Retirava as peças, uma a uma, conhecia a ressonância das caixas, o impacto das madeiras e sabia as válvulas que transformam as ondas de rádio numa sinfonia audível. Manuel Silva, reparador e entusiasta dos aparelhos de rádio,  fez nascer, em Oliveira do Bairro, um território onde a rádio é rainha e senhora.

Radiolândia é o museu municipal dedicado aos rádios que recebeu o nome da antiga loja do comerciante. Mas essa não foi a única herança que Manuel Silva deixou ao museu. Também um espólio de cerca de 500 rádios, que pertenceram a pessoas do concelho, foi doado pelo colecionador. A história é um fator determinante e, se os rádios pudessem falar, contariam histórias das casas por onde passaram e das emissões que contabilizaram.

No museu, os visitantes podem gravar os seus próprios conteúdos.

No museu, os visitantes podem gravar os seus próprios conteúdos. Foto: cortesia do Museu Radiolândia

Mais do que um cemitério de rádios mortos, a Radiolândia é uma tentativa de celebrar a vida da rádio ao longo das décadas. “As peças funcionam praticamente todas. É uma das mais-valias dos objetos que temos e também fazemos questão de que estejam no melhor estado de conservação. Muitas peças estão a funcionar, apesar de não ser essa a sua função atual. São peças de museu”, explicou Sérgio Dias, responsável pelo museu, ao JPN.

“Estamos a falar de uma coleção de rádios que é considerada uma das mais relevante a nível europeu. E este museu surgiu com a ideia de criar um espaço onde essa coleção pudesse estar patente ao público em geral”, acrescentou o responsável do museu. Outros doadores seguiram o exemplo de Manuel Dias e, atualmente, o espólio da Radiolândia conta com mais de 1500 peças.

Os rádios mais antigos datam de 1920 e assinalam os primórdios da rádio, “ainda antes de o rádio surgir como um objeto comum ou uma peça de se ter em casa”. Os aparelhos acompanharam os discursos de Churchill, a eclosão da Segunda Guerra Mundial e, à escala nacional, as primeiras vozes da Emissora Nacional de Radiodifusão – que surgiu em 1935 -, as senhas do 25 de Abril de 1974 e as tentativas experimentais das rádios pirata.

O museu tem um espólio de mais de 1500 peças em exposição.

O museu tem um espólio de mais de 1500 peças em exposição. Foto: cortesia do Museu Radiolândia

No entanto, Sérgio Dias lembra que o foco principal do museu são os objetos: “São os rádios, são os recetores de rádio. Claro que fazemos a ponte para a rádio e a história da rádio não deixa de ser um tema de abordagem absolutamente essencial no nosso museu”. Por isso, a Radiolândia propõe-se explicar a parte técnica do funcionamento da rádio: “Contamos como é que as ondas de rádio surgiram, como é que elas se propagam, como é que as emissões de rádio são feitas e chegam até às nossas casas”.

O museu oferece também um estúdio de rádio que proporciona aos mais pequenos “a possibilidade de gravarem e simularem uma emissão de rádio”. Além disso, é possível encontrar em exposição peças raras que remontam aos inícios da rádio em Portugal.

“Temos alguns rádios que são exclusivamente de fabrico português, isto é, o único rádio fabricado totalmente em Portugal, o Lusito. Temos também um rádio da marca RCA, que produziu para a Emissora Nacional. A Emissora Nacional é aquilo a que podemos chamar de rádio do Estado Novo. Estava ligado ao regime do Estado Novo e era também uma forma de, a preços controlados, o regime colocar, na casa das pessoas, um rádio que passava a propaganda a Salazar”, explicou Sérgio Dias.

Os visitantes do museu têm a oportunidade de testar todas as potencialidades do meio e podem ser as vozes da rádio por um dia: “Podem fazer uma emissão de rádio, falar do estado do tempo, fazer um relato de um jogo futebol, ler as notícias, gravar a sua própria emissão e levá-la para casa”.

A Radiolândia abriu as portas ao público em setembro.

A Radiolândia abriu as portas ao público em setembro. Foto: cortesia do Museu Radiolândia

A Radiolândia resgata, ainda, aspetos das emissões mais antigas. “Temos também um rádio gigante que permite uma experiência, que se calhar hoje em dia é algo já estranho, mas que, para os mais velhos, era banal, que é aquela experiência da sintonização dos rádios rodando o botão e encontrando as várias frequências”, acrescentou o responsável pelo projeto.

O museu de Oliveira do Barro abriu as portas em setembro e já recebeu 2000 visitantes. Sérgio Dias diz que, apesar de o espaço estar pronto, ainda há espaço para expandir: “Apesar de o museu estar concluído e disponível ao público em geral, está ainda em aberto uma melhoria e uma ampliação da sua própria área”.

No mês em que se assinala o Dia Mundial da Rádio, estão previstas várias ofertas, entre as quais: “um ateliê infantil mais dedicado às artes plásticas, mas que serve para que as crianças venham também ao nosso museu e contactem connosco nesta data especial, a que demos o nome de ‘João e o Rádio em Cartão’ e que vai decorrer na próxima semana aqui no museu”, remata.

Artigo editado por Sara Beatriz Monteiro