Miguel Midões é jornalista na rádio há 15 anos e está prestes a concluir a sua tese de doutoramento na Universidade de Coimbra sobre rádios comunitárias. No ano em que a UNESCO definiu, para o Dia Mundial da Rádio, que se celebra esta quinta-feira (13), a “diversidade” como tema das comemorações, o JPN foi tentar perceber como estes projetos podem contribuir para tornar o espaço mediático mais inclusivo .

O que são rádios comunitárias?

A principal característica de uma rádio comunitária é estar inserida numa comunidade. “São feitas por essas comunidades. A audiência, aqueles que ouvem, são aqueles que fazem, que produzem a rádio”, descreve Miguel Midões.

São rádios mais “democráticas”, uma vez que são bastante acessíveis: qualquer pessoa pode participar na gestão e produção dos conteúdos. “São rádios onde encontramos temáticas e alguns nichos da sociedade, as chamadas minorias da sociedade”, acrescenta o jornalista.

Outra característica a ser evidenciada, é serem rádios sem fins lucrativos. Podem recorrer a financiamentos para manter as instalações e poder comprar material, porém, não podem gerar dinheiro.

No que toca a ajudas de financiamento por parte do Estado, Miguel Midões aponta que em Portugal não existem e que “a realidade no mundo é completamente diferente”, apesar de não ser fácil uma definição universal de “rádio comunitária”: “aquilo que elas são na Austrália, não são no Canadá, não são em França, não são no Brasil”, remata.

Há países como a Austrália e a França, onde o Estado reconhece e apoia estes projetos. Noutros casos, a lei permite a angariação de fundos para estas poderem “sobreviver”, ou ainda países em que a atividade é legalizada, mas não são financiadas pelo Estado, nem pela publicidade. Depois existe aquele que Midões considera como “o pior cenário”: o de Portugal, onde as rádios comunitárias não estão enquadradas pela lei e desta forma não podem receber ajudas estatais, nem angariar publicidade.

Duas dezenas de rádios do género em Portugal

Em Portugal, o jornalista considera que as rádios comunitárias “estão ainda numa fase um pouco embrionária”. Isto deve-se ao facto destas operarem num plano digital, isto é, devido a não serem enquadradas pela lei, as rádios comunitárias não possuem frequência FM.

Miguel Midões identificou um total de 21 projetos de rádios comunitárias no nosso país, todas elas disponíveis no online. O universo é diversificado: existem rádios nas universidades e politécnicos, criadas pelos estudantes das instituições; existem rádios comunitárias que se dedicam a uma religião e também rádios para as crianças, com programações infantis criadas pelas próprias.

Toda esta diversidade deve-se às pessoas que participam nestes projetos e que levam a que exista uma diversidade temática dos programas que pode ir desde conteúdos musicais, maioritariamente, até à prática do “call in phone”, permitindo uma participação direta dos ouvintes no programa.

O jornalista diz também que toda esta diversidade se deve à exploração de diversos conteúdos consoante os autores: “Neste meu estudo, identifiquei mais de 300 programas de rádios nas rádios que estou a analisar. Se considerarmos que cada programa tem um autor, estamos a falar em mais de 300 autores para duas dezenas de rádios, o que é bastante significativo e mostra uma diversidade enorme”.

Rádios mais plurais e diversas

No mundo mediático, estas rádios podem inspirar as rádios tradicionais por serem mais “plurais”. Para o jornalista, essa será a razão pela qual não existe interesse em legalizar as rádios comunitárias.

Miguel Midões acredita que as rádios comunitárias precisam de crescer para, de uma forma mais efetiva, “poder dar voz às minorias, a temas, dar voz a determinados grupos da sociedade que habitualmente não têm voz na comunicação social”.

Em relação ao impacto que podem ter nas rádios generalistas, é algo que, a longo prazo, pode vir a acontecer, acredita o autor. Agora, o mais importante é que seja reconhecido que as rádios comunitárias existem em Portugal e o que é que elas fazem. Só depois disso, o jornalista da TSF considera que será “importante que elas se conheçam e criem uma rede de rádios comunitárias”.

Midões acredita que só assim estes meios vão conseguir exercer uma pressão política para que a lei seja revista e as rádios comunitárias possam ser enquadradas.

Uma vez concluído este processo de reconhecimento e aceitação, estas rádios comunitárias podem vir a ter um impacto nos media que, perdendo os nichos de públicos, podem vir a demonstrar uma vontade de alterar a programação de forma a “ir ao encontro desses nichos das rádios comunitárias”.

Artigo editado por Filipa Silva