Com o sorteio da Liga dos Campeões a ditar o Chelsea FC como adversário do FC Porto nos quartos de final da prova milionária, o JPN faz uma viagem à história do gigante inglês.

O ano era 1896 e Londres era uma cidade habitada por milhões, que percorriam ruas e ruelas para ir trabalhar. Mais que a capital do seu próprio Império, Londres era uma cidade que abraçava o desporto, com o futebol a começar a conquistar o coração dos londrinos.

Henry Augustus “Gus” Mears, um empresário e admirador de futebol, juntamente com o seu irmão, Joseph “Joe” Mears compraram Stamford Bridge, em Fulham Road, no oeste de Londres. O objetivo era que o estádio recebesse partidas do mais alto nível do futebol inglês. Tal não aconteceu e tiveram que esperar até 1904 para tomar posse, já que, na altura, o novo proprietário só podia assumir controlo quando o anterior morresse.

Após terem tomado posse, os irmãos tentaram convencer o presidente do Fulham a ceder o seu estádio, mas não chegaram a um acordo devido às diferenças de renda. Depois de alguns fracassos em trazer partidas de futebol para o recinto, estavam decididos a vender o estádio para a Great Western Railway Company, mas, por recomendação do seu amigo Fred Parker, não o fizeram e criaram um clube, surgindo assim, o Chelsea Football Club.

Os primeiros anos

O clube inglês foi fundado a 10 de março de 1905 no pub “The Rising Sun”. Dado que já existia uma equipa chamada Fulham, o nome foi escolhido depois de rejeitarem London FC, Kensington FC e Stamford Bridge FC. As cores caraterísticas foram inspiradas no Lorde Chelsea que corria com calções brancos e meias azuis.

O primeiro jogo oficial foi a 2 de setembro de 1905, na derrota contra o Stockport County, na Segunda Divisão Inglesa, enquanto que a primeira vitória foi num amigável contra o Liverpool. O primeiro jogador do clube foi o escocês John Tait Robertson, que também foi treinador ao mesmo tempo. O clube começou a contratar vários jogadores, incluindo o guarda-redes William Foulke, que tinha acabado de ser campeão da Taça de Inglaterra com o Sheffield United, e Jimmy Windrige, que veio do Small Heath.

Henry Augustus "Gus" Mears e o irmão compraram Stamford Bridge.

Henry Augustus “Gus” Mears e o irmão compraram Stamford Bridge. Foto: Rick Glanvill / Chelsea Football Club)

Na primeira época, o clube acabou no terceiro lugar, mas o escocês Robertson deixou a equipa em 1907, devido a conflitos com a direção. William Lewis tornou-se no treinador interino, conseguindo a subida de divisão no final da temporada, muito por causa dos golos de Windrige e George Hilsdon. Este último tornou-se no primeiro a marcar mais de cem golos com a camisola dos blues.

Lewis foi substituído por David Calderhead, que ficaria no cargo nos próximos 26 anos. Nas primeiras épocas, a equipa teve pouco sucesso, oscilando entre a primeira e segunda divisão. Em 1909, desceu de divisão e passado dois anos voltou à elite do futebol inglês. Quatro anos depois, o Chelsea chegou à final da Taça de Inglaterra contra o Sheffield United, mas foi derrotado por 3-0. Nesse ano, o clube foi despromovido, mas o campeonato foi suspenso devido à Primeira Guerra Mundial. Após o fim da guerra, o clube londrino foi convidado a disputar a Primeira Divisão, novamente.

O pós-guerra que deixou água na boca

A temporada 1919-1920 foi a primeira época completa em Inglaterra, após a Primeira Guerra Mundial, e tornou-se na mais bem sucedida do Chelsea. Liderado pelo avançado Jack Cock, os blues terminaram em terceiro, o melhor resultado obtido por um clube de Londres até à data. Apesar de terem chegado às semifinais da Taça de Inglaterra, passado alguns anos voltaram à segunda divisão. Em 1929-1930, voltaram à Primeira Liga e daí não saíram durante os próximos 32 anos.

Para se consolidarem entre os melhores, o clube gastou 25 mil libras (quase 30 mil euros) na contratação de três jogadores importantes, Hughie Gallacher, Alex Jackson e Alec Cheyne. Gallacher foi um dos maiores talentos da altura, conhecido por ter levado o Newcastle United ao título na temporada 1926-1927. Juntamente com Alex Jackson, fizeram parte dos Wembley Wizards, a equipa da Escócia que derrotou Inglaterra por 5-1 em Wembley, em 1928. Apesar de todo o investimento e dos 81 golos de Gallacher em quatro épocas, o clube londrino não teve o sucesso desejado. Por conta do investimento que fracassou, o Chelsea ficou com um enorme buraco financeiro por resolver.

