“Somos mulheres e não mercadoria. A violência contra a mulher não é o mundo que a gente quer”. Estas foram algumas das palavras de protesto que ressoaram na Praça dos Leões ao final da tarde desta quinta-feira. “Mexeu com uma, mexeu com todas” é o nome do movimento que deu origem à concentração e veio a propósito de um vídeo divulgado na semana anterior, que retrata uma alegada violação num autocarro do Porto na altura da Queima das Fitas.
Cartazes, microfones ou as próprias cordas vocais. Todos apelavam em uníssono: “não à cultura da violação”, que segundo a organização é “aquela que encara as mulheres como objetos sexuais e de consumo masculino” e que entende que “as mulheres não são seres autodeterminados e donas da sua sexualidade.”
O evento contou com o apoio de mais de 50 entidades. Entre elas, estavam partidos políticos, Bloco de Esquerda e o PAN, associações de estudantes, como a AEFLUP e a AEFPCEUP, coletivos feministas e associações ativistas.
Em frente à Reitoria da Universidade do Porto, juntaram-se várias dezenas de pessoas e o JPN falou com algumas delas para saber o que as motivou a ir até lá.
Daniela Reis, 21 anos
“Já sofri disto duas vezes, mas só recentemente é que consegui entender que a culpa não foi minha. Eu não tenho culpa. Temos que lutar pelos nossos direitos, porque eu sei o que aquilo me causou, tudo aquilo que eu sofri por causa disso e não desejo isso nem ao meu pior inimigo.
Acho que isto é importante para todos, porque todos sofremos disto. Muitas vezes, os homens não falam que sofreram disto, porque, se para nós já é vergonhoso, para um homem é muito mais, na cabeça deles. Isso não devia acontecer com ninguém”.
Catarina Saraiva, 19 anos
“É a primeira vez que eu venho a uma concentração destas. Nunca vim antes por falta de tempo ou talvez um bocadinho de falta de consciência do problema que é. Mas acho fundamental, tanto homens como mulheres virem defender uma causa que é comum a todos.
Eu já fui assediada no autocarro e foi terrível. Uma vez também, ao ir para casa, um rapaz já me perseguiu porque achou que eu por estar àquela hora da madrugada na rua sozinha tinha o direito de vir atrás de mim até à porta de minha casa e ter qualquer tipo de contacto, mas, de facto, não tem e eu dessa vez soube como reagir. Mas da primeira vez lembro-me que fiquei em pânico”.
David Costa, 18 anos
“Eu venho, porque procuro ser um cidadão ativo e essa questão do culto da violação é uma questão que continua a existir, infelizmente, depois de tantos anos. Também diz respeito aos homens, mas de facto a mulher sempre foi vista como um ser mais vulnerável, mais sensível e, portanto, acho que essa cultura da violação incide mais fortemente sobre elas.
Essa instrumentalização da mulher parece que está muito escondida, muito implícita. Isso acontece-nos todos os dias e nós às vezes nem reparamos. Até as próprias mulheres que sofrem disso não reparam, porque é muito subtil. Só que depois tem agravos muito fortes e que podem ser muito perigosos. Eu acho que a mudança parte da educação. Estas marchas são importantes, mas a arma é a educação.”
Helena Valente, 35 anos
“Esta questão do vídeo, obviamente que foi um bocado o mote que nos trouxe aqui, mas esta questão é uma questão de sempre e é importante que as mulheres se mobilizem, mas também é importante mostrar aos rapazes que isto não é aceitável e que a cultura de violação está presente.
Acho que nós, as mães, temos um papel muito importante nesta luta, porque muitas vezes somos as cuidadoras principais dos nossos filhos e também cabe a nós travar esta mentalidade.”
Joana Dumas, 29 anos
“Estou aqui, porque acho que as mulheres precisam de continuar a dar voz a esta luta que nós já lutamos há muitos anos e eu própria já fui assediada na rua, no trabalho e não quero isso para mim. Não é não e, portanto, estou a tentar ajudar e a dar voz às mulheres.
Cultura da violação é o homem achar que os seus desejos naturais valem mais do que um não da mulher, mas tenho a certeza que também há homens vítimas de violação e devem denunciar como nós.”
Francisco Silva, 19 anos
“A cultura de violação existe e eu sou solidário com a causa.
Não sou muito ativo politicamente, mas é melhor estar aqui do que estar em casa. Sem dúvida que está presente na música, nos filmes e nos livros”.
Beatriz Arnedo, 21 anos
“Vim hoje, porque esta é uma concentração simbólica para mostrar que as mulheres não têm que se conformar com o que se está a passar na sociedade atualmente.
Desde muito pequenas que nos apresentam livros e histórias que colocam a mulher sempre num papel de submissão ou de vulnerabilidade e o homem tem sempre o papel principal, o papel de salvar, o papel de proteger. Nós não precisamos de ser protegidas, não precisamos de ser reclusas constantemente desta mentalidade patriarcal e machista”.
Artigo editado por Rita Neves Costa