“Mais financiamento para mais alojamento!”. Este foi um dos gritos de revolta que ecoou, segunda-feira à noite, na Praça dos Leões. Dezenas de estudantes do ensino superior manifestaram o seu descontentamento para com a falta de alojamento e a especulação imobiliária.
O protesto foi organizado pela Federação Académica do Porto (FAP) e foi pela voz do presidente da estrutura que se ouviu o relato mais alarmante: “Um email que chegou à FAP, na semana passada, reportava a situação de dois colegas que dormiam num carro, porque não tinham alojamento e não queriam faltar às aulas”.
Sobre estes estudantes, o dirigente associativo disse não ter mais informações, tendo a FAP solicitado ao remetente que preste mais esclarecimentos sobre o caso.
Faltam alternativas acessíveis
Na Praça dos Leões estiveram, contudo, outros estudantes com queixas sobre os preços da habitação.
Daniela Silva e Gonçalo Soares têm 21 anos e estudam, respetivamente, Ciências Farmacêuticas e Medicina na Universidade do Porto. Os dois são estudantes deslocados e estão alojados em zonas diferentes da Invicta, mas padecem do mesmo problema.
Daniela deixou Oliveira de Azeméis para prosseguir o Ensino Superior. Durante a semana, reside na baixa portuense e sente que “os preços de arrendamento estão com uma elevada sobrecarga relativamente ao que seria justo pagar pelo quarto”. Gonçalo, oriundo de Santa Maria da Feira, vive na zona do pólo universitário da Asprela, onde “todos os anos chega um grande número de alunos e a procura aumenta bastante, pelo que os senhorios têm uma tendência para subir a renda”.
Daniel Magalhães, 24 anos, frequenta o Mestrado em Engenharia Civil no Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP). O estudante contesta a falta de alternativas económicas: “ou somos obrigados a aceitar as condições que nos são impostas, ou a dormir na rua, ou a fazer viagens de 50 a 100 quilómetros todos os dias”.
“A maioria dos estudantes, quando vai estudar, sobretudo para o Porto e para Lisboa, tem que comportar um preço elevadíssimo para alugar um quarto, muitas vezes sem condições. Já para não falar que as próprias residências académicas são insuficientes e têm uma grande falta de condições materiais. E são os estudantes que muitas vezes têm de colmatar estas deficiências com dinheiro do próprio bolso “, declara Afonso Sabença, 19 anos, estudante de Psicologia da Universidade do Porto.
Segundo o jovem, “limitar os problemas estruturais do Ensino Superior à problemática das residências é muito redutor”. Questões como a propina ou encargos com os transportes também preocupam Afonso. O estudante atribui a causa destes problemas à “falta de investimento que há por parte do Estado no Ensino Superior”.
Porém, não é só entre os alunos da universidade pública que se gera a indignação. Kevin Camino, 23 anos, presidente da Associação Académica da Universidade Lusíada do Norte (AAULN), considera que o problema é “geral”. O jovem critica a escassez de soluções apresentadas: “As respostas das entidades têm sido nulas ou muito poucas”.
Que soluções?
Para ajudar à resolução do problema, a FAP propõe a “atualização do complemento ao alojamento, atribuído aos estudantes bolseiros deslocados que não têm vagas nas residências”, explica João Pedro Videira. Numa segunda instância, a proposta da federação passa “por um plano de investimento na reabilitação e construção de residências”.
João Pedro Videira refere, ainda, que “o Plano de Alojamento para o Ensino Superior [apresentado este ano pelo Governo] não é minimamente atrativo para instituições académicas do Porto e Lisboa, quando estas zonas são as mais pressionadas com esta questão”.
Recorde-se que, em maio de 2018, o Governo anunciou o Plano Nacional de Alojamento para o Ensino Superior. A iniciativa reconhece a escassez da oferta neste mercado e propõe um conjunto de instrumentos financeiros, nomeadamente ligados à reabilitação de edifícios, aos quais privados, universidades e politécnicos possam ter acesso. Apesar de contemplar, também, incentivos fiscais a privados para arrendarem a preços acessíveis, esta medida foi considerada insuficiente pela comunidade estudantil por não se ter feito sentir de imediato.
De acordo com números apresentados nessa altura pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em Portugal 42% dos estudantes do ensino superior público são deslocados. Na zona do Grande Porto há menos de uma cama para cada dez estudantes deslocados, considerando a oferta das residências das instituições de Ensino Superior.
Artigo revisto por Filipa Silva