É natural de Famalicão, mas considera Braga a sua casa. Depois de terminar o Secundário, Rita Sampaio estudou piano e voz. Agora, com 22 anos, concilia o curso de Estudos Culturais na Universidade do Minho com a carreira na música. Sob o nome artístico de IVY, lançou o seu primeiro projeto a solo, “Over and Out”, editado pela Cosmic Burger, a 13 de março. O som é sombrio e atmosférico. As letras intimistas e pessoais.

A verdade é que não é uma estreante no mundo da música. Rita também integra a banda GrandFather’s House, que já conta com um EP e dois álbuns editados e que esteve presente na edição do ano passado do festival Paredes de Coura.

Algumas das suas influências incluem Perfume Genius e Nick Cave & The Bad Seeds, sendo que que este último tem sido “uma presença forte” e “uma referência que está sempre lá”.
O facto das suas principais influências serem internacionais reflete-se nas letras em inglês. “Desde que comecei a fazer música que comecei a cantar em inglês. Comecei muito no soul e no rock norte-americano e, por isso, o inglês surgiu muito naturalmente”, conta ao JPN. Apesar disto, não descarta a possibilidade de vir a cantar no idioma de Camões. “Não fecho a porta a essa possibilidade. Acho que escrever em português seria uma experiência gira e gosto de me desafiar”.

Mostra-se reticente sobre a caracterização do seu estilo e prefere “pedir às pessoas para ouvirem e tirarem as suas próprias conclusões”. “Acho que tudo foi tão natural neste disco, tanto a nível do conceito como da forma que ganhou, sonora e liricamente, que não sei bem dizer um estilo a que o possa colar, nem gosto de o fazer”, refere. Considera que o rótulo acaba por “condicionar as pessoas” e que “a interpretação de cada um é a melhor forma de responder a isso”.

IVY é o nome artítico de Rita Sampaio.

IVY é o nome artítico de Rita Sampaio. Foto: Adriana Peixoto

O amor pela música despertou com a influência do irmão. Apesar dos pais não estarem ligados à indústria, “foram e são um grande suporte”. “Foi por volta dos 14 anos que comecei a ouvir música das décadas de 60 e 50, os clássicos do rock. A partir daí, comecei a adorar música e a ir a concertos muitas vezes com o meu irmão e outras vezes sozinha, porque não conhecia muita gente que partilhasse o meu gosto musical”, revela.

Confessa que o processo de criação do álbum demorou “muito tempo”. “Comecei a compor as músicas há uns dois anos no piano. Entretanto, falei com o meu amigo João Figueiredo e perguntei-lhe se ele estava interessado em produzir os esboços de músicas que já tinha feito”, conta. Depois de um ano a trabalhar, sentiu que precisava de se “distanciar um bocado das músicas” e da ajuda de alguém com “os ouvidos limpos”. “Depois passei uma semana nos estúdios da CASOTA Collective e aí foi a fase final de gravação do disco”, acrescenta.

Para além do nome do disco, “Over and Out” é também o título da primeira faixa. IVY ressalva que “foi esta música que começou tudo”. “Pensei nesse nome porque é uma expressão muito usada no contexto militar e também porque reflete o momento em que se ultrapassa alguma coisa”, sublinha. Considera as suas músicas “um desabafo” que a fizeram “descolar de um sentimento” e que essa “catarse” está bem refletida na faixa-título.

A escolha do single de lançamento recaiu sobre “I Miss Myself”, que foi considerado como um dos melhores “da colheita dos primeiros 3 meses de 2019” pela BLITZ. “Acho que essa música é muito forte ao nível sonoro e representa bem todo o disco, também por causa da letra e da intenção que eu tinha. Foi uma fase em que estava perdida e essa música resume bem isso. Coisas que julgava que seriam do meu caráter já não estavam lá. É quase um sentimento de redescoberta de mim mesma”, confessa.

IVY participou no processo de composição de todas as canções do álbum e denota que “é sempre um bocado da mesma forma”. “Passei muito tempo em estúdio e sentava-me a brincar no piano e apesar de não ser lá grande virtuosa (ao piano), foi uma muleta indispensável para começar a compor”.

A autora conta que o facto de não ser muito boa no piano também lhe “deu mais espaço para explorar a voz” e “ter uma maior presença, porque queria mesmo que as pessoas ouvissem” o que tem a dizer. “Não sei quem é que quer ouvir os desabafos dos desamores de alguém, mas a verdade é essa”, brinca. “O exercício de escrita tem um poder curativo em mim incrível e muitas vezes tive uma ideia e a partir do momento que tento escrever e passar para o papel, parece que as coisas ficam mais claras para mim”, acrescenta.

As temáticas mais presentes são, nas palavras da própria, “amor e desamor”. O disco “é muito a consequência de uma relação conturbada” que teve, “mas também há um sentimento grande de desilusão que está muito presente” nas letras. “Desilusão no mundo, em mim própria, nas expectativas que às vezes se tem e que não são correspondidas. Este disco é sobre como sair disso; como contornar aquele turbilhão de ideias e sentimentos negativos que parece que se juntam para nos arrastar para baixo”, resume.

Esse sentimento de desilusão está muito presente na sexta faixa do disco: “Infinite Loneliness”. Apesar de não ter uma música favorita, confessa que nutre por esta “um carinho especial” . “Foi muito gira de compor nos últimos dias, tinha um pianinho, um sintetizador e um poema escrito e a canção é o debitar do poema, muito estilo spoken word”.

A canção reflete o sentimento de se “estar rodeado de pessoas”, mas no final ser “tudo vazio de conteúdo e de amizade”. “Acho que hoje em dia vivemos numa época muito complicada ao nível de relações interpessoais, porque é tudo muito descartável. As pessoas deixaram de acreditar umas nas outras e pode ter-se montes de amigos, mas à mínima desavença, vê-se que não significam nada”, acrescenta.

A última canção, 8h17am, é uma das favoritas da cantora. É dueto com Rui Gaspar e foi também a última a ser composta. “O Rui (Gaspar) foi uma das pessoas que me deu muita força neste disco. É uma história engraçada porque um dia fomos ao centro de Leiria beber uns copos e ele disse “Bora para casa, bora para o estúdio fazer um som” e pronto, fizemos um take de quase uma hora os dois sentados ao piano a cantar e resultou nessa música”, conta.

A mensagem que quer passar através da música é curta e direta. “Quero que as pessoas oiçam e que sintam alguma coisa. Gostava que ouvissem verdade naquilo que eu faço, porque é muito verdadeiro e íntimo”.

Relativamente a projetos futuros, deixa um apelo. “Tenho algumas coisas marcadas, mas que ainda não foram divulgadas, mas estejam atentos e sigam-me nas redes sociais”. Para quem queira seguir o conselho da artista, podem acompanhá-la no Facebook ou no Instagram.

Artigo editado por Filipa Silva