que acontece aos cidadãos que quiserem ir para o Reino Unido nos próximos dois anos? O Parlamento Europeu já avisou que se os direitos dos cidadãos da UE não forem garantidos, enquanto o Reino Unido continuar a fazer parte da União Europeia, o Brexit será vetado. Do lado britânico, o receio passa pela chegada de imigrantes em grande número durante os dois anos de negociação.

As relações económicas e comerciais são outra preocupação e o tema que está a criar mais incerteza. Os 27 são um importante motor para a economia britânica e o corte de relações privilegiadas é algo que a maior parte não deseja. A primeira-ministra britânica já manifestou vontade em estabelecer um acordo de livre comércio com a União, apesar de abandonar o mercado comum.

Como está a reagir Portugal?

Enquanto Estado-membro da União Europeia, Portugal terá uma palavra a dizer sobre o Brexit. Sobretudo agora que o Parlamento vai começar a estudar o processo formal e as implicações daí decorrentes. Em cima da mesa está a criação de um grupo de trabalho que reúna todos os partidos para acompanhar a saída. Já o Governo quer alocar, em Portugal, empresas que deixam o Reino Unido, na sequência do Brexit, como anunciou António Costa na semana passada.

Para já, nenhum outro passo institucional pode ser dado antes desta quarta-feira. Apesar de, segundo o jornal “Público”, a comissão parlamentar de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas e a dos Assuntos Europeus “continuarem atentas ao progresso inerente ao Brexit”.

Recorde-se que o Parlamento português anunciou não querer abandonar a discussão, cinco dias depois do referendo. “Quero assegurar que o Parlamento estará no centro da reflexão nacional sobre os assuntos europeus, e que merecerá sempre a maior atenção da Assembleia da República e o respeito pelos nossos interesses e, em particular, pelos direitos dos portugueses residentes no Reino Unido”, afirmou Eduardo Ferro Rodrigues.

O presidente da Assembleia da República disse não ser “possível nem desejável fazermos de conta que nada se passa”. Assume que a decisão dos britânicos deva ser respeitada, embora seja “um alerta mais do que suficiente para obrigar a União Europeia a repensar os caminhos trilhados nos últimos anos”, acrescentou no final de uma audiência no Parlamento Europeu com a Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas.

Artigo editado por Rita Neves Costa