O incêndio na vila de Pedrogão Grande, que começou na semana passada e alastrou também a Figueiró dos Vinhos e a Castanheira de Pera, vitimou 64 pessoas e feriu mais de 200. O fogo foi dado como extinto este sábado (24 de junho) a meio da tarde, quase uma semana depois de ter deflagrado. Neste momento, cerca de 107 bombeiros e 36 viaturas estão no terreno, em fase de conclusão, segundo o site oficial da Autoridade Nacional de Proteção Civil. Foi desde 17 de junho (sábado) que as autoridades nacionais, com corporações de bombeiros de todo o país, tiveram a ajuda suplementar da União Europeia, através do Mecanismo de Proteção Civil.
O JPN visitou o Centro de Coordenação de Resposta de Emergência da União Europeia, em Bruxelas. Foi através do porta-voz da Comissão Europeia para a Ajuda Humanitária e Proteção Civil, Carlos Martin Ruiz de Gordejuela, que ficou a conhecer os pormenores deste mecanismo de ajuda a Portugal, mais propriamente no incêndio de Pedrogão Grande. As seguintes perguntas servem para explicar como tudo se passou no distrito de Leiria e o que pode estar reservado a Portugal relativamente a ajudas financeiras após a tragédia.
1. O que é e para que serve o Mecanismo de Proteção Civil da União Europeia?
O Mecanismo de Proteção Civil da União Europeia é ativado quando ocorre um desastre num país e as autoridades nacionais não têm capacidade suficiente para fazer face à situação. Pode ser um incêndio, um terramoto, cheias, doenças, entre outros. A UE presta uma ajuda suplementar, mas não substitui a responsabilidade do Estado nacional em matéria de desastres no seu território. Aliás, parte do sucesso do mecanismo só resulta se o “país em crise” conseguir coordenar a ajuda que solicitou junto da instituição europeia. Não é suposto a União Europeia “dar ordens” no terreno, mas sim auxiliar com todos os meios que disponibilizou para aquela situação.
É o Centro de Coordenação de Resposta de Emergência da União Europeia, em Bruxelas, a receber o pedido do Estado afetado: 24 horas por dia tem uma pessoa em permanência para coordenar a operação de proteção civil da UE.
2. Como é que o mecanismo é pedido e quem pode ajudar o “país em crise”?
O mecanismo só atua se houver um pedido formal de ajuda pelo país que sofreu o desastre, ou seja, não é a União Europeia que toma a iniciativa, mas sim o território lesado. Por exemplo, Portugal no caso do incêndio de Pedrogão Grande teve de efetuar uma “descrição das necessidades” para aquele momento, nomeadamente os meios humanos e logísticos para combater o incêndio: número de bombeiros, aeronaves, aviões Canadair (aviões de combate a incêndio), mapas de satélite e veículos. O pedido pode ser feito por um Ministério, mas o processo no terreno é estabelecido depois com um elemento da Proteção Civil.
Segundo Carlos Martin Ruiz de Gordejuela, o Mecanismo de Proteção Civil serve “para dar uma resposta coordenada e rápida aos Estados-Membros” afetados.
Todos os Estados-Membros da UE podem ajudar o país afetado, de acordo com as disponibilidades que têm no momento. O pedido de ajuda é enviado a todos e depois cabe ao Centro de Coordenação de Resposta de Emergência coordenar as respostas positivas para a operação se efetivar em Portugal, neste caso. Alguns países fora da União Europeia são usuais contribuidores do mecanismo como a Turquia, a Noruega, a Sérvia, Montenegro, Macedónia e Islândia. Fora do continente europeu: Marrocos, Tunísia e Argélia costumam também ajudar.
3. Quais os custos que a União Europeia (UE) cobre no Mecanismo de Proteção Civil?
Os custos de transporte dos Estados-Membros que ajudam o país afetado são suportados pela União Europeia em 85%, sendo a restante percentagem da responsabilidade do país que ajuda. O mecanismo é voluntário e nenhum país está obrigado a ajudar o outro, mas por uma questão de moral e reciprocidade, nenhum Estado-membro na história da UE se recusou a prestar auxílio a outro em altura de desastre.
4. Que parte do orçamento da UE é dedicado a este mecanismo?
Não é claro qual a percentagem que a União Europeia dedica a este mecanismo. Porém, o porta-voz para a Ajuda Humanitária e Proteção Civil esclarece que o valor é muito reduzido, uma vez que o papel do Centro Resposta de Emergência é apenas de coordenação/contacto com o país afetado.
