O Executivo da Câmara Municipal do Porto aprovou, esta terça-feira, por unanimidade, que a cidade apresente uma candidatura ao acolhimento da Agência Europeia do Medicamento (EMA, na sigla inglesa) caso o Governo assuma a disponibilidade para rever a decisão entretanto tomada e vertida na resolução do Conselho de Ministros conhecida a 5 de junho, na qual Lisboa é apontada como a cidade escolhida para a candidatura portuguesa.

O assunto foi levado à reunião pelos vereadores do Partido Socialista. A ideia de Manuel Pizarro foi de que “o Porto não devia desistir” de tentar receber uma agência que tem 890 funcionários, um orçamento anual de 300 milhões de euros e que proporciona 30 a 40 mil dormidas anuais. Disse que contactou 11 entidades da cidade – dos setores da Saúde, Ensino Superior e Economia – e recolheu o apoio de todas para avançar. O socialista sugeriu mesmo que fosse o antigo presidente do Infarmed, Eurico Castro Alves, a coordenar essa candidatura.

Sobre a vontade e capacidade da Invicta acolher a agência, ninguém mostrou dúvidas, mas vários vereadores colocaram em causa o momento para avançar com esta candidatura, quando há já uma decisão do Governo.

“Saúdo a iniciativa, mas ela vem com dois meses de atraso”, considerou Ricardo Almeida, vereador do PSD. “Estamos em campanha eleitoral e não há nada a fazer quanto a isso”, acrescentou, da mesma bancada, Amorim Pereira. “Tenho receio, independentemente de até concordar [com a candidatura] que estejamos a correr atrás do prejuízo”, concordou Pedro Carvalho da CDU.

Perante os comentários dos vereadores, Rui Moreira acusou-os de “alguma amnésia”, por considerar que a cidade não se atrasou na defesa deste dossiê. O presidente da Câmara recordou que a 2 de maio escreveu a António Costa para sublinhar a importância que o acolhimento da EMA poderia ter para o Porto e para a região norte.

Foi com surpresa que a 5 de junho a CMP tomou conhecimento da resolução do Conselho de Ministros na qual já se indicava Lisboa como a cidade escolhida. “Até lá, não sabíamos”, declarou Rui Moreira. “Ao contrário do que aconteceu noutros países, não houve discussão [em Portugal]. Aqui, escolheu-se a cidade e fechou-se o assunto”, acrescentou ainda.

O presidente da Câmara do Porto aludiu também aos estudos que de acordo com o ministro dos Negócios Estrangeiros terão servido de base à decisão. A autarquia portuense solicitou-os, mas “pelos vistos” não existiram.

Uma carta na manga

Na mão, trouxe uma novidade. Rui Moreira recebeu de António Costa uma carta esta segunda-feira na qual o primeiro-ministro dizia que foram estudadas as possibilidades de Porto e Lisboa acolherem a EMA, justificando a escolha de Lisboa com dois motivos: 1. a proximidade do INFARMED (agência portuguesa do medicamento) e 2. “ser fator de preferência a existência de Escola Europeia, que só Lisboa poderá vir a ter, beneficiando da sinergia da preexistência de outras agências europeias”. António Costa diz ainda na missiva ser “o primeiro a lamentar não ter sido possível candidatar o Porto porque muito gostaria de também, por esta via, contribuir para reforçar a crescente internacionalização da cidade”.

Rui Moreira considerou que os argumentos do Governo – a quem elogiou o esforço de descentralização em matérias como a gestão das Águas ou dos STCP – são facilmente atacáveis.

Os cerca de 900 funcionários da EMA serão suficientes para justificar a abertura de uma Escola Europeia, não sendo por isso necessários os cerca de 250 que as duas agências europeias com sede em Lisboa têm – o Observatório da Droga e da Toxicodependência e a Agência Europeia da Segurança Marítima.

Rui Moreira argumentou ainda que em vários países da Europa, com agências europeias, não só as agências estão localizadas fora da capital como estão em cidades diferentes daquelas que albergam a Escola Europeia desses países.

O autarca defendeu que a câmara atuou “no quadro possível”, nomeadamente no âmbito do Portugal IN criado pelo Governo em abril para aferir a capacidade de acolhimento da EMA.

Marcando assim a posição da autarquia face à vontade de receber a agência, Rui Moreira não deixou de mostrar alguma concordância com os vereadores que duvidavam da apresentação de uma candidatura quando o processo está, ao que parece, encerrado pelo Governo. Daí confrontou Manuel Pizarro: “está em condições de garantir que António Costa está em condições de revogar aquele despacho?”.

Manuel Pizarro respondeu que não podia dar essa garantia, apenas a sua “convicção política de que uma candidatura fortemente participada pode chegar lá”.

Rui Moreira entende que é preciso “um sinal do primeiro-ministro a dizer que está disponível para avaliar uma candidatura do Porto”. A carta que recebeu, diz, “é uma recusa liminar”. “Se não tivermos esse sinal, podemos cair no ridículo e não queríamos nada disso”, reforçou.

Pizarro acabou, então, por aceitar rever o texto da proposta que apresentou tendo todos os vereadores acordado, por unanimidade, avançar com a elaboração de uma candidatura do Porto ao acolhimento da EMA “desde que seja garantido que o Governo pode ainda rever a decisão tomada”.

A Agência Europeia do Medicamento tem atualmente sede em Londres, mas terá de deixar o Reino Unido por força do Brexit.