Lembra-se da “Rua Sésamo”? E do famoso Sapo Cocas e da Miss Piggy em “Os Marretas”? É com o mesmo estilo irreverente e com muita bonecada à mistura que a “Avenida Q” vem mostrar a todos aqueles que passam pelo Teatro Sá da Bandeira que a vida… é uma merda.

Escrito originalmente por Robert Lopez e Jeff Marx, em 2003, o musical esteve na Brodway e ganhou vários prémios Tony – que distinguem os melhores do teatro americano. Em Portugal, o espetáculo foi encenado por Rui Melo e conta com um elenco composto por Ana Cloe, Samuel Alves, Diogo Valsassina, Gabriela Barros, Rui Maria Pêgo, Inês Aires Pereira, Rodrigo Saraiva e Manuel Moreira.

A história é semelhante a um programa de televisão para crianças, onde num pequeno círculo de amigos se discutem lições importantes sobre números e letras são aprendidas. No entanto, esta peça dá, aos mais velhos lições sobre o que é a vida de adulto, mas sem moralismos.

Fazendo do público “gato sapato”, ao tornar possível rir sobre assuntos tão sérios como o desemprego, a crise, o sexo, a pornografia, o racismo e a xenofobia, o espetáculo apresenta-se como uma sátira bem real aos dias de hoje, num país (ou mundo, se quisermos alargar o nosso ponto de vista) onde jovens tiram as suas licenciaturas, mestrados ou doutoramentos e não encontram oportunidades. “De que serviu ser marrão? Tantas semanas a queimar pestanas, para ter um canudo na mão. Muita competência para pouca experiência. É tudo tão assustador”, canta Luís, o protagonista do espetáculo, pela voz de Samuel Alves.

A história anda muito à volta das expectativas frustradas. Num cenário composto por fachadas de três prédios, com tinta a descascar e azulejos caídos, a história arranca com a experiência de Luís: uma personagem recém-licenciada, sem emprego, que tem grandes sonhos para uma carteira muito pequenina.

Acabado de chegar à “Avenida Q”, onde pretende comprar uma casa por ser mais barato do que no centro da cidade, o mestre em Línguas fica a conhecer Maria, a muçulmana que estudou psicologia e que não tem “um cliente, com medo que o rebente”, como canta a personagem numa das primeiras cenas do espetáculo. “E agora até este está desempregado, quem me manda apaixonar por um desgraçado?”, continua Gabriela Barros, em personagem, a indagar , referindo-se a Tozé, o seu namorado, interpretado por Diogo Valsassina.

A peça foca-se em assuntos atuais, entre eles o amor, a internet, a precariedade e a homossexualidade. Foto: Filipe Ferreira

As personagens vão saindo de porta em porta. Marta Monstro (Ana Cloe), vive com a esperança de um dia vir a ter um namorado; o pequeno Saul (Rui Maria Pêgo), que canta “já fui rico, mas fui roubado pelos meus pais, fiquei sem nada”, é agora o porteiro; na casa do meio vivem ainda duas personagens: Félix (Manuel Moreira), um gay que se recusa a sair do armário e Joca (Rodrigo Saraiva), o seu melhor amigo “desde os tempos do liceu”.

Adicionalmente surge ainda Paula Porca (Inês Aires Pereira), que canta em clubes noturnos e que tira proveito do poder que tem sobre os homens, sendo que ainda existe  Trekkie, o segundo monstro do enredo e um viciado em pornografia com tendências para o tarado.

Com uma banda ao vivo, na “Avenida Q” os atores contracenam com as marionetas e assim se cria um ambiente, à primeira vista, bastante fora do normal, mas que resulta, através de uma mistura entre o real e o fictício, o cómico do momento e a dureza da realidade: tudo isto como que “colado” com as várias músicas que ao longo do guião vão surgindo.

Mas que isto não afaste quem diz não apreciar musicais. Em entrevista ao JPN, Diogo Valsassina ressalta que “na verdadeira concepção da palavra isto é um musical, mas não é bem um musical”, concluindo que, mesmo não sabendo explicar, todas as pessoas que vêm e assistem à peça “acabam por perceber o que estou a dizer” e gostam do espetáculo.

Agora no Porto, para uma nova temporada, depois de lotação esgotada no Teatro da Trindade e de um passagem pelo Casino de Lisboa, a “Avenida Q” começou o ano em alta, com 4 espetáculos de casa cheia, no Sá da Bandeira.

Os bilhetes vão dos oito aos 18 euros e a peça pode ser vista de quinta a sábado, às 21:30h, e todos os domingo, às 16:30, até ao dia 25 de fevereiro.

Artigo editado por Sara Beatriz Monteiro