O gabinete de Adelaide Teles é um dos vários ao dispor dos alunos da Universidade do Porto. Está no 2º piso do edifício dos Serviços de Ação Social da instituição, mas ao contrário dos restantes – com paredes brancas, pouca decoração e aspeto impessoal -, o seu gabinete está recheado de plantas que crescem perto da janela. São para purificar o ar e levantar o ânimo, justifica a psicóloga. Já as paredes estão cheias de quadros que os seus pacientes, alunos de Belas Artes, lhe ofereceram ao longo dos anos de serviço.
E é sobre alunos do Ensino Superior que se debruça a nossa conversa. Entre maio e julho de 2018, cerca de mil estudantes universitários portugueses responderam ao Inquérito sobre Estigma em Saúde Mental, promovido por uma empresa farmacêutica. Mais de metade (51,5%) disse conhecer colegas ou amigos com diagnóstico de doença mental. Adelaide Telles explica que “qualquer jovem na fase adolescente ou jovem adulto é mais vulnerável. A essa vulnerabilidade, normal dessa época da vida, os jovens universitários veem acrescentadas necessidades, confrontos, conflitos, e mais situações não normativas.”
A entrada no Ensino Superior é um anseio para a maioria dos jovens, mas depois de entrar no sistema, o quadro não é cor de rosa. O Ensino Secundário não prepara os alunos para o que vem a seguir, na opinião da especialista.
Deparados com estas dificuldades, os alunos carecem de “mais competências para as ultrapassar. E, muitas vezes, ou porque não foram apreendidas ou porque o aluno realmente se fragilizou, elas trazem ao de cima fragilidades psicológicas que, se calhar, se o jovem estivesse fora da universidade, num contexto mais normativo e com menos desafios complexos não apareceriam”, afirma Adelaide Telles.
Contudo, a psicóloga reforça a ideia de que não são só os jovens universitários que são afetados. Os jovens fora do Ensino Superior também se encontram vulneráveis e, talvez, em desvantagem, pois “na UP, eles são detetados e podem ser ajudados e regressar à sociedade como adultos responsáveis e saudáveis. O que por vezes, na sociedade civil, não é tão fácil assim.”
Adelaide Oliva Telles refere também a falta de psicólogos, hospitais psiquiátricos e apoios ao nível da saúde mental no Sistema Nacional de Saúde (SNS). “A Saúde Mental é o parente pobre da saúde em Portugal. O SNS não tem, neste momento, resposta para todos os pedidos”, refere. E a alternativa também não é apelativa, dado que as consultas no privado são dispendiosas. “São muito caras porque não podem ser baratas. Na verdade, uma consulta de psicologia dura em média 50 minutos. Nesse tempo, posso fazer três consultas de outra especialidade qualquer.”
Nas universidades de Aveiro e Coimbra, os pedidos de consultas de psicologia têm aumentado de ano para ano. O Porto não é exceção. Também os SASUP têm recebido cada vez mais pedidos de consultas. A psicóloga explica que os casos aumentaram “porque a crise proporciona maior fragilidade mental e nós acabamos de sair de uma crise muito forte. Os períodos de crise criam uma maior vulnerabilidade nas camadas mais frágeis, nomeadamente os jovens, que estão numa fase de transição, com mudanças muito bruscas da sua vida”.
“Também o conhecimento destes meios de apoio e a diminuição do estigma são fatores que levam as pessoas a procurar as consultas”, observa a especialista.
Apesar de considerar que o estigma para com a saúde mental está a diminuir, ressalva que ele ainda existe e está presente na nossa sociedade. Já se percorreu um longo caminho, “ao ponto de agora já existir o Dia Mundial da Saúde Mental, o Dia da Depressão, existem dias de várias patologias a nível mental”, lembra, o que, na sua visão, é muito benéfico.
No entanto, é necessário fazer mais. A psicóloga considera que a televisão e os meios de comunicação em geral têm um papel importante na difusão de informação e na representação correta do paciente, dos técnicos e das doenças mentais em si. “Tudo o que seja de prevenção, de alerta, de interajuda, tudo isso é muito importante” ser divulgado, sustenta.
Adelaide Telles lembra, a propósito, um artigo que resultou de uma outra entrevista ao JPN feita a propósito do Dia da Felicidade, no qual se reúnem nove dicas para se ser mais feliz. A técnica de saúde atribui crédito a artigos como esse, pois ainda hoje, conta, recebe emails sobre o mesmo, o que revela o alcance e a influência dos media nas pessoas: “As pessoas veem, leem e se acharem que faz sentido, tentam saber mais”, afirma.
Outro conselho deixado pela especialista é o de se prestar atenção ao redor: “A cidadania é feita por todos. E devemos estar sempre atentos ao colega do lado e, se necessário, sugerir ir a um psicólogo. Sem pressionar muito. Tentar sempre ajudar“, finaliza a psicóloga.
Artigo editado por Filipa Silva