Garante que a Eurovisão foi o maior desafio de ordem física que já enfrentou, mas é no “5 para a Meia-noite” que despende boa parte da sua (muita) energia. O programa da RTP, diz, já tem um lugar seguro. Além de que, “haver um talk show em Portugal apresentado por uma mulher e isso não ser uma questão é muito fixe”, sublinha a atriz e apresentadora. O seu próximo desafio mora no teatro. Filomena Cautela esteve no Porto a moderar o debate “Comunicação (Im)Provável” e falou no final com o JPN.

Em que é que se inspira no dia a dia?

Inspiro-me no meu cão [risos]. Sabes o que é que me inspira, sinceramente? Inspira-me quando trabalhas com uma equipa que dá o litro e que às vezes faz bolos de casamento sem farinha, sem ovos, sem nada. E no final de um dia de trabalho, as pessoas virem ao pé de ti e dizerem: “obrigada, foi um grande programa” ou “foi uma grande ação”. Inspira-me que as pessoas se sintam realizadas com os próprios trabalhos e a alegria das pessoas quando o trabalho é bem feito e quando teve algum impacto noutra pessoa. Isso inspira-me: ter impacto na vida das pessoas, proporcionar um ponto de vista diferente em relação a seja o que for.

Qual é a rotina de preparação do “5 para a Meia-noite”?

Não é bem uma rotina, porque isto é uma espécie de “nunca para”. A nossa rotina é: na quarta-feira já estamos a preparar o programa da semana seguinte. Na quinta-feira, temos programa e a seguir ao programa já pela madrugada trocamos umas ideias do que é que correu bem e do que é que correu mal e o que é que podemos fazer no programa a seguir. Sexta-feira temos uma reunião muito grande para delinear convidados, rubricas, etc. E depois sexta, sábado, domingo, segunda, terça e quarta é partir pedra, ideias, brainstorming. Não há bem uma rotina. É como os atores, nunca têm um horário de trabalho. Estás sempre um bocado a trabalhar.

Já lá vão 13 temporadas. O programa está melhor que nunca?

Ficar-me-ia muito mal dizer que sim. Facto é que o programa neste formato tinha muito para conquistar e conquistou. E, portanto, eu só posso estar muito agradecida. Acho que o “5 para a Meia-noite” está num sítio absolutamente estabelecido. A nossa audiência cresce todas as semanas, quer no digital quer na televisão. É muito complicado tentar fazer um espaço numa televisão que é cada vez mais quadrada, tentar rasgar e arriscar e acho que nós temos conseguido fazer isso sem melindrar as pessoas, sem sermos desagradáveis. Mais do que isso, haver um talk show em Portugal apresentado por uma mulher e isso não ser uma questão é muito fixe. Acho que o sucesso do programa está no crescimento que todas as semanas nós temos sentido, nos números.

Já disse noutras entrevistas que era uma criança insegura. Como é que se dá a transformação para uma pessoa que está tão à vontade?

É do meu trabalho como atriz. Eu aprendi a construir personagens muito rapidamente, aprendi a que essas personagens fossem cada vez mais robustas. O meu trabalho como apresentadora é um bocado isso: é uma personagem que eu construí ao longo de muitos anos e que eu posso pôr e tirar quando me apetece. Todas as minhas inseguranças e a pessoa que realmente eu sou, raramente aparecem publicamente. Acho que nunca apareceu, na verdade.

A Eurovisão foi até agora o maior desafio?

Não sei se foi o meu maior desafio. Fisicamente, provavelmente foi dos meus maiores desafios. Não sei se foi o meu maior desafio profissional, mas fisicamente foi muito extenuante. Foi sem dúvida o maior evento que eu fiz na minha vida e provavelmente o que vou fazer. Um bilhão de audiências não se faz todos os dias.

Segue-se a peça de teatro “Limbo” que estreia em janeiro. O que mais a cativou no projeto?

O Limbo é um projeto teatral que é encenado por uma pessoa que eu gosto muito que é a Sara Carinhas e que eu acho que é uma das encenadoras resistentes do seu género em Portugal, por isso, já vale a pena. É um projeto que fala sobre humanidade, mas mais do que isso fala sobre a crise dos refugiados que está a acontecer, fala sobre a resistência ao discurso do ódio, fala sobre a gentileza, bondade, sobre sermos humanos no meio desta confusão de futilidades e de violência, agressividade e resistência ao populismo. Este projeto a mim disse-me muito por causa disso. É um projeto internacional em que temos atores de várias nacionalidades e eu espero que seja bonito e que toque no coração das pessoas que o forem ver e que possam sair do espetáculo e espalhar esta mensagem de resistência.

Podes explicar-nos um pouco do que vai ser o seu papel?

É um bocado complicado dizer um papel, porque isto não é uma peça em que tenho o texto e faço um personagem. É um processo de cocriação, nós vamos improvisando sobre temas e a partir do que nós fazemos é criado um espetáculo, portanto, eu não tenho um personagem. O que vai acontecer ali é que muito do que se vai ver no espetáculo foram coisas que eu criei em improvisações. Para mim, o teatro é o mais importante para eu me manter na terra e para trazer as preocupações reais para o mundo do entretenimento. Para mim, é como uma vacina.

Prefere teatro a novelas?

Não. Não prefiro nem uma coisa nem outra. Gosto de fazer as duas coisas. Acho que as duas são igualmente difíceis de fazer, mas às vezes apetece-me mais fazer uma ou outra. Neste momento, para mim, fazer uma novela não, porque me apetece pôr a mão na massa. Mas gosto muito de fazer novelas e é muito difícil fazer novelas em Portugal bem, por isso é que há tantas más. Não são as novelas, são os atores.

Artigo editado por Filipa Silva