A imunologista Maria de Sousa morreu na madrugada desta terça-feira, aos 81 anos, nos cuidados intensivos do Hospital São José, em Lisboa. Reconhecida mundialmente, foi mais uma vítima da doença COVID-19, após uma semana de internamento. A antiga professora no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto foi a responsável por perceber a migração organizada dos linfócitos, células de defesa do sistema imunitário.

“Maria de Sousa será para sempre uma das mais destacadas figuras da Ciência em Portugal, tendo o seu trabalho recebido reconhecimento internacional numa altura em que ser cientista, particularmente uma mulher cientista, não era tarefa fácil.”, diz António de Sousa Pereira, Reitor da Universidade do Porto, em comunicado enviado à imprensa.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, também lamentou o desaparecimento da imunologista, numa nota que evoca a importância da vida de Maria de Sousa. “Era uma mulher inconformada e persistente, procurando sempre transmitir um sentido de exigência a todos. Era também alguém que tinha uma visão ampla do mundo, que não se confinava à academia, mas que abraçava com entusiasmo a relação entre conhecimento e sociedade, ciência e arte. Deixa um legado incontornável na ciência e um exemplo maior de rigor, de exigência e de compromisso cívico e cultural. Gostaria de enaltecer e agradecer em nome de Portugal”, conforme se lê na nota de pesar.

Foi em 1964 que Maria de Sousa começou o percurso para chegar ao destaque internacional. Após completar a lincenciatura em 1963, na Faculdade de Medicina de Lisboa, conseguiu uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian e foi para os Laboratórios de Biologia Experimental em Londres. Na época, era consenso de que todos os tipos de linfócitos eram produzidos num mesmo local, o timo, glândula localizada no centro do peito.

Em experiências com ratos, com timo removido à nascença, a investigadora notou que continuavam a possuir linfócitos nos órgãos linfáticos periféricos. Além disso, percebeu que existiam áreas vazias, destinadas ao tipo de linfócito produzido no timo (linfócitos T). Mais tarde, estas regiões receberiam o nome de Área T e as descobertas da imunologista portuguesa acabariam por se espalhar pelo mundo, garantindo o seu reconhecimento internacional.

O seu primeiro estudo sobre o assunto foi publicado em 1966 na revista “Journal of Experimental Medicine” e na revista “Nature”. No ano seguinte, saiu de Londres rumo à Escócia. Doutorou-se em Imunologia em 1972 e foi depois para os Estados Unidos da América, onde passou por diversos centros de pesquisa e estudo, como são exemplo o Instituto Sloan Kettering para a Investigação do Cancro, a Faculdade de Medicina de Cornell e a Faculdade de Medicina de Harvard.

Em 1984 regressou a Portugal, com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento da investigação científica do país. Logo começou a trabalhar como professora e investigadora no ICBAS. “Foi uma honra para a Universidade do Porto ter acolhido o seu regresso a Portugal em 1984, onde desenvolveu brilhantemente o seu trabalho como docente e investigadora, tendo sido homenageada com as mais altas distinções e prémios nacionais e internacionais”, ressalva António de Sousa Pereira na mesma nota de imprensa.

Ao longo dos anos foi reconhecida com diversos prémios. Em 1995 ganhou o Grande Prémio Bial de Medicina. Em 2004, recebia o Prémio Estímulo à Excelência. Em 2009, era a vez de ser galardoada com a Medalha de Ouro de Mérito Científico.

Maria de Sousa foi igualmente condecorada por vários presidentes da República: em 1995, por Mário Soares, recebeu o grau de grande-oficial da Ordem Infante D. Henrique; em 2012, três anos depois de se aposentar como docente do ICBAS, recebeu, de Aníbal Cavaco Silva, o grau de grande-oficial da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada; e, em 2016, recebeu a a grã-cruz da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada, por Marcelo Rebelo de Sousa.

A imunologista portuguesa é também citada em todos os livros sobre imunologia. “Maria de Sousa será para sempre lembrada como um dos nomes maiores da Universidade do Porto e da Ciência Portuguesa”, remata António de Sousa Pereira.

Artigo editado por Filipa Silva.