O Movimento 5 Estrelas (M5E) venceu as eleições legislativas italianas sem maioria absoluta, no passado dia 5 de março. O partido antissistema liderado por Luigi di Maio poderá ser a maior força política no Parlamento graças aos 32,7% dos votos para a Câmara dos Deputados e 32,2% para o Senado.
Apesar de, durante toda a campanha, ter afirmado que não faria coligações, o líder do contestatário “5 Stelle” tem vindo a negociar com outros partidos para tentar chegar ao poder.
Se conseguir formar Governo, Luigi di Maio, de 31 anos, torna-se o mais jovem primeiro-ministro do mundo.
De “steward” a líder do 5 Estrelas
Luigi di Maio nasceu a 6 de julho de 1986 em Avellino, uma localidade a oeste de Nápoles, famosa no pequeno ecrã por ter sido a cidade natal da família Soprano, que dá nome à série da HBO.
Cresceu no seio de uma família tradicional católica: filho de Paola, professora de Latim e de António, dono de uma empresa de construção e antigo membro do partido neo-fascista Movimento Social Italiano – formado por apoiantes de Mussolini após a Segunda Guerra Mundial.
O mais velho de três filhos, Luigi di Maio, passou a sua juventude em Pomigliano d’Arco, uma cidade industrial nos subúrbios de Nápoles, onde estão sediadas empresas automóveis e aeroespaciais como a Fiat e a Alenia Aermacchi.
Talvez seja por isso que Luigi tenha, desde sempre, sentido um fascínio por “motores e carros” e pela figura de Enzo Ferrari – “um homem a admirar pela sua capacidade de realizar um sonho empresarial”, como confessa no seu CV no site do Movimento 5 estrelas.
Di Maio estudou Engenharia Informática e Direito mas não terminou nenhuma das duas licenciaturas.
Na escola, era bom aluno e mostrava um grande interesse por informática. Começou a dar os primeiros passos no ativismo estudantil em 2002, ao lutar por melhores instalações depois de um sismo destruir uma escola primária italiana e matar 27 crianças e uma professora.
Di Maio conta ainda que aos 10 anos queria ser polícia porque sentiu “a necessidade de fazer justiça numa terra devastada pela Camorra” – a máfia siciliana.
No entanto, em 2004, ingressou na Universidade de Nápoles Frederico II para estudar Engenharia Informática, tendo depois pedido transferência para Direito. Não chegou a completar qualquer uma das licenciaturas. Na faculdade de Direito, foi presidente do conselho estudantil e fundou a Studentigi, uma associação ainda ativa que lida com a proteção dos direitos dos estudantes.
Ao mesmo tempo que frequentava a universidade, Di Maio começou um projeto ligado ao comércio eletrónico e marketing digital, que entretanto abandonou.
Em 2011, trabalhou como voluntário junto de refugiados da Líbia e em 2012 chegou mesmo a produzir um documentário sobre o comércio em Pomigliano d’Arco e a escrever sobre eventos e notícias locais. Trabalhou ainda em restaurantes, estaleiros e como segurança no estádio de San Paolo, do SCC Nápoles.
Ascenção prodigiosa
A pouca experiência de Di Maio tem vindo a ser usada contra ele, mas a principal vantagem do candidato do Movimento 5 Estrelas a presidente do Conselho de Ministros parece ser a extraordinária capacidade de reinvenção.
A ascensão de Di Maio até ao topo da política italiana foi rápida e de acordo com alguns, acidental.
Luigi Di Maio integrou em 2007 o movimento que viria a tornar-se, dois anos depois, no “5 Stelle”. Em 2010, concorreu, sem sucesso, para o Conselho de Pomigliano d’Arco, mas, segundo dizem, nem o seu pai votou nele. Três anos depois, contudo, venceu uma seleção online do partido e tornou-se candidato parlamentar do “5 estrelas”.
Aos 26 anos, ascendeu a vice-presidente da Câmara dos Deputados italiana, tornando-se o mais novo de sempre no cargo.
Luigi di Maio trouxe uma mensagem menos inflamada e mais ponderada ao Movimento 5 Estrelas.
