A COVID-19 chegou ao QualitaVida, em Vila Nova de Gaia, no início de outubro, infetando os seis utentes que ali moram. De então para cá, quem ali vive e trabalha está a aprender a conviver diariamente com o vírus.
Cinco semanas depois de ter soado o alarme em Coimbrões, ainda havia cinco idosos a testar positivo ao novo coronavírus no QualitaVida. Na unidade residencial para idosos de Vila Nova de Gaia, que o Linha Contínua/JPN visitou a 15 de novembro, os utentes são testados todas as semanas. Até à data da visita, só um dos cinco positivos tinha ultrapassado o quadro clínico desfavorável.
Este é um caso em que o surto teve consequências leves. Os idosos continuam assintomáticos, não havendo registo de internamentos ou de agravamento da situação de saúde, estando todos a receber cuidados médicos e de enfermagem.
Isso permite que os idosos positivos continuem na insitituição, num piso separado daquele em que se encontra o único idoso recuperado até ao momento.
Carga viral dos utentes é “quase não transmissível”
O surto do novo coronavírus aconteceu precisamente no momento em que o QualitaVida estava a mudar de gerência. Daniela Silva, a atual responsável, soube que havia idosos infetados na instituição pela comunicação social, e não esconde que pensou duas vezes antes de tomar a decisão final de avançar para o lugar.
Semanas depois, está satisfeita com a decisão tomada. A situação no lar ainda não está resolvida, mas está estabilizada. As autoridades locais (município, centro de saúde e segurança social) têm dado apoio para a implementação de medidas capazes de manter o surto sob controlo.
“[Há zonas do edifício em que] os funcionários têm que estar todos equipados, com proteções nos pés, aventais, batas, máscaras FF-P2, que são as mais indicadas para o efeito, toucas, luvas. Temos que tomar todos os cuidados para eles e para nós, também”, explica Daniela Silva.
A direção da instituição assegura ter recebido a informação da delegação de saúde de Gaia de que “a carga viral dos utentes positivos é muito baixa, quase não transmissível”. Apesar de tudo, o poder de contágio existe sempre, apesar de não ser forte.
Há, portanto, um risco associado à convivência com estas pessoas. Daniela Silva admite que chegou a recear que não iria conseguir reunir uma equipa de funcionários dispostos a assumir os riscos.
Paula, uma das quatro assistentes do lar, diz encarar com normalidade esse contacto com os idosos positivos: “Não tenho medo”, afirma.
A proteção de que dispõem é, no seu entender, suficiente. Não se pode ter medo da aproximação, do toque, caso contrário o idoso, já por si debilitado, devido à doença e ao isolamento compulsivo a que está sujeito, fica ainda mais ansioso, potenciando-se o agravamento do seu estado de saúde física e mental. “É preciso passar-lhes segurança, confiança, porque eles não estão com as famílias”, sublinha.
COVID-19 é só um entre vários problemas
Daniela Silva, a responsável da instituição, garante que nenhum doente com COVID-19 vai ficar sem assistência ou ter os cuidados necessários. Esta é a segunda linha da frente, assegura. “E estamos quase na primeira”, completa.
As outras doenças não-COVID não devem ser descuradas, assegura a gestora desta unidade residencial para séniores: “há doenças que também são graves e muita gente se esquece disso”, acrescenta a diretora.
Olhar só para a COVID-19 não é opção para quem trabalha nos lares, porque “uma gripe, uma diabetes mais alta, tudo isso pode ser um problema de saúde para uma pessoa que está muito debilitada”.
A COVID -19 é mais um problema entre muitos outros com os quais os lares têm que conviver diariamente, mas está longe de ser o único. Assim, o desafio continua a ser o mesmo: garantir ao idoso o máximo de autonomia, apesar de todas as dificuldades que este possa sentir devido à idade avançada. “Tentar que ele seja feliz e viva com conforto e dignidade até ao fim. Esse é que é o maior desafio”, resume Daniela Silva.
Isolamento gera problemas de saúde
Nesta fase, a paciência é a virtude mais preciosa, mas também a mais difícil de conservar pelos idosos. Eles fazem “a vida normal” e “o facto de estarem infetados não os afeta”, assegura Daniela Silva, “mas não se sentem bem”.
Têm saudades de ir a casa e receber as visitas da família. “Por eles, já tinham ido embora”, reforça a responsável do QualitaVida. Toda esta situação potencia o aparecimento de problemas de saúde mental que a instituição se esforça por prevenir e amenizar.
O vírus, contudo, veio para já para ficar, e são muitas as dúvidas de que a vacina possa ser a solução milagrosa que se tem apregoado: “com os problemas de saúde que eles já têm, não sei até que ponto é que poderão tomar”. Se assim for, muitos idosos continuarão vulneráveis aos efeitos mortíferos desta pandemia.
A situação nos lares de idosos em Portugal, onde até ao início de novembro se registava mais de um terço do total das mortes por COVID-19 em Portugal, tem gerado muita preocupação. Casos como os ocorridos em Reguengos de Monsaraz ou no Lar do Comércio, em Matosinhos, foram particularmente visados, com as ordens dos Médicos e dos Advogados a envolverem-se no apuramento de factos e responsabilidades.
Artigo editado por Filipa Silva
Este trabalho foi originalmente realizado para o jornal Línha Contínua no âmbito da disciplina de AIJ/Online e Imprensa – 3.º ano