“Do It” é o desafio que se coloca na nova exposição na Faculdade de Belas Artes da UP. Comissariada pelo suíço Hans Ulrich Obrist, a exposição chega a Portugal 24 anos depois de ser pensada.

Através de instruções criadas por vários artistas internacionais, a exposição “Do It” desafia os executantes – doers – a interpretá-las e dar-lhes forma. O resultado é uma série de peças instaladas no Pavilhão de Exposições da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP), que vão mudando ao longo do tempo e que não ficam para contar a história. Foi com a orientação de quatro estudantes de mestrado em Estudos Artísticos, vertente de Museologia e Estudos Curatoriais, que o JPN foi visitar “um clássico da curadoria contemporânea”, aberto ao público até 23 de junho.

A exposição já viaja desde 1993, depois de nascer de uma conversa de café entre o curador Hans Ulrich Obris e os artistas Christian Boltanski e Bertrand Lavier. Este conceito de exposição itinerante leva à reinterpretação, ao longo do tempo, de uma coleção de instruções, desenvolvidas por 250 nomes sonantes da arte contemporânea, entre eles Louise Bourgeois, Richard Hamilton, Bruce Nauman ou Michelangelo Pistolett. O objetivo é facilitar a organização de exposições a artistas e instituições que não estejam inseridos nos grandes circuitos artísticos.

Agora, foi a vez da FBAUP receber as instruções que já correram mundo e que chegam agora às mãos de uma equipa alargada de estudantes, professores, artistas e funcionários da comunidade. É a Independent Curators International (ICI) que actualmente representa o projecto e estabeleceu diálogo com a faculdade, para aferir a selecção das peças — desde Rosa Mota “presa” à parede, brincando com o conceito de gravidade, movimento e todos os paradoxos trazidos pela exposição, aos retratos das crianças da escola Campo 24 de Agosto, ou a mesa posta para que mais tarde se lhe tire a toalha.

Nesta versão da “do it, foram recolhidas 23 instruções e é a gravidade que vai desafiá-las: “A exposição suspende-se no teto, tem objetos que ocupam o espaço, tem objetos que caem e se destroem. Mas também a gravidade no sentido gravitas académica, o peso do conhecimento muito sério, muitas vezes associado à academia. E as instruções que foram escolhidas têm uma dimensão irónica, humorística, que desafiam a tal gravidade da academia”, como explica Inês Moreira, curadora e professora na faculdade.

A exposição é uma crítica também ao mercado da arte. Foto: Mariana Calisto

Para Inês Moreira, que coordena a exposição em conjunto com Lúcia Matos – directora do Museu das Belas Artes -, a exposição é uma crítica radical ao mercado da arte: “Interessa-me pensar que as ideias circulam, que se materializam em objetos que também podem ser colecionáveis, mas nem tudo se traduz em objetos com esse objetivo tão estrito. A arte não é só isso”.

“A exposição é um organismo vivo”

Isabeli Santiago, uma das alunas de mestrado em Estudos Artísticos que orientou a visita ao JPN, explicou o processo que antecedeu as instalações, que incluiu muita investigação dos alunos envolvidos sobre os artistas selecionados, o seu percurso e as possibilidades de interpretação das instruções. Para interpretar a obra de Jimmie Durham, Isabeli recordou o trabalho da artista Clara Silva, exposto durante algum tempo na FBAUP.

Interpretação da obra de Jimmie Durham, "Do-It-Yourself", pelos "doers" Beatriz Alcantara, Isabeli Santiago, Jonathon Austin, Mafalda Verde e Manuel Montenegro e colaboração de Clara Silva.

Interpretação da obra de Jimmie Durham, “Do-It-Yourself”. Foto: Mariana Calisto

A estudante vê a exposição como um laboratório, onde as peças não estão finalizadas e vão sendo “ativadas” várias vezes por quem as visita. Com a passagem do tempo, os objetos vão sofrendo transformações e cria-se uma interação com cada pessoa, que vive a exposição de uma forma diferente.

Beatriz Alcântara também é aluna de mestrado e falou com o JPN acerca da peça que mais gostou, que partiu da instrução de Felix Gonzalez-Torres.

Obra do artista visual Felix Gonzalez-Torres. Foto: Mariana Calisto

Jonathon Austin é outro dos alunos de Belas Artes envolvidos no projeto e também ele deixou o seu desenho entre as folhas que se vão juntando pelo desafio da instrução de Yona Friedman.

"To build a city" é a obra de Yona Friedman, que dá instrução para se desenhar uma casa de sonho. O aluno Jonathon Austin aceitou o desafio.

“To build a city” é a obra de Yona Friedman, que dá instrução para se desenhar uma casa de sonho. Foto: Mariana Calisto

Manuel Montenegro juntou-se a esta visita e falou ao JPN da grande bola de jornal que se encontra à entrada da galeria, interpretação da obra “Sculpture for Strolling”, de Michelangelo Pistoletto.

Michelangelo Pistoletto idealizou uma "escultura para passear", onde uma grande bola feita de jornal pode ser passeada pelas ruas.

Michelangelo Pistoletto idealizou uma “escultura para passear”. Foto: Mariana Calisto

 “O que perdura é a experiência”

No final? Não resta nada. A exposição tem marcada uma festa de encerramento, no mês de junho, onde todas as peças vão ser destruídas, cumprindo as próprias regras da “do it”, que não deixam que fiquem em circulação, em coleção ou num museu. Mas Inês Moreira garante que não fica “qualquer nostalgia da falta do objeto”. “Sentimo-nos muito enriquecidos com a experiência de ter podido fazer esta exposição. Pensá-la, desenvolver os objetos, chamar as pessoas e convidá-las a participar e, no final, garantir que o que perdura é a experiência”, explica a curadora.

A exposição tem entrada livre no Pavilhão de Exposições da faculdade e todas as quartas-feiras podem ser marcadas visitas acompanhadas pelos doers.

Artigo editado por Rita Neves Costa