Durante muitos anos, o clube investiu em jogadores estrangeiros, mas o melhor que conseguiu foi um oitavo lugar. Com jogadores como Tommy Lei, Sam Weaver ou Harry Burgess, o sucesso tardava em chegar. O clube era muito popular por todo o território inglês e a visita do Arsenal a 12 de outubro de 1935 atraiu 82.905 espetadores a Stamford Bridge, um recorde que até hoje perdura no campeonato inglês.

Após três jogos na temporada 1939-1940, o campeonato foi abandonado na Grã-Bretanha, o que significava que todos os resultados eram considerados “não oficiais”. Com grande plantel a fazer parte da guerra, o Chelsea competia apenas em competições regionais.

A profissionalização do clube

Depois da guerra, o Chelsea voltou com uma equipa renovada, com talentos como Tommy Lawton, Len Goulden e Tommy Walker, mas acabou a primeira época pós-conflito num modesto 13.º lugar.

Ted Drake conduziu o Chelsea até ao primeiro troféu da história do clube.

Ted Drake conduziu o Chelsea até ao primeiro troféu da história do clube. Foto: Wikimedia.

O antigo treinador do Arsenal, Ted Drake, tornou-se o treinador em 1952, começando a modernização de um clube que parecia estagnado no tempo. Investiu nas camadas jovens e alterou os métodos de treino, reconstruindo a equipa com jovens promissores de divisões inferiores, inclusive alguns amadores, o que levou à conquista da liga de 1954-1955, o primeiro troféu da história do clube.

Com a conquista do campeonato, o Chelsea tinha oportunidade de disputar a sua primeira Liga dos Campeões. No entanto, a Football League e a Football Association negaram a participação do clube inglês, pois acharam que deviam priorizar as competições domésticas. Depois de ser campeão, o clube não conseguiu estar à altura das expectativas, passando o resto da década no meio da tabela, para depois voltar a cair temporariamente na segunda divisão. Em 1969, apesar da crise, conquistou pela primeira vez a FA Cup.

No meio da instabilidade, Ken Bates adquiriu o clube por uma libra, impedindo o seu fim. Os anos 80 seriam um novo começo, com o Chelsea a voltar à elite do futebol inglês, com uma curta passagem pela segunda divisão, em 1989. Glenn Hoddle assumiu o lugar de Webb, que tinha levado a equipa ao 11.º lugar. Com Hoddle, chegaram Ruud Gullit e Mark Hughes, dois jogadores mundialmente conhecidos. Com mais um décimo lugar na época 1995-1996 e uma semi final na Taça de Inglaterra, Hoddle deixou o cargo nos blues e assumiu a Seleção Inglesa.

A chuva de estrelas 

Para colmatar o seu lugar entra Gullit, nomeado jogador-treinador para a temporada 1996-1997, que contratou vários jogadores de renome para a equipa, incluindo Gianluca Vialli, campeão europeu com a Juventus, Frank Leboeuf e os italianos Gianfranco Ziola e Roberto Di Matteo. Com estes atletas, o treinador holandês conseguiu jogar um futebol atraente e divertido que levou o Chelsea a conquistar a Taça de Inglaterra, passado 26 anos.

A estrela holandesa foi despedida em fevereiro de 1998, com a equipa no segundo lugar da Premier League e em duas semi-finais. Para o seu lugar chegou Vialli. O italiano iniciou a sua carreira com dois títulos em dois meses. Depois de ganhar a FA Cup frente ao Middlesbrough, conquistou a Taça das Taças contra o Vicenza.

Durante a temporada de 1998-1999, o Chelsea teve a oportunidade de conquistar o título. No entanto, as hipóteses desvaneceram depois da derrota em casa contra o West Ham United e de três derrotas consecutivas contra o Middlesbrough, Leicester City e Sheffield Wednesday. No final, terminaram em terceiro lugar, quatro pontos atrás do campeão Manchester United.

Depois de ter sido negada a participação na sua primeira Liga dos Campeões, o Chelsea fez a estreia na competição em agosto de 1999, onde foi eliminado nos quartos de final pelo Barcelona. Nesta altura, o Chelsea teve jogadores de renome como Zola, Di Matteo, Poyet ou o trio francês vencedor do Mundial de 1998: Frank Leboeuf, Marcel Desailly e Didier Deschamps.

William Gallas no ano de estreia pelos blues.

William Gallas no ano de estreia pelos blues. Foto: Premier League Twitter.

