É mais uma tarde de trabalho no Mercado da Foz, na Rua Diu, no Porto. E as opções, para quem o visitar, são várias. Há quem venha almoçar. Uns que vêm comprar peixe ou umas peças de fruta que faltavam em casa. E outros que aproveitam apenas para pôr a conversa em dia.

74 anos depois da sua inauguração, a 15 de janeiro de 1944, já nada (ou quase nada) está como era. Mantém-se a tradição, mas há espaço para novas propostas. Apesar de tudo, ainda existem negócios que vão resistindo à passagem do tempo. O exemplo é dado na primeira pessoa por Eduardo Monteiro, o sapateiro que continua a alimentar um negócio com 40 anos.

“Eu sempre gostei de trabalhar”, diz Eduardo Monteiro, e o gosto pelo ofício é uma ferramenta essencial que encontra para explicar como mantém o negócio vivo.

“Apesar de ser um negócio antigo, ainda há quem arranje sapatos”. A voz é de Miguel Monteiro, o filho, que tem nas mãos a responsabilidade de continuar com o negócio de família. “Trabalha aqui o meu pai, trabalha o meu tio [Amadeu Monteiro] e agora eu”, explica.

Eduardo Monteiro é o sapateiro no Mercado da Foz há 40 anos, um dos negócios mais antigo no mercado. Foto: Ana Jorge Teixeira

Eduardo Monteiro é o sapateiro no Mercado da Foz há 40 anos, um dos negócios mais antigo no mercado. Foto: Ana Jorge Teixeira

Além da cerca de uma dezena de novos negócios que se instalaram no local nos últimos quatro anos, o mercado continua a dispor de uma peixaria, um talho, duas floristas e mercearias com produtos frescos.

A Peixaria Celeste Cadilhe, a única do mercado, é mais um exemplo de sobrevivência. Já existe há mais de 40 anos e é outro negócio de família. “Era da patroa da minha mãe”, conta Ana Cadilhe, filha, que acabou por passar o negócio à mãe, Celeste Cadilhe.

Não muito longe da banca da peixaria está David Santos, dono da Mercearia do Mercado. “Vi o espaço num anúncio do jornal”, diz. Não pensou duas vezes e decidiu aproveitar a oportunidade para abrir o seu negócio. Foi assim que nasceu a mercearia que hoje já conta com nove anos de existência. É a loja mais exposta do mercado, uma vantagem para o negócio.

Questionado sobre a fórmula para o sucesso, David Santos afirma que sendo um negócio ligado à alimentação é tudo uma questão de “não esticar demasiado os preços” e de respeitar as “necessidades da clientela”: “a loja não tem o que eu quero mas sim o que os clientes pedem. E as pessoas comer, vão precisar de comer sempre”.

Falar de sobreviver ao tempo é também falar de Maria Coimbra, dona da única retrosaria que há no mercado. Ou de Rui Borges, que trabalha numa loja de reparações de eletrodomésticos há 35 anos. Ou do Cantinho da Dona Adosinda, que serve refeições na hora ou para levar para fora.

O mercado da Foz é já uma espécie de “segunda casa” para alguns dos comerciantes que estão lá há mais tempo. Mas também já o é para aqueles que foram instalando novos negócios.

É o caso da Hamburgueria do Mercado, de portas abertas há três anos. “É um conceito, na minha opinião, engraçado porque aqui é tudo fresco”, confessa Alexandre Brandão, gerente do espaço. Umas das vantagens de estar ali é, conta o gerente, poderem abastecer-se no próprio mercado: “A carne compramos cá, as batatas e as alfaces compramos aqui em frente na mercearia”.

Para Alexandre Brandão, os novos negócios têm sido uma mais-valia para os comerciantes mais antigos: “Nós, os novos, estamos a fazer com que venha mais gente ao mercado. E ao vir mais gente, é bom para todos”. “Alguém que venha cá almoçar, é capaz de depois ir dar uma volta e até se lembra que tem que comprar maças ou flores. E aproveita e faz umas compras. Acaba por ser lucrativo para todos”, conclui o gerente da hamburgueria.

Pratos Pedidos é o negócio que Constança Vasconcelos decidiu montar no mercado há cinco anos. E o nome surgiu por uma razão simples: além dos pratos do dia que são servidos, quem lá vai pode escolher o que quiser. E, por isso, só fazia sentido abrir num mercado.

Outros dos novos espaços de restauração é o Famous Dog. Abriu em 2016, mas como o espaço era pequeno decidiram reabri-lo dois anos depois. Cada cachorro Famous Dog está associado ao mundo cinéfilo e à banda desenhada e por isso cada um representa um “herói canino”, como a Lassie, o Rex, o Brian ou o Scooby. Além de cachorros, servem tostas, pregos, saladas ou tábuas e tapas de queijos e enchidos. “À sexta-feira temos sempre música ao vivo a partir das 18h30. E há sempre Happy hour das 16h30 às 19h00”, conta Rita Lobo Xavier, uma das funcionárias.

E para já, o feedback tem sido positivo: “Temos um público muito variado. Temos muita gente muito diferente e estamos sempre cheios à hora de almoço e ao fim do dia também vem muita gente” conclui Rita Xavier.

E visitantes, para já, não têm faltado. Uma grande fatia do público é a população estudantil. Isto porque, ali perto estão a Universidade Católica, o colégio inglês, o CEBES ou a escola da Torrinha.

Expansão do mercado

O edifício entrou num processo de reabilitação em 2014. “O mercado não tinha sequer ligação ao saneamento”, explica ao JPN Nuno Ortigão, presidente da Junta da União das Freguesias de Aldoar, Foz do Douro e Nevogilde.  Esta obra, já executada, fazia parte do projeto “prioritário” para a reabilitação do mercado municipal gerido pela freguesia.

Um dos principais objetivos sempre foi “tornar o mercado mais apelativo”, isto porque “havia um problema de abandono”, confessa Nuno Ortigão. Algumas lojas estavam vazias e muitos negócios não estavam a funcionar.

Alterou-se também a entrada, com o desmantelamento do varandim, para que o “mercado ficasse mais visível do exterior”, diz Nuno Ortigão. Montaram-se duas esplanadas, tirou-se o amianto dos telhados, as fachadas foram modernizadas e criou-se uma nova galeria técnica para substituir o quadro elétrico que estava “completamente obsoleto”.

Da lista das alterações, espaço ainda para construção de novos cacifos, “melhores e mais funcionais” e alargamento do horário de funcionamento(aberto todos os dias até às 22 horas e às sextas e sábados até à meia-noite). Para Nuno Ortigão, outros dos “espaços decisivos” foi a implementação do “Espaço Cidadão”, porque “trouxe ao Mercado da Foz cada vez mais pessoas”.

A primeira fase das obras está terminada, falta a próxima que prevê a expansão para o Lavadouro da Ervilha. Nele prevê-se a “criação de duas novas casas de banho” e uma área de restauração maior, porque “ela está frequentemente cheia e o espaço não é muito grande”, remata Nuno Ortigão. Salvaguardado ficará o funcionamento dos tanques que lá existem e que ainda são usados.

A missão passa por continuar a fazer do Mercado um espaço multi-serviços “como sempre foi”, sem perder a identidade e preservando a área de frescos. Nuno Ortigão acredita que as obras foram um passo importante uma vez que “não fazia sentido um mercado tão bonito e tão interessante se mantivesse sem vida. Que é o que hoje tem e, “ainda bem”.

Artigo editado por Sara Beatriz Monteiro