O mundo do futebol recebeu, por volta das 23h20 deste domingo, 18 de abril, a notícia da criação de uma Superliga Europeia, com a integração de 12 dos “principais clubes” do velho continente, segundo os próprios. Esta decisão vai contra toda a comunicação dos últimos dias da UEFA e das principais ligas nacionais, que ameaçam agora punir fortemente os clubes envolvidos.

Os clubes são o AC Milan, ArsenalFC, Atlético de Madrid, Chelsea FC, FC Barcelona, FC Internazionale Milano, Juventus FC, Liverpool FC, Manchester City FC, Manchester United FC, Real Madrid CF e Tottenham Hotspur FC. Num comunicado conjunto publicado nos sites oficiais, e partilhado nas redes sociais de todos os emblemas com a exceção dos dois clubes de Manchester e do Atlético Madrid, estes anunciam “uma nova competição no meio da semana, a Superliga, administrada pelos clubes fundadores”.

Para além dos 12 já confirmados, afirmam ainda que “prevê-se que mais três clubes se juntem antes da época inaugural, que deve começar assim que possível”. Essa data está para marcada para agosto de 2021. Desta forma, este conjunto de equipas “rompe” com a UEFA, e com as suas competições europeias de clubes. Ainda assim, “no futuro, os Clubes Fundadores esperam discutir com a UEFA e a FIFA para trabalharem juntos em parceria”, destacam no mesmo comunicado.

No que diz respeito às competições nacionais, os clubes mantêm o interesse na sua participação, já que os encontros da Superliga seriam exclusivamente durante a semana.

Dentro dos “clubes fundadores”, destaca-se a ausência de emblemas franceses e alemães. Aliás, na Alemanha, foram vários os clubes a virem a público a condenar a competição. Em nota publicada nas redes sociais, os diretores do Borussia Monchengladbach afirmam-se “orgulhosos por todos os clubes alemães terem expressado oposição a esta liga“.

No que diz respeito aos clubes nacionais, o presidente do FC Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa, admitiu em conferência de imprensa que “houve contactos”, mas que não prestou grande atenção: “Estando a Federação Portuguesa de Futebol contra isso, e fazendo ela parte da UEFA, não podemos participar numa coisa que é contra os princípios e regras da União Europeia e da UEFA”. O presidente dos “dragões” afirmou ainda que os azuis e brancos estão na Champions e esperam estar durante “muitos anos”. Em declarações à Lusa, tanto o SL Benfica como o Sporting CP vieram também opor-se à criação de uma superliga europeia.

Funcionamento da competição

Para além das 15 equipas fundadoras (três ainda não foram anunciadas), que não estarão expostas a qualquer tipo de despromoção ou qualificação, “mais cinco clubes qualificam-se anualmente com base nos resultados da temporada anterior”. As equipas estarão divididas em “dois grupos de dez, jogando em casa e fora, com os três primeiros de cada grupo classificarem-se automaticamente para os quartos de final”. As equipas que acabarem em quarto e quinto “vão competir num playoff de duas mãos pelas posições restantes nos quartos de final”. A partir daí, será o formato habitual de eliminatórias a duas mãos até chegar a uma final em campo neutro.

O grande benefício para os clubes é a entrada de receitas com valores muito superiores à da Liga dos Campeões. O comunicado fala que “o novo torneio anual proporcionará um crescimento económico significativamente maior”. Apesar dos valores estarem apresentados de forma algo vaga, o texto refere pagamento de solidariedade gerados pela competição num valor superior a 10 mil milhões de euros “durante o período de compromisso inicial dos Clubes”, e ainda que receberão “um montante de 3,5 mil milhões de euros exclusivamente para apoiar os seus planos de investimento em infraestrutura e para compensar o impacto da pandemia Covid-19“. É também já sabido que a empresa JP Morgan irá financiar pelo menos parte da SuperLiga, não sendo ainda público quanto.