Gianluca Vialli gastou quase 26 milhões de libras (cerca de 30 milhões de euros) em novos jogadores durante o verão, mas foi demitido em setembro de 2000, depois de vencer apenas um dos cinco primeiros jogos. Claudio Ranieri era o nome que se seguia e renovou a equipa com jogadores mais jovens como John Terry, William Gallas ou Frank Lampard.

Apesar de ter chegado às semi finais da FA Cup e final da Taça de Inglaterra, o clube atravessava graves problemas financeiros. Por causa disso, Ken Bates vendeu o Chelsea em 2003, por 140 milhões de libras (164.013.316 milhões de euros).

A era Abramovich

O novo proprietário do clube era o bilionário russo Roman Abramovich. Este período foi marcado por contratações sonantes como  as de Claude Makélélé, Juan Sebastián Verón, Hernán Crespo e Damien Duff.

Com as estrelas em Londres, o Chelsea terminou na segunda posição, a melhor classificação em 49 anos, e chegou às semi finais da Liga dos Campeões. Depois de ser eliminado pelo Mónaco, Ranieiri foi despedido no fim da época. Abramovich optou por José Mourinho, treinador português que tinha conquistado a Liga dos Campeões pelo Porto. Juntamente com Mourinho, chegou Piet de Visser, considerado um dos melhores olheiros de sempre e que descobriu talentos como Romário e Ronaldo Nazário.

Na primeira época do Special One, Mourinho pediu diversos jogadores e o russo satisfez os seus pedidos. Tiago, Paulo Ferreira, Ricardo Carvalho, Robben, Petr Čech e Drogba foram alguns nomes que aterraram em Londres.

A temporada 2004-2005 foi a mais bem sucedida da história do clube londrino. Com John Terry e Frank Lampard a comandarem as tropas, o Chelsea conquistou o título depois de 50 anos. Com apenas uma derrota e 95 pontos, a turma de José Mourinho bateu todos os recordes. Ainda nessa época, o Chelsea conquistou a EFL Cup frente ao Liverpool.

Com a conquista do campeonato, chegaram reforços de renome como Michael Essien ou Wright-Phillips. E foi com eles que o Chelsea festejou o bicampeonato, tornando-se na quinta equipa a ganhar o campeonato duas vezes seguidas, desde a Segunda Guerra Mundial. No entanto, voltaram a não ser bem sucedidos na Liga dos Campeões e foram eliminados da FA Cup pelo Liverpool.

Conquista da Premier League com os protagonistas José Mourinho, John Terry e Frank Lampard.

Conquista da Premier League com os protagonistas José Mourinho, John Terry e Frank Lampard. Foto: Premier League

Com os títulos conquistados, Abramovich continuava a presentear Mourinho com grandes jogadores. Andriy Shechenko, Michael Ballack, Ashley Cole, Mikel John Obi e Salomon Kalou chegaram para tentar o tricampeonato, mas foi insuficiente. Ainda assim, tiveram mais sucesso nas provas domésticas, nomeadamente na FA Cup e na EFL Cup, ao conquistar ambas.

O pós-Mourinho

A 20 de setembro de 2007, Mourinho abandona o Chelsea após vários meses de discussão com Abramovich. Para o seu lugar chegou Avram Grant, um israelita que era diretor de futebol no clube. Apesar do bom desempenho em diversas competições, chegou ao final da época sem nenhum título e acabou despedido.

Depois da aposta falhada em Grant, seguiram-se Luiz Felipe Scolari, Guus Hiddink e Carlo Ancelotti. Ancelotti, bicampeão europeu com o Milan, começou com o pé direito, ao conquistar a Supertaça frente ao Manchester United. Nesse ano, o Chelsea conquistou a Premier League e a FA Cup, mas falhou o objetivo principal: a Liga dos Campeões.

Mesmo com Fernando Torres, David Luiz e Nemanja Matić, os blues acabaram a época 2010-2011 sem nenhum título e Ancelotti a abandonou o clube. O treinador que se seguiu foi André Villas-Boas, treinador pelo qual o Chelsea pagou uma cláusula de rescisão de 15 milhões de euros ao FC Porto.

Apesar do avultado investimento para contratar o português, Villas-Boas acabou despedido em março, dando lugar a Roberto Di Matteo. O treinador responsável pela conquista das Liga dos Campeões em 2012, surpreendeu tudo e todos ao ganhar a taça europeia frente ao Bayern de Munique, após o desempate através de grandes penalidades. No entanto, não teve grande sucesso na Premier League, onde o Chelsea acabou em sexto lugar.

