A 17 de fevereiro, em audição parlamentar na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, anunciou que a possibilidade de a polícia usar bodycams (pequenas câmaras de vídeo) nos uniformes vai estar prevista na nova proposta de lei sobre a videovigilância, que regula a utilização de câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança em locais públicos.

“Já foi colocado em processo legislativo do Governo a nova lei da videovigilância que incorpora as bodycams como instrumento de transparência e salvaguarda dos polícias”, informou Eduardo Cabrita. Ainda assim, e de acordo com um esclarecimento do gabinete do ministro ao JPN, ainda “levará algum tempo” até esta proposta estar concluída.

O uso deste equipamento tem sido reivindicado pelas forças de segurança e alvo de debate público em consequência de alguns casos mediáticos – com o de George Floyd à cabeça – em que imagens de operações policiais acabam disseminadas nas redes sociais através de telemóveis.

César Nogueira, presidente Associação de Profissionais da Guarda (APG), afirma que a Guarda Nacional Republicana ainda não tem conhecimento de como será configurada a Lei da Videovigilância: “Nós não temos conhecimento, ainda, de como é que vai ser a lei definida”, afirma em delcarações ao JPN. O responsável salienta, contudo, o seu ceticismo em relação à aprovação da proposta, referindo que “no nosso país esta questão parece ser sempre mais sensível”.

No entanto, considera que “a questão do uso das bodycams é uma mais-valia, porque traria, certamente, menos processos indefinidos que, por norma, derivam de juízos sem grandes provas que punem mais rapidamente o agente”. César Nogueira acrescenta que a utilização deste equipamento também beneficiaria o próprio cidadão, já que seria uma “forma de clarificar” determinadas situações.

Nós não temos conhecimento ainda de como é que vai ser a lei definida.

Para o presidente da APG, o uso de bodycams poderá alterar o comportamento dos civis, uma vez que se poderão sentir “mais retraídos” com o facto de todo o conteúdo filmado poder “ser utilizado, contra eles, num processo-crime”.

Ao nível interno, existe alguma preocupação quanto à privacidade dos profissionais. César Nogueira destaca que a incorporação de câmaras nos uniformes das forças policiais deve ser uma medida bem definida e “não pode ser usada essa pressão para estar a vigiar os próprios agentes”.

O ministro, Eduardo Cabrita, salientou que “para salvaguardar os direitos fundamentais” foram tidos em conta os contributos da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e da Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI).

Cidadãos e agentes “mais protegidos”

Ao JPN, o vice-presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados (CDHOA), João Lobo do Amaral, esclarece que a lei apresentada é uma “boa proposta” pela funcionalidade que demonstra ter: “a proteção dos cidadãos em geral, assim como das forças policiais no exercício das respetivas funções”. Acrescenta ainda que com esta proposta de lei quer a população civil, quer os agentes de autoridade “ficarão muito mais protegidos na qualidade de ofendidos e defensores da ordem pública”.

Só o tempo e a experiência poderão confirmar uma melhoria do sentido cívico na população em geral

No que concerne ao sentido cívico que esta nova lei pode trazer, João Lobo do Amaral afirma que esta pode “ter um efeito dissuasor de determinadas condutas”, contudo salienta que “só o tempo e a experiência poderão confirmar uma melhoria do sentido cívico na população em geral”.

A aprovação desta nova Lei da Videovigilância significará, ainda, para o vice-presidente da CDHOA “uma diminuição da hostilidade na relação polícia-cidadão”, uma vez que, e focando nas funções do agente de autoridade, “fomentará o uso da força e autoridade dentro dos padrões de proporcionalidade e legalidade que sempre se desejam, e por norma, são praticados.” Contudo, conclui: “Só o tempo e a experiência poderão confirmar uma melhoria do sentido cívico na população em geral”.

Estudo da Universidade de Cambridge

De acordo com uma investigação feita pela Universidade de Cambridge relativamente à utilização de bodycams por parte das forças policiais do Reino Unido e dos Estados Unidos da América, a utilização deste equipamento resultou numa diminuição de 93% das queixas contra as autoridades que utilizavam uma câmara no uniforme, significando uma redução no conflito entre os civis e as forças de segurança.

O estudo explicou, ainda, que quando as pessoas sabem que estão a ser filmadas, o seu comportamento altera-se, o que demonstra que as câmaras incentivam a práticas mais retraídas por parte dos agentes policiais e dos cidadãos.

Artigo editado por Filipa Silva