Com um pontapé à entrada da área sem hipótese de defesa para Varela, Herrera transformou-se no herói improvável do clássico da Luz.  O golo valeu três pontos, a liderança do  FC Porto a quatro jornadas do fim e a entrada com brilho nas manchetes dos jornais.

Na memória de todos os portistas, o golo do internacional mexicano tem ligação direta a um outro, marcado a 6 de novembro de 2016 quando uma distração de Herrera originou o canto que levou ao empate (1-1)  do Benfica no Dragão nos instantes finais da partida.

De mal-amado a herói

Chegou ao FC Porto no verão de 2013 vindo do Pachuca e desde o início que o seu desempenho esteve sob um clima de desconfiança. O FC Porto pagou 18 milhões pelo mexicano que, por este valor, se tornou no segundo jogador mais caro da história portista apenas ultrapassado por Hulk que custou 22 milhões.

Com uma adaptação demorada, Herrera chegou a jogar pela formação secundária dos portistas e foi visto como uma alternativa pelo treinador Paulo Fonseca.

Sob o comando de Lopetegui e Nuno Espírito Santo,  o médio foi-se tornando cada vez mais primeira escolha. Tendo exibições tanto boas como más, essa irregularidade continuava sem convencer grande parte da bancada portista.

Quanto ao balneário, tinha o respeito dos colegas e assumiu a braçadeira de capitão. O facto suscitou surpresa a Sérgio Conceição, quando o técnico dos dragões ali chegou em junho do ano passado. “‘Um mexicano capitão de equipa?’, confessou ter pensado Sérgio Conceição. “Depois de começar a trabalhar com ele percebi porquê”, partilhou com os jornalistas na conferência de imprensa de domingo.

O capitão do FC Porto tem sido muito elogiado nas redes sociais não só pela vantagem que deu aos azuis e brancos mas também por no momento de festejar o golo frente ao Benfica ter dado maior relevância ao coletivo e ao emblema portista.

Herrera é o jogador que há mais tempo está ao serviço do FC Porto e cujo contrato termina no próximo ano havendo notícias de que os dragões estão já a tratar da renovação com o médio.

Herrera foi o herói de uma partida cujo vencedor apenas foi revelado ao cair do pano. Créditos:

Herrera foi o herói de uma partida cujo vencedor apenas foi revelado ao cair do pano. Foto: FC Porto

Sentimento ambivalente é “extremamente injusto”

Na visão de Pedro Bouças, o sentimento ambivalente que muitos adeptos manifestam sobre Herrera, não é justo: “A única coisa que não é negociável e pode levar os adeptos a não gostarem de determinado jogador tem a ver com a sua falta de compromisso e de atitude e nisso ninguém pode, de forma alguma, colocá-lo em causa”, diz ao JPN.

“Herrera não merece esse tipo de comentários porque dá tudo o que tem e quem dá tudo o que tem e que pode a mais não é obrigado”, sublinha o fundador do blogue Lateral Esquerdo. Acrescenta ainda que é “extremamente injusto que qualquer jogador que coloque o grupo acima do eu seja criticado”, defende.

“Era muito irregular o que fazia com que não tivesse, até agora, conseguido convencer os adeptos”

Por sua parte, João Nuno Coelho relembra, em conversa com o JPN, o momento pouco feliz quando na época passada no FC Porto-Benfica o médio esteve envolvido no lance que acabaria por dar o golo aos encarnados: “Foram acontecendo algumas situações em que realmente o jogador tornou-se pouco querido da massa associativa”, recorda.

O autor do programa “Números Redondos” da TSF vê em Herrera um caso curioso, no que diz respeito às prestações do jogador, que depois de mostrar grandes performances nos primeiros tempos no FC Porto “não conseguiu confirmar essa qualidade”. Herrera “tem um historial de bons golos no FC Porto e de momentos em que foi importante, mas a verdade é que era muito irregular o que fazia com que não tivesse, até agora, conseguido convencer os adeptos”.

Dificuldades de adaptação ao estilo de jogo portista

O tipo de jogo de Lopetegui não se adequava às características do médio que tem “um jogo mais direto em que se faz muito transporte de bola” enquanto o estilo do treinador era “mais apoiado e em que a qualidade de passe era uma das características fundamentais”.

“Nunca ninguém negou que fosse um jogador com qualidades, mas as suas capacidades pareciam estar afetadas com o tipo de jogo que a equipa fazia”, analisa para à frente relembrar que na seleção mexicana Herrera “continuou a fazer boas exibições”.

Pedro Bouças complementa defendendo que o internacional do México, no modelo de jogo portista, que passa muito pela posse de bola e por procurar soluções criativas, demonstra “alguma dificuldade”. Já em partidas mais complicadas e em que o FC Porto tem “menos bola e precisa de ter maior rigor tático, é um jogador muito cumpridor”.

“É o jogador que está há mais anos no FC Porto e essa também é uma das razões para ele ser o capitão de equipa e deve ser muito bem visto pelos colegas e dar realmente um bom ambiente à equipa”, defende João Nuno Coelho.

“Muito mais importante que o golo tem sido o trabalho que tem feito nesta temporada”

Para sociólogo, o golo deste domingo na Luz acaba por “compensar um pouco o jogador pelos tempos difíceis que passou e pela humildade e espírito de grupo” que demonstra e por colocar o clube acima dos seus “objetivos pessoais”.

“Muito mais importante que o golo tem sido o trabalho que tem feito nesta temporada. É um dos jogadores mais utilizados pelo Sérgio Conceição, no inicio nem sequer era titular absoluto e ainda disputou o lugar com o Óliver e Otávio, mas a partir de uma certa fase tem sido utilizado praticamente em todos os jogos”, observa.

