A COVID-19 está a ter diversos impactos na sociedade. Dos hospitais às escolas; das indústrias ao turismo, no meio da pandemia, nem a imprensa regional escapa. O histórico “Correio da Feira”, semanário com 122 anos, publicado às segundas-feiras em Santa Maria da Feira, distrito de Aveiro, cancelou a versão impressa e prepara-se agora para colocar os trabalhadores em ‘lay-off’ parcial.

Uma “quebra abrupta” nos rendimentos do jornal – que é, no mínimo, de 80% – obrigou à tomada destas medidas, conta ao JPN o diretor do “Correio da Feira”, Nélson Costa. O jornalista diz mesmo que continuar com a edição em papel passou a ser uma ideia “absolutamente incomportável”.

Todavia, o fim do papel tem implicações que afetam o próprio acesso à informação das populações. Os assinantes são, na sua maioria, pessoas mais velhas, logo, sem acesso a grandes tecnologias. Por isso, não têm “a mesma capacidade, nem o mesmo entendimento, nem a mesma possibilidade de aceder aos meios digitais”, salienta Nélson Costa (uma ideia também defendida pelo Sindicato dos Jornalistas).

A ausência da versão impressa do semanário está a ser colmatada com a publicação de uma edição digital, na mesma à segunda-feira. Essa edição encontra-se, por enquanto, disponível de forma gratuita para todos os leitores – até ao momento em que não for mais possível “protelar a situação” e a única alternativa passar por restringir a versão digital apenas aos assinantes, admite Nélson Costa.

Como adaptação face aos tempos “catastróficos” que o “Correio da Feira” tem enfrentado, surge também um aumento da presença no site e nas redes sociais, explica o diretor do jornal ao JPN. O semanário tenta agora angariar “novas publicidades exclusivamente para meios online para se “manter à tona”, depois de ter largado o papel.

Mas não é só na queda das receitas publicitárias que reside o problema. A recolha dos valores das assinaturas está suspensa, dada a impossibilidade de realizar deslocações a casa dos leitores assinantes para esse efeito.

Já o ‘lay-off’ foi decidido na passada sexta-feira (03) e será posto em prática numa “questão de dias”. O regime estende-se a todos os jornalistas, à exceção de um que se encontra em estágio profissional. Para o diretor do “Correio da Feira”, também esta decisão não será “viável por muito tempo” caso continuem a faltar apoios substanciais para a comunicação social.

O ‘lay-off’ é uma das medidas no pacote aprovado pelo Governo para combater a crise provocada pela pandemia de COVID-19. Neste caso, chama-se ‘lay-off’ simplificado, tratando-se de um regime que segue as regras do ‘lay-off’ previsto no Código do Trabalho, consistindo num apoio financeiro por trabalhador, atribuído às empresas pela Segurança Social.

Esta terça-feira, segundo as contas do Governo, mais de 33 mil empresas já tinham pedido o ‘lay-off’ simplificado, o que equivale a um universo de mais de 550 mil trabalhadores.

Entre esses empregados estão alguns do desportivo “A Bola”, que vai enviar meia centena de trabalhadores para casa, incluindo jornalistas. Também o “Jornal Económico” reduziu horários e colocou alguns trabalhadores em ‘lay-off’.

No passado sábado (04), a ministra da Cultura, Graça Fonseca, prometeu o anúncio de um pacote de medidas para o setor, ainda esta semana.

“Estamos num momento absolutamente excecional”, diz Nélson Costa ao JPN. Embora não sendo a favor da subsistência dos jornais através do Estado, o diretor do semanário reconhece que as circunstâncias atuais exigem outra resposta. “Parece que toda a gente tem apoios menos a comunicação social”, lamenta. “Não temos todos um grande grupo por trás que nos possa garantir a manutenção dos postos de trabalho, e o jornal em si, nesta fase.”

Questionado sobre o pior cenário, Nélson admite que será “o fecho total de um jornal com 122 anos”.

“Não queria ser alarmista nem pessimista, pelo contrário. Faço tudo por tudo para manter a minha equipa motivada, manter-me a mim também motivado, e tentar fazer um jornalismo sério mesmo nestas condições. Mas não vejo um caminho diferente deste se a situação se prolongar por muito mais tempo”.

Artigo editado por Filipa Silva.