O Reitor da Universidade do Porto reagiu à intenção do Governo de reduzir em 5% o número de vagas no ensino superior público da cidade do Porto e de Lisboa.
À conversa com o JPN, Sebastião Feyo de Azevedo disse que não é favorável à mudança que o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, pretende implementar.
Por outro lado, o presidente do Instituto Politécnico de Bragança, Sobrinho Teixeira, recebeu a proposta do executivo com agrado e declarou, ao JPN, que é uma mudança bem-vinda.
“Há vários aspetos a comentar sobre isto. Primeiramente, nós não fomos informados, não houve nenhum contacto connosco. É uma questão que não me agrada, mas o ministro tem o direito a fazer a sua política”, comentou Sebastião Feyo de Azevedo perante a notícia de que a Universidade do Porto pode passar a receber menos 5% de alunos.
O Reitor da Universidade do Porto recebeu a notícia com surpresa e contou que não sabia que a medida estava a ser pensada: “Não sabia. O ministro entendeu fazê-lo, mas eu não sabia”.
Integridade e integração territorial não passa por retirar “vagas a uma universidade”
Além disso, Sebastião Feyo acredita que a comunicação da medida poderia ter sido conduzida de outra forma, sobretudo em relação ao Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP): “O Conselho de Reitores tomou conhecimento e houve a questão sobre a forma como foi feito. Ontem à noite, foi enviado para o CRUP um e-mail, mas esse e-mail foi enviado para um endereço que não era o oficial do CRUP”, esclareceu o responsável da UP.
As razões evocadas pelo ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para o possível corte no número de vagas passam pela dispersão dos alunos pelo país, a partir dos grandes centros urbanos.
Sebastião Feyo de Azevedo concorda com a necessidade de repensar a redistribuição de alunos pelas regiões do interior, mas acredita que a medida do Governo não trará resultados significativos e que o problema não está a ser bem atacado: “Eu creio que nós temos de lutar muito pela integridade e pela integração territorial, temos de lutar por isso. Mas a forma de o fazer não creio que seja retirando vagas a uma universidade ou às outras universidades”.
“Estamos a falar de vagas de instituições públicas e esta missão pública de promover a coesão territorial parece-me que é uma medida a aceitar”
O Reitor da Universidade do Porto sublinhou ainda que os polos das universidades mais centrais devem auxiliar as das cidades mais próximas. “Todos nós achamos que temos a solução, que saberíamos resolver. Mas eu penso que a estratégia para levar mais estudantes para o interior passa por termos uma concertação entre as universidades a nível regional. Portanto, passaria, na minha opinião, por consórcios e pela promoção do esforço de colaboração académica – que não é fácil – no sentido da partilha de recursos académicos. É pela qualidade e pelo esforço articulado entre as instituições que se resolvem os problemas”, acrescentou.
“Uma proposta sensata”
No entanto, a opinião do presidente do Instituto Politécnico de Bragança está afinada com a do ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. “Parece-me uma proposta muito sensata face àquilo que é a realidade do país e às missões das instituições. Nós temos de promover a coesão territorial e a melhor forma de o conseguir é gerar conhecimento nas diferentes regiões do país, gerar massa crítica. Portanto, parece-me que corresponde a uma missão pública. Estamos a falar de vagas de instituições públicas e esta missão pública de promover a coesão territorial parece-me que é uma medida a aceitar”, salientou Sobrinho Teixeira.
Quando questionado sobre a eficácia da medida, o responsável do Politécnico de Bragança não hesitou: “A mim parece-me óbvio [que o número de alunos nas instituições do interior vai aumentar]. E eu queria ressalvar a importância que esses alunos terão para a unidade do próprio país. As instituições modernizaram-se e o sistema politécnico tem, hoje, um conjunto de recursos, quer materiais, quer humanos, muito elevado; está disperso pelo país. O país percebe o que é hoje o abandono do interior, que é um problema nacional. Tem de haver respostas e estratégias para contornar este problema. E parece-me que esta medida irá contrariar essa questão”.
“O que há a fazer é desenvolver a economia nas regiões do interior, para que se possa gerar emprego, para que as pessoas que querem possam ficar em Bragança”
O abandono do interior é uma questão para ser colocada na pauta do dia, segundo Sobrinho Teixeira. O presidente do politécnico acredita que é preciso oferecer mais incentivos a estas zonas, para que a economia se torne mais robusta e possa receber jovens de outras áreas do país.
“No politécnico, sabemos que a maior parte dos alunos não é da região. Se perguntasse aos meus alunos se ficariam em Bragança depois de aqui estudarem, a maioria ficaria. Preferiam ficar aqui em Bragança com o mesmo emprego do que noutra localidade. Ou seja, o facto de nós darmos a conhecer ao país que há mais país, para além de Lisboa e Porto, é muito positivo. Os estudantes acabam por apreciar esta nova realidade. O que há a fazer é desenvolver a economia nas regiões do interior, para que se possa gerar emprego, para que as pessoas que querem possam ficar em Bragança”, disse Sobrinho Teixeira.
Noutro plano, Sebastião Feyo de Azevedo levanta a questão da gestão dos recursos humanos como uma limitação da proposta do Governo. Contudo, o Reitor da Universidade do Porto disse que ainda não há planos pensados para contornar as consequências que a proposta trará.
“Também tem de haver uma pressão grande pela política dos governos, com incentivos. Porque tudo na vida se consegue se for com incentivos e não é ao tirar 200 alunos”
“Vamos analisar as consequências reais, os detalhes do que é dito, que cursos é que são abrangidos. Portanto, há um conjunto de aspetos a clarificar ainda”, realçou o Reitor.
As críticas de Sebastião Feyo de Azevedo ao plano do Governo também incluem uma nota à falta de incentivos e de outras medidas de parceria: “Nós temos de pensar em programas conjuntos, em projetos conjuntos, em promoção pela positiva da cooperação académica, da cooperação em cursos. Também tem de haver uma pressão grande pela política dos governos, com incentivos. Porque tudo na vida se consegue se for com incentivos e não é ao tirar 200 alunos… Mas já foi decidido e temos de analisar, também é preciso nós relativizarmos”.
Além disso, a definição dos cursos deixados de fora dos cortes também não é clara para Sebastião Feyo.
“Quanto a Medicina, não há dúvida, é fácil de perceber. Depois, há a Física. Nos politécnicos, não sei se a área da saúde ou cursos que possam ser classificados como relacionados com a saúde… Onde, para mim, há alguma confusão é nas chamadas TIC – Tecnologias da Informação e da Comunicação. Nessas áreas que cursos é que entrarão? Ainda não está muito claro”, salientou.
“São 210 alunos a menos, o que dará menos 210 mil euros [por ano], aproximadamente.”
Quanto às consequências financeiras da medida, o Reitor foi rápido nas contas: “É relativamente simples. Estamos a falar em 210 alunos. Bom, se entrarem para outros cursos, ou, por outra, saindo dos nossos, são 210 alunos a menos, o que dará menos 210 mil euros [por ano], aproximadamente.”
Apesar disso, Sebastião Feio disse que esse não é o principal problema que a medida lhe suscita.”Em termos financeiros, obviamente que nada ajuda. É mais um problema que nós temos. Mas eu diria que, para lá do problema financeiro, temos o problema da governação e isso perturba-me bastante, preocupa-me bastante”, rematou.
Artigo editado por Sara Beatriz Monteiro