Já Pedro Bouças acha que “não provou que é melhor jogador por conta daquele grande golo” e que não é por marcar que “passa a ser automaticamente um jogador criativo e capaz jogar em espaços curtos e resolver problemas ofensivos”, afirma.

João Nuno Coelho acrescenta: “não deixa de ser típico do futebol que de um momento para o outro se torne um herói por causa de um remate que saiu bem e que deu uma vitória realmente muito importante ao FC Porto”.

Um médio que combina com o estilo de jogo de Sérgio Conceição

No que diz respeito às suas qualidades o sociólogo  defende que é “um dos jogadores fundamentais” por demonstrar “grande versatilidade, capacidade de luta e equilíbrio entre as funções ofensivas e defensivas e é capaz de ir de uma área à outra com grande facilidade. Não é por acaso que marca o golo mesmo sobre o final do jogo”.

“Neste momento, o Herrera não é titular do FC Porto porque o Danilo está lesionado, mas sim porque é o lugar dele e é um jogador que combina como uma luva neste sistema do Sérgio Conceição”, acrescenta João Nuno Coelho.

Pedro Bouças realça ainda o “rigor tático, a entrega, a disciplina e a atitude competitiva”, mas em termos técnicos e de tomada de decisão “não é um jogador extraordinário e que faça a diferença no processo criativo no FC Porto”.

Herrrera é um jogador importante para a equipa capaz de pressionar a saída de bola do adversário

Já João Nuno Coelho acredita que as características menos positivas foram mais evidente na “altura em que o FC Porto jogava um futebol diferente, mais apoiado”, e acrescenta ainda a “inconstância na capacidade de passe e alguma desconcentração” que contribuiu para a sua irregularidade e dificuldade em manter o nível exibicional.

“Ele não é um jogador para jogar num 4-3-3 em apoio no fundo um bocadinho o oposto do Oliver Torres. O Oliver Torres era um jogador que se distinguia e estava como peixe na água num modelo de jogo mais apoiado típico de Lopetegui.

Agora neste estilo de jogo de Sérgio Conceição, Herrrera é um jogador importante para a equipa capaz de pressionar a saída de bola do adversário mesmo em zonas bastante subidas. É um jogador pouco paciente, com pouca noção da pausa o que é importante num jogador de futebol do meio campo.

O sociólogo acredita que com Sergio Conceição “as principais características do médio estão a ser potenciadas ao máximo”.

É do interesse dos dragões “renovar o contrato por ser um ativo valioso e um jogador internacional”

Em termos estatísticos, sublinha que é o “quinto ou sexto jogador com mais encontros realizados mesmo não tendo sido titular desde o inicio e, portanto, é uma das figuras desta temporada. Tem mais de três mil minutos realizados o que demonstra bem a importância dele na equipa. Também tem estado sempre disponível”.

“Mesmo não tendo começado a época da melhor maneira e tendo falhado alguns do jogos do inicio do campeonato é neste momento o jogador mais importante do meio-campo do FC Porto. Tem estado sempre no onze inicial e tem em grande destaque no meio campo portista”, conclui.

“…são jogadores como o Herrera que, dentro do grupo, fazem prevalecer o ‘nós'”

Questionado pelo facto de o médio portista estar com o contrato a terminar, Pedro Bouças acredita que é do interesse dos dragões “renovar o contrato por ser um ativo valioso e um jogador internacional por uma seleção que costuma fazer boa figura nas grandes provas mundiais. É também um jogador que conquistou o seu espaço com Sérgio Conceição”.

Herrera é um jogador que se destaca pela humildade, coisa rara nos dias que correm: “cada vez mais no futebol há muita gente a pensar só no eu e são jogadores como o Herrera que, dentro do grupo, fazem prevalecer o ‘nós’ e ajudam a que a equipa se mantenha focada”.

“Mesmo quando não joga não cria problemas para o treinador e isso é muito importante para que um grupo funcione e para que depois dentro do relvado todos estejam focados em trabalhar por um objetivo comum. É muito interessante do ponto de vista daquilo que um treinador espera do comportamento de um jogador fora das quatro linhas”, conclui o técnico.

A humildade é uma das características atribuídas ao médio mexicano.

A humildade é uma das características atribuídas ao médio mexicano. Foto: FC Porto

“Herrera é um jogador muito importante para o México”

O golo de Herrera teve grande impacto ao nível internacional, sobretudo no México. Andrés Flores, jornalista do AS México, conta o que viu na partida da Luz: “foi um golo muito falado não só pela qualidade técnica, mas pela importância que teve para o campeonato”. “Agora todos esperam que jogue a esse nível no Mundial 2018”, acrescenta.

Andrés Flores refere ao JPN ainda que Herrera recebe muita atenção dos media mexicanos: “quer jogue ou não, os media falam sobre ele por ser um jogador muito importante para o país”.

Quanto à possibilidade se ser chamado à seleção, Andrés Flores não tem dúvidas e afirma que “Herrera é um jogador chave no meio-campo mexicano” e que sem ele a seleção ficaria “em dificuldades”.

Em relação ao facto de ter passado por momentos menos positivos com os adeptos portistas, o jornalista explica que no México muitas vezes colocam as “expectativas muito altas porque sabem do que ele é capaz de fazer” e por causa disso por vezes sentem-se “frustados” com o jogador.

O jornalista refere ainda que Herrera está “melhor em todos os aspectos de jogo” e que essa diferença “é notada cada vez que representa o México”, conclui.

Artigo editado por Filipa Silva