Com apenas 31 anos, Di Maio é o extremo oposto do fundador, Beppe Grillo, que no início do ano passado abandonou a ação política.
Veste fato e gravata, não grita e quer governar, não só protestar, de acordo com alguns jornais italianos. Ao estilo feroz, à postura disruptiva e ao discurso populista que o comediante pregou durante os últimos anos, Di Maio respondeu com moderação e sobriedade. Segundo o próprio, aperfeiçoou a calma e concentração durante os anos em que praticou natação e mergulho.
Em setembro do ano passado, Di Maio conseguiu 30 mil dos 37 milhares de votos e foi eleito cabeça de lista do partido. O jovem político parece ser a figura ideial para credibilizar o Movimento 5 Estrelas e tentar fazer a transição de uma oposição exaltada para um potencial partido governante.
Contrariou o discurso antieuropeu, antipartidos e antissistema do “5 Stelle” e conquistou quase um terço dos italianos através de uma mensagem menos inflamada e mais ponderada. O candidato já deixou claro: “Não queremos uma Itália populista, extremista ou antieuropeísta”.
A oposição caracteriza Di Maio como “um camaleão que se adapta à mudança das circunstâncias, uma invenção”
No entanto, a oposição retrata-o como um oportunista pronto a dizer o que for preciso para garantir as chaves do Palazzo Chigi, a residência oficial do primeiro-ministro italiano, no centro de Roma.
“Um camaleão que se adapta à mudança das circunstâncias, uma invenção”, afirma Anna Ascani, do derrotado Partido Democrático de centro-esquerda.
Há também quem argumente que o candidato é um fantoche de Grillo, que continua a manipular o “5 Stelle” por trás da cortina. “É o homem que está a ser escolhido ou a sua capacidade de acatar ordens e dar conselhos?”, questiona o diário “La Stampa”.
Outros acreditam que os resultados do Movimento 5 Estrelas nas eleições se devem a Di Maio ser “jovem e telegénico”.
As promessas
Di Maio pode ser o mais recente político italiano a fazer promessas pouco realistas para uma geração e um país desesperado por mudança. Mas desta vez, os eleitores deram-lhe o benefício da dúvida.
Bem educado e sempre imaculadamente vestido e penteado, Di Maio assume-se como católico não praticante. Ao nível político, apesar de fazer parte de um partido antissistema diz-se moderado. As raízes familiares ligadas à direita, contudo, levam a crer que possa tender mais para este lado.
O sucesso do M5E começou por ser fruto de uma revolta juvenil e ainda é esta faixa etária que deposita mais fé no movimento e vê em Di Maio um líder jovem e próximo das pessoas.
Luigi di Maio prometeu aos seus eleitores:
- um rendimento universal para os mais pobres de 780 euros;
- aumentar o défice orçamental;
- revogar cerca de 400 leis, incluindo medidas que permitem a reforma antecipada e facilitam os despedimentos;
- aumentar os impostos às empresas;
- investir na educação;
- acabar com os combustíveis fósseis até 2050;
- melhorar as relações com a Rússia.
Rejeitou, por exemplo, fazer um referendo à permanência de Itália na União Europeia (UE) e defendeu a via da negociação como primeira aposta e recusa políticas de austeridade.
Acerca da imigração, o Movimento 5 Estrelas anda ao sabor da onda. Em abril do ano passado, Di Maio criticou publicamente as organizações humanitárias que resgatam refugiados, dizendo serem “táxis do Mediterrâneo”. O candidato ignorou as declarações durante a campanha e mais recentemente, tem vindo a defender uma maior distribuição de refugiados pela União Europeia.
Os jovens, as camadas mais pobres e o sul de Itália apoiaram Di Maio e as promessas do M5E de travar a corrupção pública, acabar com as políticas de austeridade da UE e oferecer apoios sociais.
Depois da “Primeira República”, iniciada após a queda do regime de Mussolini e da segunda, com Berlusconi já nos anos 90, Di Maio garante que vai começar a “Terceira República”, assente na resolução dos problemas e não na velha dicotomia esquerda-direita.
Artigo editado por Filipa Silva