Pablo Iglesias, líder do partido de esquerda populista Podemos anunciou, esta segunda-feira, que abdica do cargo de vice-primeiro-ministro com a pasta dos Direitos Sociais para se candidatar a presidente do executivo autonómico de Madrid.

É uma tentativa de Iglesias de evitar que o seu partido fique sem representação eleitoral. Esta é mais uma das repercussões da moção de censura de Múrcia que continuam a agitar o cenário político do país vizinho, tendo esta segunda-feira ganho novos contornos, ao atingir a cúpula do Governo castelhano.

A manobra do líder do Unidas Podemos foi uma decisão tomada na quinta-feira, tendo sido cuidadosamente planeada pelo partido da ala esquerda parlamentar. Iglesias aproveitou, contudo, uma visita de Pedro Sánchez a França para gerar um efeito surpresa ao anunciar que vai tentar derrotar Isabel Díaz Ayuso nas eleições autonómicas da cidade madrilena, marcadas para 4 de maio, publicando um vídeo nas suas redes sociais a justificar a sua decisão.

“Vou candidatar-me às eleições na Comunidade de Madrid. Um militante tem de estar onde é mais útil em cada momento. Madrid está neste momento num enorme risco de que haja um Governo de extrema-direita com Ayuso e com o Vox“, disse o ainda vice-presidente, cuja deliberação só surtirá efeito a partir do início da campanha eleitoral, a 20 de abril.

“Vou empregar toda a minha energia na construção de uma candidatura de esquerda forte e ampla, para ganhar”, explicou o dirigente político, destacando que o “bipartidarismo não vai voltar, mas a democracia está ameaçada por uma nova direita trumpista, bem localizada no fundo do estado e impulsionada por enormes poderes económicos e mediáticos”.

O anúncio de Pablo Iglesias surpreendeu o próprio Pedro Sánchez, que soube da resolução apenas minutos antes de ser anunciada.

Uma região polarizada

A campanha eleitoral será um duelo entre dois dirigentes que defendem ideologias antagónicas dentro de uma região cada vez mais polarizada. Se, por um lado, Isabel Díaz Ayuso poderá contar com o apoio do partido de extrema-direita Vox para tentar subir ao poder, Pablo Iglesias estenderá a mão ao Más Madrid, dissidência do Podemos liderada por Iñigo Herrejón desde 2019, como forma de juntar as forças políticas de Esquerda no mesmo barco, formando uma candidatura comum com apoio suficiente para suplantar a Direita.

Neste sentido, o secretário geral do Podemos deverá reunir ainda o apoio de Ángel Gabilondo, do PSOE (Partido Socialista), num futuro pacto à Esquerda na capital. Mónica García, candidata do Más Madrid e a cara mais visível da oposição ao Governo de Díaz Ayuso, especialmente desde a eclosão da pandemia, afirmou já ter encetado conversações com Iglesias e que o “o entendimento será fácil”.

As eleições, que acontecerão no dia 4 de Maio, serão importantes para o Unidas Podemos, dado que, no último sufrágio, o partido de extrema-esquerda sofreu um verdadeiro hecatombe, ficando somente com 7 deputados face aos 20 conquistados pelo Más Madrid.

A reação perante o crescimento do Vox é um dos maiores motivadores de Iglesias na corrida ao executivo regional, segundo o próprio. O esquerdista veicula a ideia de que a região da capital está nas mãos da extrema-direita, numa alusão ao pacto PP-C’s-Vox, que sustenta o executivo de Ayuso, tendo em Madrid um palco privilegiado.

Chuva de críticas por parte da oposição

Por sua vez, à direita, as reações perante a candidatura de Pablo Iglesias surgiram quase de forma imediata, pautando-se pela afirmação da polarização política. A par de Ayuso, outros responsáveis desta ala parlamentar publicaram mensagens que resumem o futuro embate eleitoral a um confronto entre “comunismo” e “liberdade”.

A teia de críticas de Ayuso ao seu novo adversário prosseguiu. A dirigente acusou Iglesias de ser “próximo de independentistas, dos círculos da ETA” e de ter “atuado sempre contra a Comunidade de Madrid”. “Todos os que não querem que o comunismo, aquilo que arruinou tantos países, entre na comunidade vão unir-se em torno de uma candidatura que representa exatamente o contrário”, acrescentou.

Sucessão no Unidas Podemos

A saída inesperada do secretário-geral do Podemos do governo espanhol abre a porta à sucessão no próprio partido. Para o lugar de vice-presidente, o político propôs a ministra do Trabalho, Yolanda Díaz, um dos nomes mais bem cotados e valorizados do Governo, sobretudo devido às medidas de proteção dos trabalhadores implementadas durante a pandemia de Covid-19, tendo conseguido acordos entre sindicatos e patrões.

A confirmar-se, é mais um passo na ascensão da filha de um líder sindical comunista e sobrinha de um deputado do Bloco Nacionalista Galego, vista como uma figura mais moderada, contrastando com o estilo mais conflituoso de Pablo Iglesias, estilo esse que originou vários momentos de tensão com Pedro Sánchez ao longo da legislatura, com o cenário de queda do governo sempre em cima da mesa.

A decisão de Iglesias é de alto risco e para além do óbvio impacto direto na comunidade de Madrid poderá vir a transformar o futuro do Executivo que governa o país e que tem Pedro Sanchéz como líder.

Artigo editado por João Malheiro