5. A ajuda é feita apenas aos Estados-Membros da União Europeia?
Não. Da mesma forma que alguns países fora da União Europeia ajudam os países afetados da comunidade, também o contrário acontece. Qualquer território do mundo, fora do espaço Schengen, pode solicitar a ajuda do Mecanismo de Proteção Civil da UE. A Organização das Nações Unidas (ONU) pode inclusive pedir ajuda à União Europeia em caso de desastre. Este mecanismo já atuou no Equador e nos países afetados pelo ébola.
6. A que horas foi feito o pedido de ajuda de Portugal no incêndio de Pedrogão Grande?
O pedido de ajuda português para o incêndio de Pedrogão Grande foi feito às 5h21 (hora de Bruxelas — menos uma hora em Portugal) de domingo, 18 de junho. Sessenta minutos depois, já a França estava no terreno a ajudar Portugal com dois aviões Canadair. O último pedido aconteceu no mesmo dia de manhã.
7. Quantos meios da UE estiveram no terreno e quais os países que ajudaram?
Até esta sexta-feira, tinham estado no terreno ao abrigo do Mecanismo de Proteção Civil da UE: sete aviões, 135 bombeiros, 29 veículos e 42 mapas-satélite (que permitem registar a evolução do incêndio e ajustar as necessidades). Espanha, França, Itália e Marrocos foram os países que auxiliaram Portugal em Pedrogão Grande. A retirada da ajuda após a extinção do incêndio é feita de forma regular, sendo que alguns países regressam a casa (mais cedo) devido às próprias condicionantes que têm no seu território — França foi dos primeiros países a desmobilizar, devido às altas temperaturas que se faziam sentir em solo francês e que indiciavam a ocorrência de incêndios também lá.
8. É a primeira vez que Portugal pede esta ajuda?
É a 13ª vez que Portugal ativa o Mecanismo de Proteção Civil da União Europeia, desde 2003, e sempre devido a fogos florestais. Um dos últimos pedidos foi a propósito do incêndio na Madeira em agosto do ano passado, onde morreram três pessoas e 37 habitações ficaram destruídas.
9. Portugal já ajudou algum país ao abrigo do Mecanismo de Proteção Civil?
Portugal não recebeu apenas ajuda através deste mecanismo, também já auxiliou. Entre os exemplos estão o incêndio do Chile, ainda este ano, com cerca de 50 bombeiros portugueses e alguns equipamentos; a atividade sísmica em Cabo Verde em agosto do ano passado com a ajuda de peritos; e o surto de febre amarela em Angola também em agosto do ano passado, com a presença de técnicos especializados em Medicina tropical.
10. Após o incêndio, Portugal vai pedir mais ajuda à UE na reconstrução de Pedrogão Grande?
Portugal pode solicitar a ajuda financeira do Fundo Europeu de Solidariedade, que é um tipo de indemnização para cobrir parte dos danos materiais resultantes do desastre. Segundo Carlos Martin Ruiz de Gordejuela, o país afetado tem até 12 semanas para pedir essa ajuda, mas isso já não entra nas competências do Centro de Coordenação de Resposta de Emergência da União Europeia. O valor autorizado pela Comissão Europeia para a reconstrução do território vai até 95%. Mais uma vez, terá de ser o país afetado a requerê-lo junto da instituição europeia.
De acordo com o jornal online “ECO”, a Madeira poderá ser uma das regiões beneficiárias deste apoio, depois do Conselho Europeu ter aprovado um aumento do financiamento a locais atingidos por desastres naturais. O mesmo jornal revela que Pedro Marques, ministro do Planeamento e Infraestruturas, está em Bruxelas para agilizar com a comissária Corina Crețu (Desenvolvimento Regional), alguma ajuda comunitária. O governante tinha estimado um prejuízo de 500 milhões de euros na região Centro após os incêndios.
Para que possa aceder ao Fundo Europeu de Solidariedade, o incêndio de Pedrogão Grande terá de ser classificado como um desastre natural. O porta-voz para a Ajuda Humanitária e Proteção Civil referiu aos jornalistas, em Bruxelas, que o que aconteceu em Leiria será “seguramente a maior tragédia nos últimos dez anos na Europa”.
O JPN viajou para Bruxelas a convite da Representação da Comissão Europeia em Portugal