Porque “é muito difícil pousar em Marte”, António Maia, astrónomo do Planetário de Espinho, vai, a partir das 18h00 desta quinta-feira (18), tentar explicar ao público os “7 minutos de terror” que aguardam a chegada da cápsula da NASA ao planeta vermelho, numa referência à fase mais crítica da entrada, descida e pouso do robô norte-americano à superfície marciana. A chegada está prevista para as 20h55 (hora de Portugal continental).

Será a terceira e última sessão gratuita do Planetário na rede social Facebook conduzida pelo astrónomo, com o intuito de dar a conhecer os desafios da chegada a marte da missão da NASA, que conta com a colaboração da ESA, a Agência Espacial Europeia. As sessões anteriores, “Imaginação” e “Ciência”, dedicaram-se aos mistérios de Marte e sua à influência na cultura pop, passando pela cartografia e história do planeta vermelho e ainda as missões levadas a cabo pelo ser humano bem como os desafios inerentes à exploração espacial.

Planetário de Espinho / Facebook

Em declarações ao JPN, António Maia explicou que a sessão desta quinta-feira tem duas partes: uma simulação que retrata as várias etapas e procedimentos de aproximação à superfície marciana, conduzida pelo cientista em tempo real, seguida da explicação sobre as condicionantes e dificuldades de pousar objetos em Marte.

O cientista tenciona abordar as melhorias em falta nos sistemas, melhorias que permitam pousar objetos com maior massa em missões futuras “já piscando o olho a missões tripuladas”, atualmente limitadas a uma carga de uma tonelada, para as quais “temos de escolher bem o sítio, não é em todo lado”, explica. Para missões tripuladas e “missões robóticas mais evoluídas”, António Maia prevê que a carga varie entre as 20 e as 40 toneladas.

No caso da missão da missão Perseverança, o local escolhido é a Cratera de Jezero, que pode atingir temperaturas de 130 graus Fahrenheit negativos (90 graus Celsius negativos), durante o período noturno. Este ponto do planeta vermelho pode ter sido “um antigo leito, um rio que depositava sedimentos e há uma coisa que os cientistas fazem: procurar água, onde há água pode ter havido condições para ter existido vida”, relembra o cientista formado na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. “É um sítio espetacular para recolher amostras”, acrescenta.

NASA envia mini-helicóptero para Marte

A cápsula transporta o rover Perseverança e um pequeno helicóptero que a NASA enviou para Marte com uma missão especial: ajudar a provar que é possível fazer um veículo voar noutro planeta. O astrónomo dá conta da dificuldade desta experiência do aparelho de 1,8 quilos composto por quatro pés, um corpo e duas hélices sobrepostas, medindo apenas 1,2 metros de uma ponta à outra.

“É muito difícil voar em Marte porque a atmosfera é muito menos densa do que a atmosfera da Terra, portanto é um protótipo que pode servir para analisar depois outros futuros equipamentos que podem ser incluídos noutras missões. É uma prova de conceito. Não tem muita autonomia, mas vai recarregando a bateria e tem de fazer voos curtos, mas pode dar uma perspetiva mais geral da geologia à volta, pode tirar fotografias e ajudar os controladores de missão a orientar o rover”, explica o cientista do Planetário de Espinho.

O helicóptero Ingenuity precisa de ser leve, com pás muito maiores e que giram muito mais rápido do que o que seria necessário para um helicóptero com a mesma massa na Terra. As hélices giram a uma velocidade de 2.400 rotações por minuto, cerca de cinco vezes mais rápido do que o normal. António Maia traduz o nome como ‘Engenhosidade’, mesclando a palavra engenho com ingenuidade, “não levando para o campo da inocência, mas para o campo da criatividade, inventividade. Algo que use a criatividade para superar um obstáculo em termos de engenho, capacidade de pensar”, analisa.

Outro equipamento que chega esta quinta-feira a Marte é uma “árvore eletrónica” como diz o especialista ao referir à “mini-fábrica“ MOXIE, que cria oxigénio a partir do dióxido de carbono presente na atmosfera, num processo semelhante à fotossíntese. “Se nós conseguirmos escalar essa tecnologia para um tamanho maior, pode servir para maior produção de oxigénio e ser usado para reabastecer as naves que estejam na superfície ou outros rovers movidos a oxigénio. Isso é muito importante, porque nós, para transportarmos coisas daqui da Terra até Marte, precisamos de muita energia. Se tivermos coisas produzidas em Marte facilita imenso”, explica António Maia.

A partir das 19h15 desta quinta-feira é possível seguir a aproximação e pouso da missão Perseverance nos canais oficiais da agência espacial americana.

Marte: destino cada vez mais internacional

Esta é a terceira “visita” ao planeta vermelho na mesma semana, depois da missão chinesa, Tianwen-1, cujo equipamento entrou em órbita, assim como o aparelho da missão Hope, desenvolvida por um grupo de trabalho jovem nos Emirados Árabes Unidos.

A entrada dos Emirados Árabes Unidos na corrida espacial marca o 50.º aniversário da nação. Para António Maia, “é obra” um país conseguir, na sua primeira tentativa, colocar uma sonda num planeta distante. Entre várias questões sobre a atmosfera de Marte e as interações das suas camadas, a sonda vai estudar a perda de hidrogénio e oxigénio para o espaço ao longo do ano marciano. “Serve como incentivo à evolução do país que tem um plano a longo prazo de incentivo à tecnologia e o progresso”, realça o astrónomo.

Já o equipamento chinês permanece em órbita até maio, seguindo-se a descida final como explica o cientista do Planetário de Espinho: “à primeira tentativa, a China já orbitou com sucesso, vai agora fazer algumas análises numa órbita intermédia e ainda vão tentar pousar a sua cápsula que também leva um rover”. A China pode ser a segunda nação a alcançar a superfície marciana com sucesso com a Tianwen-1 equipada com instrumentos científicos para analisar o clima ou o ambiente magnético​. O astrónomo conclui: “É uma missão de loucos”.

Artigo editado por Filipa Silva