Após a suspensão de todas as atividades letivas presenciais da Universidade do Porto anunciada há uma semana, as 14 faculdades da UP acordaram para a necessidade inadiável do ensino à distância.

Alteraram-se as rotinas de trabalho: e-mail, moodle e videoconferência passaram a ser ferramentas essenciais. Se alguns alunos já retomaram as aulas, outros há que ainda aguardam orientações dos docentes – também eles em adaptação.

O pró-reitor da UP responsável pela Unidade de Inovação Pedagógica e Tecnologias Educativas reconhece que o serviço está “a funcionar acima da sua capacidade, para responder a todos os pedidos de ajuda”.

Já os estudantes das 14 faculdades ouvidos pelo JPN identificam um cenário muito diverso entre e dentro de cada faculdade. Para os que têm cursos mais práticos, as dificuldades são acrescidas. Em Belas Artes, por exemplo, já há quem discorde do pagamento de propinas.

A Universidade do Porto é a segunda maior instituição de ensino superior do país com mais de 400 cursos na oferta formativa e cerca de 30 mil estudantes inscritos.

14 faculdades, várias realidades

Nas faculdades de Arquitetura (FAUP), Ciências da Nutrição e Alimentação (FCNAUP), Farmácia (FFUP), Medicina (FMUP) e Medicina Dentária (FMDUP) da Universidade do Porto, já há aulas retomadas por videoconferência, através de plataformas como a “Zoom” ou a “Panopto”.

No Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) – cujo complexo, partilhado com a FFUP, foi o primeiro a ser encerrado pela Reitoria -, para além das aulas, planeia-se a apresentação de trabalhos de grupo, por videoconferência. Na Faculdade de Letras (FLUP), os alunos vão sendo contactados pelos docentes, que aplicam estratégias de ensino diversas. 

Já noutras unidades orgânicas, esta semana é de preparação. Nas faculdades de Economia (FEP) e Engenharia (FEUP) da Universidade do Porto, as aulas foram suspensas entre os dias 16 e 20 de março.

Um jovem morreu esta madrugada junto à Faculdade de Engenharia do Porto

A FEUP é a maior faculdade da UP Foto: FEUP

Na Faculdade de Direito da Universidade do Porto (FDUP), a retoma das atividades letivas, de forma telemática, está agendada para esta quinta-feira (19), segundo um e-mail enviado pela Direção da FDUP aos estudantes. Os alunos aguardam novas indicações por parte das equipas de docentes, que preparam conteúdos e materiais, para que a aprendizagem possa ser continuada à distância. 

Que ferramentas?

A migração do ensino para o meio digital exige o domínio de ferramentas que, apesar de não serem novas, não eram muito utilizadas pelos docentes. João Veloso, pró-reitor da UP, explica que não existe um único modelo ou ferramenta de ensino à distância. “O primeiro conselho que está a ser dado aos docentes é que usem as ferramentas com as quais se sintam mais confortáveis e com as quais julguem que é mais fácil chegar aos seus estudantes”, avança o professor.

Madalena Frias, estudante da FMUP, explica que a situação não é idêntica em todas as unidades curriculares (UC). Após a disponibilização de uma página informativa no Sistema de Informação para a Gestão Agregada dos Recursos e dos Registos Académicos (SIGARRA), alguns docentes iniciaram a comunicação com os discentes, para programar as primeiras aulas por videoconferência, ou o recurso a outras estratégias.

“Até agora, usamos o WebEx, onde estamos todos numa videoconferência, sem imagem e sem som – só ligamos para fazer perguntas -, e temos um chat aberto, em conjunto”, explica a aluna do segundo ano de Medicina. “Só a professora tem o som ligado e, através da partilha de ecrã, vai mostrando os slide do PowerPoint e apontando com o rato”, acrescenta.

Outra estratégia é a disponibilização de apresentações PowerPoint, cujos diapositivos incluem explicações dos docentes, em formato de áudio. Apesar de não haver interação entre alunos e professores, trata-se de uma alternativa mais flexível: “podes descarregar e ver em qualquer altura”, explica a estudante da FMUP.

“A maior parte já foi arranjando soluções. Em caso de dúvidas, enviamos um e-mail, e os professores tentam explicar por escrito, ou com recurso a um mini-vídeo”, acrescenta.

