A coreógrafa portuense Joana Castro apresenta esta terça-feira "Su8marino", no festival Dias de Dança.

Joana Castro é uma bailarina portuense que estudou no Balleteatro, como intérprete. Entretanto, deu a volta à Europa a dançar. Esta terça-feira vai estar no Teatro do Campo Alegre, no âmbito do Festival Dias de Dança, a apresentar “Su8marino”, uma criação sua.

Joana deu os primeiros passos no mundo da dança ao lado de Né Barros – criadora do espectáculo “Muros” que abriu o festival – e  depois foi trabalhando com outros coreógrafos como Joana Providência, Joclécio Azevedo e Victor Hugo Pontes – que, em colaboração com Joana Gama, levou”Nocturno” ao Dias de Dança do ano passado. Agora, apresenta “Su8marino”, em que além de coreógrafa é também intérprete.

As primeiras performances surgiram depois de terminar o curso no Balleteatro. Caíam na categoria do “alternativo e informal”, conta Joana ao JPN. “Eram coisas que me davam espaço para experimentar e errar”, acrescenta.

Em 2008, foi para Lisboa estudar composição coreográfica no Fórum Dança. Não concluiu o curso por motivos financeiros e porque quis partir para o mundo do trabalho.

Para Joana, a dança pode ser muita coisa, mas se tivesse que a definir numa única palavra seria “manifesto”. “Nem que seja um manifesto pessoal, mas também um manifesto político, social ou cultural. Em tudo aquilo que faço, procuro questionar e chegar a algum lado.”

A dança, para Joana Castro, é também questionamento. “Não funciona numa lógica de: vai ver dança e tornas-te uma pessoa melhor, de todo. O que acredito é que não só a dança, mas a arte, em geral, faz questionar”, explica a coreógrafa.

Su8marino

Uma figura antropomórfica e andrógena ocupa o palco de Su8marino Diana Barros

O território subaquático visto a partir de “Su8marino”

“Até que ponto é que nós num determinado território definimos uma identidade e a partir dessa identidade começamos a criar relações de poder?”, foi a pergunta de partida que Joana formulou para esta peça.

O desafio foi grande e a coreógrafa afirma que a ajudou a perceber melhor até onde pode ir.

“Quando começo uma peça, nunca começo no vazio. Antes de partir para a criação costumo andar a magicar durante algum tempo, uma problemática, tema ou conceito”, explicou Joana. O “Su8marino”, por exemplo, vem de um universo mais cósmico que a portuense já abordou em “Partículas douradas num mundo quase sempre vestido de preto”.

Em “Su8marino” as experiências sensoriais são muitas e diversas, mas a asfixia é constante. Não há nenhum submarino em palco, mas se houvesse seria certamente um que se afundava, deixando a tripulação sem respirar.

Joana Castro explicou que para criar “Su8marino” tentou “perceber a ponte entre um território e outros lugares alternativos.” Isso percebe-se na peça, quando com uma luz ofuscante na cabeça, a bailarina se enrosca numa espécie de balão de São João gigante, ora tentado libertar-se, ora apenas agitando-se para criar um espetáculo de luzes.

Com cornos trabalhados como os do veado, mãos azuladas, mas com uma luxuosa capa de veludo, a antropomorfia da personagem principal faz-nos refletir precisamente sobre universos longínquos do nosso. Foi inspirada na ideia de um “corpo não-corpo”.

Joana sublinha ainda que “além de antropomórfica, a figura é andrógena – não se sabe muito bem se é homem ou mulher”, tarefa que se torna particularmente difícil sob a ténue luz que ilumina “Su8marino”.

Acerca do processo de criação, a bailarina conta que as mãos azuladas foram o primeiro elemento a surgir. “Escolhi azul pela dualidade simbólica que esta cor tem no ocidente e no oriente. No ocidente, o azul é uma cor autoritária – os bancos, as grandes empresas, tudo o que é importante é sempre azul. No oriente, o azul é uma cor sagrada ligada aos deuses”, explica Joana, acrescentando que “a dualidade e jogo de territórios” interessam-lhe bastante.

Joana está satisfeita com o resultado final, mas conta que quando olha para o que criou, quase não se identifica. “Não me tentei controlar”, confessa.

DDD 2.0

Pode ser jovem, mas para Joana Castro “Su8marino” é já a segunda obra no festival DDD. A primeira foi “Everlasting” que criou em conjunto com Flávio Rodrigues. “Foi uma colaboração em acidente”, explica.

A ideia de voltar a trabalhar com Flávio Rodrigues já lhe andava a saltitar pela cabeça muito tempo antes da estreia da peça. “Um ano antes da estreia, já andávamos a pensar que queríamos voltar a colaborar. Fizemos a nossa primeira peça em conjunto em 2011 e também temos um projeto de música eletrónica e performance – o Velvet Cloak, que vamos apresentando quando nos apetece”, conta Joana acerca da colaboração com Flávio Rodrigues.

Para Joana trabalhar sozinha é uma exploração de um universo muito individual. Em colaboração é muito diferente – são “dois universos que partem para encontrar um novo. É isso que acontece quando trabalho com o Flávio e para mim é sempre bom.”

A dança aqui e lá fora

A dança sempre foi o seu habitat natural, mas é criadora apenas desde 2010. “Ainda me identifico com algumas das peças que criei”, conta Joana. Estreou-se internacionalmente, quatro anos mais tarde com “Perto… tanto quanto possível”. “Apresentámos no Volksroom em Bruxelas e nos Lake Studios em Berlim, onde vou voltar ainda este ano com ‘Su8marino’”, anunciou Joana, ao JPN.

A internacionalização não foi particularmente difícil. “Às vezes, é mais fácil internacionalizar uma peça do que fazê-la cá”, confessa, denunciando as dificuldades de singrar na área da dança em Portugal.

Se é possível fazer carreira de dança em Portugal? Joana diz que apenas da dança não. “Só da criação, só da interpretação é impossível. Não dá. Tens que lecionar aulas, formações e organizar workshops.”

Na opinião de Joana, isso acontece porque “não há peças todos os dias, não há peças todos os fins de semana.” Acrescenta que como criadora, não é “uma máquina”, nem quer ser “uma máquina de fazer peças.” Interessa-lhe criar quando tem alguma coisa para dizer.

Além de coreógrafa, Joana também é intérprete, mas recentemente tem tentado enveredar por outros caminhos. “Como intérprete tenho trabalhado mais frequentemente, mas é algo de que me começo a afastar. Fugi um bocadinho para a criação”, explica.

O espetáculo estreia esta terça-feira, às 19h00, no Teatro Municipal do Campo Alegre.

Artigo editado por Filipa Silva