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Nem a conquista da tão esperada Liga dos Campeões segurou o treinador italiano, que na próxima época acabou despedido. Para o seu lugar chegou Rafael Benítez, que conquistou a Liga Europa frente ao Benfica, mas que não durou mais que uma época. Era altura de um regresso de um velho conhecido para continuar a traçar o trilho do sucesso: José Mourinho.

O regresso do Special One

Na primeira época depois do regresso, os blues não conquistaram nenhum título, apesar da boa campanha na Premier League e na Liga dos Campeões. A 1 de março de 2015, Mourinho conquistou o seu primeiro título, a EFL Cup, ao derrotar o Tottenham por 2-0. No mesmo ano, o Chelsea voltou a conquistar a Premier League sob o comando do treinador português.

No entanto e como já é habitual em Abramovich, o russo ferve em pouca água. Depois da época 2014-2015, o Chelsea perdeu a Supertaça diante do Arsenal e começou muito mal o campeonato. Esta desconfiança e falta de resultados levaram a que Guus Hiddink fosse contratado até ao final da temporada. O clube londrino terminou a Premier League em décimo lugar, ficando de fora das competições europeias pela primeira vez desde 1997.

Maurizio Sarri conquistou o seu primeiro título da carreira diante do Arsenal na final da Liga Europa.

Maurizio Sarri conquistou o seu primeiro título da carreira diante do Arsenal na final da Liga Europa. Foto: Facebook Liga dos Campeões.

O selecionador da seleção italiana António Conte foi anunciado como novo treinador do Chelsea em março de 2016. Com o rigor tático do italiano, o Chelsea voltou ao caminho do sucesso, conquistando a Premier League e estabelecendo um recorde de vitórias. Na segunda época, o nível exibicional desceu e só o Chelsea só conseguiu conquistar a FA Cup frente ao Manchester United, em Wembley. Aliado a isso, ficar de fora da qualificação para a Liga dos Campeões e os problemas fora de campo com Diego Costa, ditaram o despedimento de António Conte.

A Londres chegou outro italiano, Maurizio Sarri. O treinador conhecido por privilegiar a posse de bola começou da melhor maneira, mas apenas conseguiu o terceiro lugar no campeonato e a conquista da Liga Europa frente ao Arsenal. Com apenas uma época em Inglaterra, Sarri voltou a Itália para orientar a Juventus, enquanto Frank Lampard regressava ao clube, depois de ter treinado o Derby County. Na sua época de estreia, o Chelsea ficou em terceiro lugar, à frente dos rivais Tottenham e Arsenal.

O efeito Tuchel

No início da época 2020-2021 o Chelsea voltou a abrir os cordões à bolsa e gastou mais de 200 milhões em jogadores de nome como Kai Havertz, Hakim Ziyech, Timo Werner, Thiago Silva, Edouard Mendy e Ben Chilwell, tudo jogadores com experiência e nome no futebol europeus. No entanto, uma má sequência de jogos e exibições pouco conseguidas ditaram o despedimento da lenda do clube inglês. Para o seu lugar, o bilionário russo trouxe Thomas Tuchel, com experiência no PSG e Borussia Dortmund.

O alemão rapidamente se fez notar. Tornou-se no primeiro treinador da história dos blues a estar invicto nos primeiros 13 jogos, acumulando nove vitórias e quatro empates. Os bons resultados do clube londrino traduzem-se, para já, num quarto lugar na Premier League e presença nos quartos de final da prova milionária, depois de ultrapassar o Atlético de Madrid.

Num 3-4-3 com os alas a fazerem os corredores, o Chelsea de Tuchel surpreendeu com esta disposição tática, dado que as antigas equipas do alemão jogavam sempre na tradicional linha de quatro. Ainda que, por vezes, continue a apostar num quarteto defensivo, para jogos de maior dimensão optou pelo sistema de três centrais.

Com a vinda do novo treinador, vários jogadores beneficiaram dos papéis que Tuchel lhes atribuiu. António Rüdiger jogou todos os minutos desde que o alemão chegou, conseguindo mais vezes a titularidade em um mês, do que o resto da época toda com Frank Lampard. Além de Rüdiger, Kovačić ganhou a titularidade, constituindo um meio-campo a dois com Jorginho, remetendo N’Golo Kanté para o banco.

Com apenas alguns jogos, Tuchel já parece ter encontrado o seu melhor 11, ao contrário de Frank Lampard, que fazia diversas alterações e tinha dificuldade em formar um 11 base.

Com muito dinheiro investido e com alguns jogadores a começarem a provar o seu valor, o Chelsea promete ser um osso duro de roer no caminho do FC Porto na Liga dos Campeões.

Artigo editado por João Malheiro