Sexta-feira, o relógio ainda não marcava as 23 horas, mas a sala 2 da Casa da Música já se compunha. A música que vem das colunas aquecia o ambiente enquanto a plateia, heterogénea e animada, se aproximava do palco. As luzes desligam, a porta fecha, a euforia começa. Os cinco membros Francisco, El Hombre (FeH) sobem ao palco para o primeiro concerto da banda brasileira em território europeu. O Porto foi o palco escolhido para o arranque da digressão. Aos presentes, deixaram logo o aviso: “Neste concerto, recomenda-se dançar”.
Explode a primeira música, “Soltasbruxa”, e toda a gente se começa a mexer quase que automaticamente. Não há movimentos mecânicos, não há ninguém parado: todos dançam com todos. Do palco vem luz, vem música, vem energia. Cada membro da banda traz a cara pintada e um ou outro instrumento menos convencional para acrescentar algo ao concerto. A roupa combina e há padrões vivos e irreverentes tal como a mensagem que passam.
A alegria que vem de um lado é retribuída do outro. “Calor da Rua” e “Bolso Nada” elevam a plateia ainda mais, com mensagens de ativismo e inclusão que tanto marcam o trabalho da banda brasileira. “Ou a gente vai junto para a frente, ou a gente vai junto para trás”, grita Mateo Piracés-Ugarte, vocalista e guitarrista da banda, acompanhado em palco pelo irmão Sebastián Piracés-Ugarte (voz, percussão e violão), Juliana Strassacapa (voz e percussão), Andrei Martinez Kozyreff (guitarra) e Rafael Gomes (baixo, voz de apoio).
Mateo é dos primeiros a contactar com a plateia, chega tão perto que faz o palco desaparecer. Em “Bolso Nada” a banda alonga-se: “ele não nos representa” marca repetidamente os últimos minutos da música que faz uma ativa e forte crítica a Jair Bolsonaro, presidente eleito do Brasil a 28 de outubro.
“Enquanto houver gente a morrer, por qualquer motivo, as coisas vão ter de mudar. Os pedestais do privilégio vão ter de cair. Se for necessário, a gente vai incomodar”, continuam a tocar. Trazem repertório variado e em vários idiomas: português, espanhol, inglês. Vieram do Brasil, mas a sua música é de todo o mundo. Descrevem-se como folk “pachanga” e misturam música brasileira com mexicana e latino-americana, numa explosão de sons e batidas mexidas.
O tempo passa sem se reparar nele e a multidão vai-se envolvendo num abraço que celebra o amor e a inclusão. Não se vê ninguém parado: todos de olhos postos no palco, mas as mãos entrelaçam-se e encontram-se umas às outras. O pedido vai aparecendo por parte dos artistas: em celebração do amor e da luta, estamos todos juntos.
O concerto, que durou cerca de 1h40, aproxima-se do final, mas os níveis de energia não diminuem. Entram músicas novas, mas todos as cantam e dançam de uma ponta à outra. Entre pedidos da banda e movimentos genuínos da plateia, o público aproxima-se ainda mais. “O Tempo É A Sua Casa”, tema que integrará o segundo álbum dos FeH, vem acalmar um pouco a euforia. Numa sonoridade calma mas sempre alegre, a Casa da Música respirou fundo antes de explodir de novo.
Chega a última música. A despedida é longa, sentida, muito próxima de quem está lá para os ver. Entre fotos e apertos de mão que se querem abraços, saem do palco. Mas ninguém desiste, querem-nos por mais uns minutos. Ouve-se mãos a bater ritmicamente no palco, ouvem-se as letras mais conhecidas, cantadas afinada e intensamente. Passam cinco minutos, ninguém para. Abrem-se portas de novo e Francisco, el Hombre regressa ao palco. A energia reestabelece-se para os últimos temas, com direito a mais dança e uma euforia que parece não ter fim.
Acaba assim o primeiro concerto na Europa, o primeiro concerto em Portugal, e a mensagem mantém-se a mesma: ninguém solta a mão de ninguém. A digressão continua por Espanha e, por cá, fica a esperança de uma nova visita muito em breve.
Artigo editado por Filipa Silva