I’m your mirror, a mais recente exposição de Joana Vasconcelos, desloca-se de mãos espanholas para terras portuguesas. O museu Guggenheim de Bilbao passa o testemunho de Vasconcelos para Serralves, que o recebe na segunda-feira, dia 18. A inauguração está marcada para as 22h00. A abertura ao público está agendada para o dia seguinte.

A exposição da artista combina mais de 30 peças – a mais antiga data de 1997 -, cobrindo duas décadas de prática artística e refletindo o seu desenvolvimento como artista.

O processo criativo de Joana Vasconcelos assenta na apropriação e descontextualização de objetos pré-existentes e realidades do quotidiano. O domínio da cor, o estatuto da mulher, a identidade nacional e o contraste tradição/modernidade e cultura popular/erudita fazem parte da sua identidade artística.

Vida e Obra

Joana Vasconcelos nasceu em Paris a 8 de novembro de 1971, filha de portugueses emigrantes e já com sangue artístico na família. A mãe formou-se na Fundação Ricardo Espírito Santo e o pai, Luís Vasconcelos, é fotojornalista e diretor da Estação Imagem,uma associação cultural sem fins lucrativos que tem como elemento de estudo a imagem. Joana Vasconcelos chegou a Portugal com quatro anos.

Estudou Joalharia e Desenho no Centro de Arte e Comunicação Visual em Lisboa, onde vive e trabalha atualmente.

Em 1996, com 24 anos, Joana Vasconcelos estreia-se no Porto, em Serralves, com uma peça – Mais Tempo, Menos História – integrada numa mostra comissariada pelo antigo diretor do museu de arte contemporânea portuense, João Fernandes.

Numa entrevista à revista “Notícias Magazine”, publicada no último fim de semana, a artista confessa que no início da carreira não houve muitas pessoas a terem a perceção de até onde poderia ir. Mas aponta exceções, como Pedro Cabrita Reis, João Pinharanda e Manuel Reis. Foram estes três nomes que Joana Vasconcelos realça como fundamentais na sua viagem artística.

Foi o artista plástico português, Pedro Cabrita Reis, a primeira pessoa a comprar uma obra da artista. Chamava-se de As Flores do Meu Desejo e era constituída por espanadores lilases e ferro, que apenas conseguiu realizar graças aos 46 contos [cerca de 230 euros] que o seu pai lhe emprestou.

As Flores do Meu Desejo

As Flores do Meu Desejo Joana Vasconcelos

Joana Vasconcelos foi pioneira em vários momentos. Em 2000, evidenciou-se no espaço público com o prémio EDP e em 2001 criou a sua obra mais controversa – A Noiva.

A Noiva é uma obra trabalhada com 14 mil tampões OB, aço inoxidável, fio de algodão e cabos de aço. Apesar de emblemática, chegou a ser proibida anos mais tarde, em 2012, numa exposição em Versalhes. Na altura, a artista admitiu não ter ficado surpreendida, uma vez que o tampão continua a ser tabu na sociedade.

Joana Vasconcelos retirou inspiração do país onde cresceu e em 2005 criou com talheres de plástico translúcido, ferro pintado e corrente metálica o Coração Independente Vermelho. Mais tarde, juntou à coleção o Coração Independente Preto e o Coração Independente Dourado.

Ainda no mesmo ano, tornou-se a primeira mulher a expor na 51ª Bienal Internacional de Arte de Veneza. Em 2012, repetiu a proeza e tornou-se a primeira mulher e artista mais jovem de sempre a expor no Palácio de Versalhes em França, mesmo sem A Noiva a integrar a mostra, como acima se referiu.

Na capital francesa, a exposição de Joana Vasconcelos bateu o recorde de visitantes dos últimos 50 anos, com 1,6 milhões de pessoas em apenas três meses. Por fim, em 2018, tornou-se a primeira portuguesa a expor em nome individual no museu espanhol Guggenheim.

Vasconcelos apresentou a sua primeira retrospetiva em 2010, em Lisboa, no Museu Coleção Berardo.

Sejam mais ou menos positivas, as críticas ao trabalho da artista portuguesa mostram que o que faz raramente provoca indiferença. Em 2010, chamou mesmo a atenção de François-Henri Pinault, dono da Gucci, que comprou a peça Contaminação.

Em 2013, Vasconcelos viu as suas obras expostas no museu da Gucci, em Florença. As obras escolhidas foram Coração Independente VermelhoLavoisier e Psycho .

Em 2018, foi convidada no evento promovido pelo grupo hoteleiro madeirense PortoBay, “30 Portugueses, Um País”, onde relatou os dois momentos de maior preocupação na sua carreira. Um deles ocorreu em 2008, quando decorou a Torre de Belém com bóias náuticas, uma vez que encontrou oposição ao projeto por parte de guias turísticos. O segundo foi a transformação artística do antigo cacilheiro Trafaria Praia para representar Portugal na Bienal de Veneza, em 2013. A artista afirmou, na altura, “não ter dinheiro” para avançar com a obra, que só se concretizou após a contribuição voluntária dos portugueses.

A Fundação Joana Vasconcelos nasceu em 2012 e tem como objetivos a “preservação da obra da artista e a promoção e o desenvolvimento da educação artística e cultural.” A instituição atribui bolsas de estudo e participa em ações solidárias, além de acolher pessoas da Associação de Refugiados em Portugal e da Associação de Deficiências Mentais.

Joana Vasconcelos ficou conhecida como “artista tampão” ao desafiar o conformismo da sociedade e o comum da arte. Apesar de ser alvo de fortes críticas, a artista não deixa que isso a impeça de continuar a criar e rejeita rótulos.

Artigo editado por Filipa Silva