O Partido Socialista e o Bloco de Esquerda levaram esta quinta-feira a plenário dois projetos de resolução com o objetivo de criar um estatuto de estudante-atleta para os universitários desportistas que são federados.
Atualmente, o regime que permite o estatuto de estudante-atleta universitário abrange apenas os desportistas de alto rendimento ou integrantes das seleções nacionais. Na proposta, o PS considera que é necessário alargar este estatuto ao nível dos atletas federados, exigindo um “conteúdo mínimo de direitos e deveres para aqueles que representem a Instituição em diversas competições de índole académica e universitária”.
Os socialistas falam na criação de um “estatuto uniforme” para todas as instituições, de forma a que os praticantes das modalidades desportivas que vêm contempladas no plano académico não sejam prejudicados. Para isto, seria ponderada a justificação de faltas quando relacionadas com a atividade desportiva, o prolongamento de prazos na entrega de trabalhos ou um regime mais favorável à realização de exames e avaliações.
O Bloco de Esquerda apresentou também um projeto de resolução que defende a mesma ideia. “Se é verdade que os atletas de alto rendimento têm consagrados um conjunto de direitos num regime específico, é importante ter uma resposta efetiva para todos aqueles que, mesmo não sendo atletas olímpicos e/ou de alto rendimento, são federados e dividem o seu tempo entre o percurso académico e a atividade desportiva”, defendem.
Os bloquistas consideram que a criação do estatuto vem responder aos “anseios de uma camada considerável de estudantes que praticam desporto”, mas não têm acesso aos mesmos direitos que outros desportistas.
Em plenário, o deputado do Partido Socialista, Ivan Gonçalves, e o deputado Luís Monteiro, do Bloco de Esquerda, apresentaram as respetivas propostas. Os projetos de resolução mereceram concordância entre os representantes parlamentares, ainda que Joel Sá, do Partido Social Democrata (PSD) e João Almeida, do CDS-PP, tenham acusado o governo atual de “não fazer nada sobre esta matéria” durante um ano.
Já a deputada Diana Ferreira, do Partido Comunista Português (PCP) alertou para a necessidade de uma “reflexão ampla” sobre “as realidades da prática desportiva dos estudantes do ensino superior”, que são diferentes nos atletas de alta competição e nos praticantes federados.
Uma proposta que agrada os estudantes e um sistema de ensino com “falhas”
Os projetos de resolução apresentados esta quinta-feira refletem uma necessidade que tem vindo a ser demonstrada pelos estudantes universitários que estão envolvidos na prática desportiva.
Joana Patrocínio estuda Ciências da Comunicação na Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) e pratica ginástica acrobática desde os nove anos. Para a atleta, a gestão do tempo é uma das maiores dificuldades que tem que enfrentar.
Em 2013 chegou a conseguir o regime de estudante-atleta, quando ficou no primeiro terço da tabela classificativa do campeonato do mundo. No entanto, deixou de beneficiar desta oportunidade nos restantes anos, pois “os critérios da acrobacia são bastante apertados” e não obteve classificação suficiente para obter o estatuto, algo que acaba por “desvalorizar o esforço gigantesco” da atleta.
Caso a criação do novo estatuto siga em frente, Joana considera que deve existir um “melhor acompanhamento destes alunos, em termos de matéria lecionada”, que muitas vezes acabam por perder com as faltas. É necessária também uma “melhor flexibilidade em termos de horários e trocas de turmas, um maior nível de compreensão por parte dos professores no que toca às datas de entregas de trabalhos e testes realizados e também, a nível de exames, que seja permitida a época especial para todos os que necessitam”.
“Há muita informação que não é passada aos docentes, de tal maneira que não sabem lidar com os atletas de alta competição”
A necessidade de criar um estatuto que englobe os desportistas federados não é a única luta a ser travada. Muitos estudantes consideram que o sistema de ensino português não está bem preparado para os atletas. “Os professores continuam sem ter uma mentalidade muito aberta e, por vezes, parecem nem perceber o que é ser estudante-desportista e todo o nosso trabalho que isso requer da nossa parte”, acrescenta a ginasta.
Também Vasco Pais, estudante de Engenharia Mecânica e jogador de basquetebol há dez anos, considera que existem algumas “falhas” no sistema, quando se trata do atleta profissional que “treina duas vezes por dia e tem jogo fora e viaja”.
Já Renato Ribeiro, estudante de Ciências de Engenharia Aerospacial, e também jogador de basquetebol, fala ao JPN que “há muita informação que não é passada aos docentes, de tal maneira que não sabem lidar com os atletas de alta competição”. Estas situações fazem com que, em muitos casos, os atletas fiquem desmotivados e acabem por ter que escolher entre “ser ‘jogador’ ou prosseguir com os estudos”.
Para além dos direitos que o Partido Socialista e o Bloco de Esquerda sugerem serem implementados, Vasco alerta para a necessidade de ser considerada uma alteração nos critérios de seriação para a atribuição deste estatuto, pois “muitos podem tentar ganhar alguma vantagem sem terem que sacrificar tanto do que aqueles que merecem o estatuto”. Tudo para que os atletas “consigam dar o máximo de si em tudo”.
Para Renato Ribeiro as instituições têm que estabelecer uma relação de maior proximidade com os clubes, “de modo a ser possível um horário mais flexível”, conclui.
Artigo editado por Rita Neves Costa