Há sete anos que não está permanentemente em Portugal. Emigrou com 18 anos para estudar música em Londres e desde esse momento, não teve casa fixa na Europa. Não teve por escolha própria. Polónia, Alemanha e (agora) Bélgica foram os países onde Helena Gandra residiu por curtos períodos de tempo. A jovem de 25 anos, natural do Porto, faz parte da geração de jovens que não conhece fronteiras na União Europeia. Usufruiu das portas abertas e hoje trabalha na Comissão Europeia. O voluntariado é uma atividade que pretende que seja sólida, ao contrário das viagens que faz um pouco por todo o lado.
Ainda antes de atingir a maioridade, já Helena experimentava alguns projetos de intercâmbio europeu enquanto explorava os sons e as melodias no ensino secundário especializado em música. Na Fundação Calouste Gulbenkian, interagiu com jovens da Roménia e da Lituânia, através do projeto Comenius, e o interesse pela Europa começou a crescer. A diversidade cultural, que encontrava em jovens da mesma idade que a sua, fascinou-a. De Portugal para o Reino Unido, foi um salto pequeno numa Europa ligada, mas de gigante para quem acabava de fazer 18 anos. “Houve momentos em que me apeteceu voltar para Portugal, mas acho que o processo me ajudou a crescer”, afirma.
Comenius é um projeto da iniciativa da Comissão Europeia que visa reforçar a vertente europeia da educação em todos os Estados-Membros, através do contacto com diferentes culturas e línguas.
Em Londres, trabalhava e estudava ao mesmo tempo. “Não sou de famílias ricas”, diz, convicta. Na mesma altura, tentava aperfeiçoar o inglês e hoje admite com pena que falar português já lhe traz algumas dificuldades. “É muito triste, mas espero melhorar quando voltar a Portugal”. Sim, Helena quer voltar a Portugal, mas já lá vamos.
Terminada a licenciatura, viajou de malas e bagagens para a Alemanha, onde começou a desenvolver o gosto pela política, a sociedade e os assuntos europeus. O próximo caminho era o mestrado em Estudos Europeus na Universidade de Flensburg.
Ainda com o alemão, muito “arranhado”, teve algumas aulas desta língua e também ganhou algum dinheiro a dar lições de inglês. Aprendeu desde cedo a trabalhar e a acumular responsabilidades académicas com as profissionais. Na instituição alemã, teve a oportunidade de fazer um programa de intercâmbio académico, o Erasmus +. Mais uma vez, a vida virava do avesso e de local. A Polónia foi o próximo destino e a Credit Suisse, banco de investimento suíço, foi a empresa que a recebeu em estágio. “Eu não sabia nada de finanças ou economia. Mas o que me levou sempre a novas oportunidades, foi a vontade de querer sempre mais”, reconhece.
Começar a ser voluntária numa empresa
Aqui começava a ligação com a Comissão Europeia — cujo programa de estágios atribuiu (duplamente) a Polónia e a Credit Suisse a Helena Gandra — e também com o voluntariado. O voluntariado em empresas (corporate volunteering) foi o ponto de partida para a solidariedade social, que hoje tanto incentiva e almeja. “Foi a altura em que fiz mais voluntariado e onde também surgiu o interesse em continuar”, explica. Depois do estágio, foi convidada para ficar a trabalhar no banco de investimento suíço. Ficou. Mas logo depois, recebeu um telefonema da Comissão Europeia com um convite para um estágio de cinco meses. De volta a Bruxelas.
Para quem já gostava tanto de assuntos europeus, a proposta revelou-se irrecusável. Aceitou e durante esse tempo, Helena integrou alguns grupos da União Europeia, um deles relacionado com solidariedade. A jovem começou a fazer voluntariado com refugiados, principalmente crianças, no Le Petit-Château, antiga prisão militar belga que atualmente recebe cidadãos estrangeiros que requerem asilo. A portuguesa continua a colaborar com a mesma atividade de voluntariado.
Corpo Europeu de Solidariedade é um programa de voluntariado da Comissão Europeia, dedicado a jovens entre os 17 e os 30 anos, cuja missão social pode ser efetuada nos países de origem ou além-fronteiras.
Os jovens inscrevem-se num portal online e podem ser integrados em vários projetos, desde ação social até ao auxílio em desastres naturais. A participação pode durar entre dois a 12 meses.
Dependendo do projeto e da disponibilidade do jovem, a participação pode ser perfilada como voluntária, profissional ou num estágio. Os gastos e custos dependem também do perfil que se escolher: de voluntário, estagiário ou trabalhador.
Quando estavas prestes a terminar o estágio na Comissão Europeia no final de 2016, foi lançado o Corpo Europeu de Solidariedade, destinado a jovens dos Estados-Membros que queiram ser voluntários em projetos nacionais ou internacionais. Helena apressou-se a inscrever, já que iria ficar livre nos próximos meses. O Centro Europeu de Voluntariado (CEV), uma rede europeia de mais 70 centros de apoio voluntário, anunciou a contratação de um consultor de comunicação na mesma altura. Um dos requisitos era fazer parte do Corpo Europeu de Solidariedade. A portuguesa de 25 anos não perdeu a oportunidade: candidatou-se, foi chamada para uma entrevista e depois contratada.
Em dezembro, deverão seguir-se novas aventuras, já que o contrato no CEV termina nesse mês. “Eu quero voltar a Portugal, só não sei quando”, afirma. É uma das primeiras portuguesas voluntárias no Corpo Europeu de Solidariedade. A nacionalidade portuguesa ocupa os lugares de topo nas candidaturas de jovens a este programa de voluntariado. Em março, cerca de 2500 jovens portugueses tinham-se inscrito no portal online.
“A solidariedade é o que devia unir mais a Europa”
A passagem por alguns países europeus levou Helena Gandra a retirar algumas conclusões do que afinal era a União Europeia. A diversidade cultural e os diferentes contextos sociais e políticos foram algumas das respostas: na Polónia, viu o crescimento da extrema-direita; no Reino Unido, a saída do país da comunidade. “A parte da solidariedade é talvez o que nos deveria unir mais na Europa. Houve muitos países onde eu não vi solidariedade, houve outros onde vi muito mais”, esclarece.
Fazer parte de uma geração em que cresceu como portuguesa, mas também como europeia, acresce mais responsabilidade. Para a Helena, lutar por uma Europa unida, com os valores morais bem assentes na solidariedade, deveria ser um objetivo dos mais jovens. “Quero fazer parte de um projeto que une mais os países”, refere.
Apesar de rejeitar a ideia de que o voluntariado é trabalho gratuito e equivalente ao estágios não remunerados – que segundo a jovem “estão a destruir a economia dos países” -, Helena olha para os programas voluntários como processos de desenvolvimento pessoal. Pois ao contrário do que os mais velhos avançam, “o objetivo dos jovens não é só fazer carreira, têm valores morais”, conclui.
O JPN viajou para Bruxelas a convite da Representação da Comissão Europeia em Portugal