O primeiro presidente da Superliga será o líder do Real Madrid CF, Florentino Pérez. Andrea Agnelli, presidente da Juventus FC, será um dos seus vices, juntamente com Joel Glazer, co-dono do Manchester United. Até ao momento, apenas o líder dos madrilenos veio a público prestar declarações sobre o Superliga. Florentino foi na segunda-feira à televisão espanhola “El Chiringuito TV”, onde este afirmou que o futebol está cada vez a atrair menos interesse, especialmente os jovens, e que com este modelo da Liga dos Campeões, os jogos “são atrativos só a partir dos quartos de final“.

O presidente do Real Madrid CF disse ainda que “se os clubes grandes tiverem mais dinheiro, vai ajudar toda a pirâmide do futebol“, devido à capacidade que estes clubes ganham para “ir comprar jogadores aos clubes mais pequenos, o que os ajuda financeiramente”.

Reações por todo o mundo

Apesar dos clubes acabarem o comunicado com a frase “A inclusão do clube na Super League será um foco imediato para seu envolvimento contínuo com os fãs e outras partes interessadas importantes”, as reações dos adeptos, principalmente nas redes sociais, mas não só, têm sido extremamente negativas para a competição.

O Liverpool FC tem sido dos mais afetados nesta situação. Um clube que é historicamente muito ligado aos adeptos, e que sempre teve uma vertente muito comunitária, está a ser alvo de fortes críticas. No seu tweet a anunciar a decisão, foram dezenas de milhares as respostas, incluindo algumas com mais likes do que o original.

Um grupo de adeptos juntou-se também junto ao estádio dos reds, para afixar tarjas a condenar o clube.

Dentro do mundo do futebol, viu-se ainda uma onda de antigos jogadores a virem para as redes sociais para criticarem os clubes, incluindo atletas que fizeram toda a sua carreira no emblema, como Gary Neville. O inglês, que comenta no canal televisivo Sky Sports, falou no domingo no seguimento de uma partida do Manchester United, único clube onde jogou ao longo do seu percurso profissional, com palavras muito duras para com os donos.

Mas Gary Neville não esteve sozinho nas críticas. De todo o lado, desde políticos como Boris Johnson e Emmanuel Macron, a atuais atletas como Daniel Podence, que fez uma publicação que partilhada posteriormente por Bruno Fernandes e João Cancelo, jogadores de Manchester United e Juventus, respetivamente, dois dos fundadores da Superliga.

Mas a reação mais relevante para o futuro da Superliga e do futebol na Europa foi precisamente a da UEFA. O organismo, num comunicado em conjunto com a Federação Inglesa de Futebol, Premier League, Real Federação Espanhola de Futebol (RFEF), LaLiga, Federação Italiana de Futebol (FIGC) e Lega Serie A, anunciou que irá com os seus parceiros fazer tudo o que possam para impedir que esta competição vá para a frente.

Para tal, a instituição já afirmou por diversas vezes que irá fazer “tudo ao seu alcance, tanto a nível judicial como desportivo” para punir os envolvidos. Como havia sido comunicado no domingo, os clubes serão proibidos de participarem “em qualquer outra competição a nível nacional, europeu ou mundial, e os seus jogadores podem ser impedidos de representar as suas selecções nacionais”.

O próprio Aleksander Ceferin, presidente do organismo europeu de futebol, reagiu a condenar a criação da competição. Voltou a repetir a ideia de que os jogadores não poderão jogar pelas suas seleções, afirmando ainda que “todas as confederações estão de acordo com isto”. Garantiu ainda que é possível jogar a Liga dos Campeões sem estes clubes “pois na Europa há muitas equipas e muito boas”.

Deixou ainda palavras muito duras para Ed Woodward, diretor executivo do Manchester United e Andrea Agnelli, presidente da Juventus FC. Afirmou que Woodward lhe tinha ligado na última quinta-feira a dizer-lhe “que este estava de acordo com as nossas mudanças [no modelo da Liga dos Campeões], e que Agnelli foi quem “mais o desiludiu”, dizendo mesmo que nunca viu alguém a “mentir tantas vezes como ele”.

Artigo editado por João Malheiro