Granito, terra batida, folhas secas, silvas, granito, terra batida… Dois pés descalços, dois joelhos comprimidos contra um chão armadilhado, sempre diferente. As costas das “carreteiras”, como eram conhecidas, iam vestidas por carrêgos com o peso da gravidade.

Na primeira metade do século XX, as estradas da Rota dos Móveis, no norte de Portugal, eram percorridas por estas mulheres que, muitas vezes descalças, andavam quilómetros para entregar encomendas transportadas às costas: cadeiras, bancos, cómodas, guarda-fatos.

As viagens com partida de Lordelo, em Paredes, terminavam no Porto, na Póvoa de Varzim, em Lamego, Lousada e noutras localidades em redor. Mas as histórias não se esgotam nas distâncias. As agruras iam além disso.

Maria Lamas, Isabel e Alice não se encontraram pelo caminho. No entanto, o que contam e cantam as antigas “carreteiras” é um percurso de sacrifício, de uma meninice pobre, passada a bacalhau seco e alguns tostões.

As agora octogenárias descansam, agora, no Centro Social e Educativo de Parteira. Ao JPN, as três desenharam um cenário duro, abafado pela inocência da infância, pesado como os móveis que carregavam, em nome da necessidade e da tradição.

O “trabalho de formiguinha” das Carreteiras permanece quase invisível. Muito poucos lhes conhecem a existência fora destas localidades. Fernando Moreira, que encenou uma peça sobre elas, estreada em 2017, “Mulheres Móveis”, acha contudo  que a história destas mulheres tem “um lado ecuménico e universalista” de uma certa “portugalidade” que encontrou eco em várias cidades do país por onde andou a peça.

Estreou em Lordelo, passou pelo Porto, e ainda há pouco foi reposta em Lousada onde encontramos o encenador que nos falou do que encontrou nesta história.

No vídeo acima, ouvimos as histórias de Maria, Isabel e Alice que connosco, numa tarde de abril, voltaram à estrada. Desta vez, sentadas.