O relatório preliminar elaborado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), a pedido do ministro da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior, Manuel Heitor, foi apresentado esta sexta-feira, em Lisboa, e alertou que Portugal tem carência de doutorados e também sugere que deve haver maior mobilidade do corpo docente.

Os peritos da OCDE defendem que o país continua a ter poucos doutorados, mas a investigadora na Faculdade de Ciências e Tecnologia na Universidade Nova de Lisboa (FCT-UNL), Elvira Fortunato, sublinha que não é uma questão de número. “Há doutorados nos sítios errados”, acrescenta.

A investigadora da FCTUNL defende que “tem de haver uma passagem [dos doutorados para o mercado de trabalho]”, ou seja, é necessário “doutorar mais pessoas para irem para as empresas e para o setor público”.

“Mais de 80% dos doutorados formados continua a ficar nas universidades e nos centros de investigação”

De acordo com Elvira Fortunato, “mais de 80% dos doutorados formados continua a ficar nas universidades e nos centros de investigação” e explica que desta forma “não são produtivos para o tecido económico”. A professora universitária conclui que, atualmente, o país “está a formar pessoas em ciclo fechado”.

Já o antigo presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), Joaquim Mourato, considera que o relatório da OCDE mostra que “a autonomia das instituições tem de ser aprofundada”.

Joaquim Mourato sublinha ainda a importância da radiografia feita ao ensino superior português ao nível da geografia das instituições universitárias.

“É necessária uma atenção especial para que as instituições no interior do país mereçam um apoio suplementar, para que sejam âncoras e possam gerar um maior dinamismo em termos económicos, sociais e culturais”, explica o antigo presidente do CCISP.

“O relatório por si só não é a peça final”

Para além do apoio adicional às instituições do ensino superior na região Centro, Joaquim Mourato defende o alargamento da oferta formativa que “vai permitir que todas as instituições tenham competências para desenvolver” e que haja “uma ligação cada vez maior à economia real”.

Noutro plano, o presidente da Associação Portuguesa de Ensino Superior Privado (APESP) e também presidente das Universidades Lusíada, João Redondo, considera que o relatório da OCDE mostra “a necessidade de uma estratégia nacional que envolva todos os agentes do sistema de ensino superior e os ‘stakeholders’ externos”, mas sublinha que fica por definir “quais os mecanismos reais que vão ser utilizados” para Portugal atingir as metas definidas pela OCDE até 2030.

“Estratégia” é a palavra que Elvira Fortunato, João Redondo e Joaquim Mourato consideram que deve ser o fio condutor do ensino superior em Portugal. Joaquim Mourato afirma que “o relatório por si só não é a peça final” e que é necessária uma estratégia “em articulação com os ministérios da Economia, Educação e da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior”.

“A administração pública é asfixiante em termos de aquisição de material para a investigação”

A estratégia, diz o presidente da APESP, deve “ir além dos ciclos governativos, para que fique entranhada na sociedade portuguesa”.

Já Joaquim Mourato acredita que é necessário “rever as carreiras dos docentes e investigadores” e permitir que possa existir “uma maior mobilidade entre instituições que permita um desenvolvimento de carreira de acordo com o perfil de cada um”.

Elvira Fortunato sublinha, contudo, que nenhuma estratégia para melhorar o ensino superior nacional pode ser colocada em prática enquanto houver “excesso de burocracia”.

Para a investigadora da FCT-UNL “a administração pública é asfixiante em termos de aquisição de material para a investigação”. A professora universitária frisa que é necessário proceder a mudanças estruturais: “Por muitos relatórios que se façam, se este problema não se resolver, não vale a pena andarmos a fazer estudos, porque, na base, o sistema não funciona”, remata.

Artigo editado por Sara Beatriz Monteiro