Quase 28 anos para aqui voltar. Boavista e Portimonense já não chocavam no Bessa para o campeonato desde abril de 1990. Numa reedição de um clássico dos anos oitenta, os algarvios perderam oportunidade de igualar os portuenses na tabela. Fábio Espinho e Talocha impuseram diferenças no duelo alvinegro (2-0), desenhando a primeira vitória axadrezada em 2018.

Substituindo a ocasião pela promessa, a pantera vai cheirando o sonho europeu. Decisões só lá para maio, é certo. Mas como apela a sabedoria popular, até ao lavar dos cestos será vindima. Tanto mais quando a diferença pontual para o quinto lugar é recuperável e a zona de descida está longe de assustar.

Limpeza a todo o gás

Na antecâmara da segunda volta, Jorge Simão reservou menção especial a Mateus. Mesmo sem constituir presença assídua no esquema introdutório dos axadrezados, o internacional angolano abraça a oportunidade na hora de agitar encontros. Os números não deixam enganar: ao fim de dezassete jogos, é o jogador da Liga com mais remates certeiros na condição de suplente utilizado.

Desta vez, o dono da camisola assumiu do início o corredor esquerdo, colmatando as debilidades físicas sentidas por Rochinha no Restelo. E foi de lá que começou a limpar adversários e dissipar dúvidas no marcador. Aos quatro minutos, já depois da primeira ameaça, converteu-se numa gazela sem caçador. Ao meter a quinta velocidade, fugiu à marcação de Lucas Possignolo e descobriu Fábio Espinho isolado na pequena área. Sem dificuldades, o médio português emendou para a baliza deserta e estabeleceu as linhas mestras da partida.

De facto, o Boavista canalizou vários ataques nas alas, por entre a mobilidade de Mateus e a aceleração imposta por Kuca – nem sempre acompanhada da melhor definição em algumas jogadas prometedoras. Mas se o angolano até obrigou Ricardo Ferreira a aplicar-se com os pés, Leonardo Ruiz apareceu por duas ocasiões como sinónimo de desperdício.

Refém do castigado Tabata e do lesionado Fabrício, o conjunto de Portimão demorou a ligar os motores. Por momentos encontrava tranquilidade nos pés de Paulinho e Shoya Nakajima, dois senhores à parte na equipa de Vítor Oliveira. Contudo, a precipitação transbordava pelo último terço. Na única investida a sério, o trintão Pires perdeu-se em fintas e deslumbrou-se perante um cacho de axadrezados.

Na retaguarda, a caminhar para os balneários, os algarvios sofreram revés em dose dupla. Fábio Espinho arrancava isolado para a baliza alvinegra, mas foi travado por Lucas na meia lua. O árbitro Rui Oliveira teve mão pesada, expulsando com vermelho direto o defesa brasileiro. Do livre resultante, Talocha teve via aberta para dobrar a contagem, após uma tentativa desviada pelas luvas de Ricardo Ferreira. Em poucos segundos estava fortalecido o caos para o campeão da II Liga.

Um apelo à força do hábito

A adversidade combate-se de diversas formas. O Portimonense quis bater o pé à sofreguidão e voltou a mostrar competências em inferioridade numérica, tal como mostrou na semana passada em Paços de Ferreira. Fosse pelo estatuto ímpar de expulsões no campeonato, fosse pela identidade de Vítor Oliveira, cujas equipas preferem atacar do que resguardar, Felipe entrou para completar o quarteto de defesas, enquanto as crenças ofensivas eram depositadas na dupla do costume.

Faltou, contudo, arranjar um final feliz que relançasse os dados. As tentativas não abundaram e resumiam-se à meia distância. Na chance mais perigosa, Paulinho aqueceu as luvas de Vagner. O Boavista também abrandou o ritmo e não pareceu muito preocupado em dilatar a vantagem. Até ao fim, nota para a expulsão de Felipe Macedo, castigado com dois amarelos na etapa complementar.

Na verdade, as contas ficaram decididas em meia parte. O Boavista faz 24 pontos e sobe a oitavo, ultrapassando o Vitória SC. A visita a Vila do Conde na próxima semana não significa só três pontos em disputa. Tem relevo acrescido no sonho de fazer a pantera regressar às competições europeias.

Quanto ao Portimonense, os 18 pontos até são razoáveis para uma equipa que subiu de divisão. Para já, a décima segunda posição não faz soar alarmes no Algarve, por muito que os alvinegros já não vençam há oito encontros e desde novembro.

“Foi importante acabar com zero golos sofridos”

Cinco jogos depois, o Boavista voltou a manter a baliza inviolável. Além do regresso aos triunfos, Jorge Simão destacou a eficácia defensiva do Boavista. “O que fica é o facto de como ela foi conseguida, porque a última vez que tínhamos estado a ganhar 2-0 foi num jogo em que estava assim a 15 minutos do fim e perdemos. Sentimos ao intervalo que era importante solidificar a vitória sem sofrer golos. Foi muito importante acabar o jogo com zero golos sofridos”, salientou em conferência de imprensa.

Ainda assim, nem tudo foi bom para o técnico axadrezado. Por exemplo, a intranquilidade sofrida na última meia hora. “aconteceu alguma ansiedade, quando não havia razões. Um ou dois passos falhados e isso alastrou para outros jogadores, permitindo com que o Portimonense chegasse com maior perigo à nossa baliza”, assumiu Jorge Simão, sem descurar as tentativas efetuadas para “fazer o terceiro golo”.

“Fomos penalizados por entrar mal”

No final do encontro, Vítor Oliveira deixou reparos aos minutos iniciais do Portimonense. “Fomos penalizados por entrar mal. Sabíamos onde o Boavista nos podia surpreender. Alertámos para isso, mas não entrámos bem. Fizemos vinte minutos muito fracos, equilibrámos e depois aconteceu o lance da expulsão do Lucas e do golo”, analisou o treinador alvinegro.

A estratégia para a etapa complementar consistiu em tentar “um golo que permitisse voltar ao jogo”, desprezando o recolhimento das tropas ao setor defensivo. “Tivemos algumas situações para fazer o golo que nos colocaria de volta, mas o resultado é justo”, reconheceu.

Pelo segundo jogo consecutivo, os algarvios terminaram o encontro em inferioridade numérica. Vítor Oliveira dá o “benefício da dúvida” na expulsão de Lucas, considerando que a derrota nada teve a ver com a equipa de arbitragem liderada por Rui Oliveira. “É muito desagradável jogar com dez. Há clubes a quem é mais fácil dar amarelos do que outros. Critérios uniformes seriam mais justos”, afiançou.

Artigo editado por Sara Beatriz Monteiro