Incertezas que se levantam

Gil Monteverde, estudante da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP), chama à atenção para uma “revolta crescente” entre os alunos daquela instituição. “Estas aulas requerem um grande acompanhamento do professor e tornam-se, agora, propostas e entregas sem mediação”, esclarece. O aluno do quarto ano de Artes Plásticas questiona a manutenção do pagamento das propinas, uma vez que os estudantes não estão a “usufruir de um serviço completo”

Pedro Ferreira, estudante da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP), acredita que a continuação das atividades letivas de componente teórica “pode e deve ser assegurada”. Por oposição, “a parte prática é quase impossível ser ensinada e aperfeiçoada à distância; é necessário o acompanhamento in loco do professor”, lembra o estudante. “Se esta pausa durar para lá de maio, a meu ver, as cadeiras práticas deveriam ser repetidas no próximo ano”, acrescenta. Na FADEUP, os estudantes ainda esperam informações sobre a retoma das aulas. 

Faculdade de Direito retoma atividade letiva esta quinta-feira. Foto: Hugo Moreira

No que respeita às avaliações, a maior parte dos alunos continua a aguardar orientações por parte das várias unidades orgânicas. Na FFUP, por exemplo, as avaliações intercalares foram suspensas, assim como aulas e avaliações laboratoriais. Outras situações particulares, como estágios curriculares e projetos de investigação que beneficiam de bolsas, também estão a ser equacionadas.

“Estamos a fazer tudo para que a qualidade do processo seja a mesma do ensino presencial”

João Veloso, Pró-Reitor da UP

João Veloso, que tutela as Tecnologias Educativas da UP, relembra que a universidade está pensada para o ensino presencial e que a “migração massiva para o ensino online” não acontece “de uma semana para a outra”. Ainda assim, os esforços são nesse sentido, com o Núcleo de Tecnologias Educativas da UP a “trabalhar acima da sua capacidade, para responder a todos os pedidos de ajuda que têm chegado dos docentes”, adianta.

Durante a última semana, houve o registo de cerca de 140 disciplinas na platafoma Moodle U.Porto e mais de 400 inscrições, por parte de docentes, em ações de formação em tecnologias educativas. “Estamos a fazer tudo para que a qualidade do processo seja a mesma do ensino presencial”, garante o pró-reitor da UP.

O professor sublinha que “há muitos anos que a Reitoria oferece entre duas a três sessões semanais, em tecnologias educativas” – uma iniciativa que nunca contou com a adesão agora verificada. Durante todo o ano de 2019, houve 250 docentes inscritos. “Numa semana, conseguimos quase duplicar o número de participações”, conclui.

Associações de Estudantes chegam-se à frente

Em fase de adaptação, algumas associações de estudantes procuram ter um papel interventivo. Na FCUP, o grupo mobilizou-se e enviou um inquérito online a todos os estudantes, para averiguar o acesso a um computador pessoal, com ligação à Internet. Outras iniciativas semelhantes foram levadas a cabo pelas associações de estudantes das faculdades de Psicologia e Ciências da Educação (FPCEUP) e Farmácia (FFUP) da Universidade do Porto. 

Na Faculdade de Belas Artes (FBAUP), a associação de estudantes está a desenvolver “estratégias para manter o espírito de comunidade”, como “concursos que possam ser concretizados a partir de casa e webworkshops, conta Gil Monteverde, um dos membros. 

Jardins da FBAUP. Foto: Paulo Sá Ferreira

João Veloso sublinha que a continuação da aprendizagem, agora à distância, vai além da função pedagógica e académica; é essencial para “quebrar o isolamento” sentido por alunos e docentes.  “O mais importante é não perder o contacto com os estudantes”, relembra.

Com a migração do ensino para o digital, e crescente utilização de plataformas de videoconferência, a Unidade de Computação Científica Nacional, inserida na Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCCN-FCT), já reforçou os serviços de teletrabalho e aulas à distância. A plataforma Colibri foi um dos serviços reforçados e permite sessões de videoconferência com 300 participantes, em simultâneo.

A situação epidemiológica de Covid-19 em Portugal levou a UP a suspender as atividades letivas e não letivas presenciais. A medida, anunciada na quarta-feira passada (11), entrou em vigor na quinta-feira (12). O funcionamento de bibliotecas e salas de estudo também foi suspenso, assim como atividades desportivas e culturais. As redes de residências e cantinas universitárias dos Serviços de Ação Social da Universidade do Porto (SASUP) mantêm-se ativa, apesar das medidas de contenção adotadas.

Artigo editado por Filipa Silva