“O número de denúncias [de violência doméstica] diminuiu e o número de novos pedidos” também, assegura, ao JPN, Daniel Cotrim, psicólogo da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV). O psicólogo confirma que em março, houve menos 15% de “atendimentos novos relativos a violência doméstica, comparando com fevereiro” deste ano. O que “não quer dizer que esteja tudo bem”, pois, diz, vive-se numa “tranquilidade aparente”.
O psicólogo da APAV aponta alguns motivos para as denúncias terem diminuído, tais como a “ansiedade e medo que a pandemia gerou” e o facto de terem sido “tomadas medidas completamente inéditas na nossa democracia” que levaram a situações de “lay-off e desemprego”.
A associação aposta em “apelar à consciência cívica dos vizinhos, das comunidades” nestes tempos. “Se até dia 01 de março contávamos até dez para saber se devíamos chamar a polícia, agora não temos sequer que contar”, afirma Daniel Cotrim.
Para quem estiver em situações de risco, o psicólogo aconselha a “aproveitar quando têm de sair, ir às compras, ir à farmácia” para “combinar com os vizinhos sinais” e “não adotar comportamentos que sejam confrontativos”.
A população tem contactado a APAV para perceber como vão continuar a trabalhar nesta altura atípica. Sem a possibilidade de apoio presencial, a associação vai continuar a fazer o “follow-up de situações de violência doméstica que já estavam a ser acompanhadas” à distância, segundo Daniel Cotrim.
Com o financiamento concedido pela secretária de Estado da Cidadania e Igualdade, foram inaugurados, na segunda-feira (07), dois centros de acolhimento temporário de emergência em Portugal, um para o Norte e outro para o Centro/Sul do país. A APAV é a responsável pela gestão do centro na área metropolitana de Lisboa.
No total, os centros têm capacidade para cerca de 100 pessoas, e visam acolher “mulheres, acompanhadas ou não por crianças ou jovens até aos 18 anos”, como explica Daniel Cotrim. “A partir do momento em que os centros começaram a funcionar começaram a ter alguma procura”, mas “não é uma procura imediata”, sublinha o psicólogo.
A parceria com o Ministério da Saúde permite agilizar a realização de testes à COVID-19, estando também disponíveis quartos de espera e confinamento, se necessário.
Com o objetivo de complementar os serviços telefónicos disponíveis para auxiliar vítimas de violência doméstica, a Fundação Vodafone Portugal em conjunto com o Governo, criou uma linha de apoio SMS. Disponível desde 27 de março, a ideia surgiu depois da criação de um e-mail de emergência ([email protected]). Segundo o comunicado do gabinete da secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, “o confinamento de mulheres e crianças no espaço doméstico junto com agressores” pode “limitar a sua capacidade de pedir ajuda”.
A linha 3060 “permite o envio de mensagens de texto rápidas (SMS) pelas vítimas que queiram pedir ajuda”, de forma gratuita e confidencial, segundo a mesma fonte. A equipa especializada da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), em conjunto com toda a Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica, vai responder aos pedidos de ajuda.
Relativamente à alegada campanha Máscara-19, a APAV já foi contactada por diversos farmacêuticos a pedir informações ou a esclarecer dúvidas.
“Máscara-19”
A “Máscara-19” não está em funcionamento em Portugal, nem disponível em nenhuma farmácia. Um cartaz divulgado pela Assembleia Feminista de Lisboa (AFL) circulou pelas redes sociais e resultou em centenas de partilhas.
A imagem divulgava a “máscara-19” que serviria para as vítimas de violência doméstica pedirem ajuda nesta altura de isolamento social. O cartaz explicava que as vítimas apenas tinham de se dirigir a uma farmácia e pedir uma “máscara-19” e o farmacêutico saberia como agir de seguida.
A campanha começou a ser divulgada como uma forma de criar uma palavra-chave que as vítimas pudessem utilizar, algo que já era feito noutros países.
Apesar de esta campanha nunca ter estado ativa, a AFL admitiu o erro e as falhas de comunicação e apagou a imagem das redes sociais (Facebook, Instagram e Twitter) e lançou um comunicado sobre a “mascara-19”.
No cartaz, o Hospital São João também está representado. Segundo avançou o jornal Expresso, o Hospital São João mostrou-se disponível para colaborar com a iniciativa mas, posteriormente, não chegou a receber qualquer indicação sobre os procedimentos a adotar.
“A ‘mascarilla-19’ foi iniciada pelo Instituto Canário de Igualdade do Governo das Canárias, e tendo em conta o sucesso, pareceu-nos urgente transpô-la para o contexto português”, explicou a AFL ao Expresso.
A Associação Feminista de Lisboa contactou várias entidades nomeadamente, a Associação Nacional de Farmácias, os serviços farmacêuticos nacionais, a Comissão para a Cidadania e Igualdade do Género e a Ordem dos Farmacêuticos. No entanto, não houve qualquer vínculo ou apoios institucionais e, segundo o que a Ordem dos Farmacêuticos explicou ao Expresso, “qualquer divulgação que tenha ocorrido desta campanha terá sido a título individual, por serviços farmacêuticos, farmácias ou pelas próprias associações”.
O problema agravou-se quando um perfil privado lançou a campanha, tornando-a pública. Posteriormente, a AFL tomou a decisão de avançar com o cartaz e com a campanha, mesmo sem esta estar implementada na Farmácia do Centro Hospitalar de São João, única farmácia de que havia referência.
A campanha foi retirada pela Associação Feminista de Lisboa depois de entidade contactar o Hospital de São João e de ter sido informada que o “centro hospitalar está sob tutela governamental e que os serviços farmacêuticos teriam de suspender a campanha”, como consta na notícia referida.
Artigo editado por Filipa Silva.