As raízes de Alberto Carneiro não se esgotavam na arte. Era natural de São Mamede do Coronado, na Trofa, e nunca cortou a ligação com a terra em que nasceu. É lá que deixa o jardim-escultura inaugurado em 2015, e foi à Câmara de Santo Tirso – onde na altura se incluía o concelho da Trofa – que doou o espólio da sua obra, no mesmo ano. Foi também o impulsionador do Museu Internacional de Escultura Contemporânea inaugurado no concelho. Morreu este sábado aos 79 anos.

Oriundo de uma família humilde, foi santeiro durante mais de uma década. A madeira, que trabalhava desde novo, marcou sempre a obra. Mas acabou por frequentar o ensino noturno da Soares dos Reis e por conseguir um diploma em Escultura da Escola Superior de Belas Artes do Porto (ESBAP). Em 1968, partia para Londres, para uma pós-graduação na Saint Martin’s School of Art, onde estudou sob a orientação de escultores como Anthony Caro e Philip King.

Alberto Carneiro passaria de novo pela ESBAP, onde foi docente entre 1972 e 1976. Entre 1985 e 1994, ensinou também na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP).

Das inúmeras distinções, destacam-se o Prémio Nacional de Escultura, em 1968, o Prémio Nacional de Artes Plásticas da Associação Internacional de Críticos de Arte, em 1985, e o Prémio de Artes do Casino da Póvoa, em 2007. Recebeu, também, em 2015, o Grande Prémio Amadeo de Souza-Cardoso.

As suas esculturas públicas estão presentes em países tão diversos como a Eslóvénia, o Reino Unido, a Irlanda, a Coreia do Sul, o Equador, o Taiwan, Espanha e o Chile.

O “pedagogo” que estilizou a natureza

O arquiteto Eduardo de Souto de Moura foi aluno de desenho de Carneiro, por quem nutriu sempre uma “grande admiração”, na FAUP. Veio, mais tarde, a projetar com Siza Vieira, a sede do Museu Internacional de Escultura Contemporânea.

Ao JPN, traça o retrato de um escultor que “estilizou a natureza”, com o qual “o natural passava a ter o estatuto de arte”.

Também como professor, Carneiro trouxe uma “autêntica revolução”. Souto de Moura fala de exercícios de “desenho conceptual” em que tinham de “desenhar o som e o sabor dos materiais”. Recorda-o, acima tudo, como “pedagogo”.

No último fim de semana, multiplicaram-se os votos de pesar pela morte do escultor. Numa nota disponível no portal da Presidência da República, Marcelo Rebelo de Sousa destaca a ligação de Carneiro “àquilo a que chamava a ‘personalidade’ das árvores, o vínculo às coisas concretas, e a dimensão corporal dos ofícios”.

O ministro da Cultura, Luís Castro Mendes, chamou-lhe uma “voz singular” que “combinou a arte com elementos da natureza e marcou as artes visuais em Portugal”.

Também Joaquim Couto, presidente da Câmara de Santo Tirso, falou à Lusa de um “visionário excecional, retilíneo e forte nas relações pessoais”. O autarca lamentou ainda que Carneiro não tivesse visto a adjudicação da obra do Centro de Arte Alberto Carneiro, a inaugurar em 2018. O espaço, que a câmara vai abrir na antiga fábrica têxtil de Santo Tirso, vai reunir o espólio doado em 2015.

O velório de Alberto Carneiro decorreu esta segunda-feira, no tanatório de Matosinhos, seguindo-se a cremação no mesmo local. Do autor ficam as raízes espalhadas na obra exposta por todo o mundo.

Artigo editado por Filipa Silva