Se o Ramal da Alfândega, no Porto, fosse ligado por um transporte público, o troço teria uma procura média diária a rondar os 4 mil passageiros. A procura seria ainda maior considerando a hipótese de uma paragem intermédia nas Fontainhas e a possibilidade de transbordo (isto é, ligação a outros meios de transporte público nas estações terminais).

Os valores constam de um estudo de procura potencial que a Câmara Municipal do Porto encomendou ao professor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), Paulo Pinho, e cujo debate público já era aguardado há alguns meses.

No trabalho, apresentado durante uma sessão pública que decorreu na quarta-feira (21) na Biblioteca Pública Almeida Garrett, foram consideradas duas hipóteses: uma que liga exclusivamente a Alfândega a Campanhã e outra que, na mesma ligação, contempla uma paragem nas Fontainhas.

Os resultados revelaram que os valores médios diários de passageiros que utilizariam o transporte sem transbordo variam entre as 3.892, na versão em que considera apenas as duas estações terminais (Alfândega-Campanhã), e 5.150, na versão que considera três estações (Alfândega-Fontainhas-Campanha).

Os números aumentam quando se admite os valores médios diários com transbordo – com metro ou autocarro, por exemplo, em Campanhã. Na versão com as duas estações, o valor de potenciais passageiros passa para 7.367 e na versão com as três estações, o valor é de 8.817.

Sobre estes resultados, o professor da Faculdade de Engenharia admitiu que ficou “admirado”. Mas, ainda acrescentou que “a introdução da [estação] das Fontainhas faz aumentar a procura em cerca de 20%”.

O docente deixou ainda a ressalva que para os cálculos deste estudo “não entrou o efeito do turismo” e “também não entrou nenhuns dos grandes projetos que estão em curso ou estão pensados para Campanhã”, por isso, segundo o investigador “os valores teriam uma tendência para subir ainda mais”.

Câmara pende para opção mista

Durante a sessão, Rui Moreira afirmou que “o estudo de procura era absolutamente fundamental” para tomar uma decisão quanto ao futuro daquele troço. Depois, e apesar de ter referido que o “executivo estava dividido entre qual é a melhor das soluções”, o edil recuperou a sugestão que tinha já deixado numa reunião pública da autarquia: “e se conseguíssemos fazer uma mistura das duas coisas”, referiu, numa alusão à transformação do espaço numa ecopista e local de passagem de transporte coletivo.

O autarca da Câmara do Porto esclarece que “nada obriga a que este veículo seja em carril”. “Aliás, nós estamos a estudar modelos de BRT [Bus Rapid Transit], que circulam em rodado [pneumático] que não precisam de um trilho ou de um carril”, explicou.

O presidente da câmara acrescenta que a cidade pode “ficar com um canal que de alguma maneira pode ser utilizado para fruição, para as pessoas andarem a pé, andarem de bicicleta e também para este veículo a andar de segunda a sexta-feira e ao sábado e domingo parava, pois, a procura é muito menor ao fim de semana”, afirmou.

GARRA “surpreendido” com procura recusa solução mista

Os resultados do estudo deixaram os membros do Grupo de Ação para a Reabilitação do Ramal da Alfândega (GARRA) “agradavelmente surpreendidos com as estimativas de procura”, pois veem que “este valor é ainda mais impressionante se dissermos que é bem superior aos passageiros diários na linha de Metro para o aeroporto (dados de 2017)”.

Numa nota enviada às redações, os membros do GARRA deixam claro que não acreditam que a hipótese mista, proposta pela autarquia, “faça sentido”. Segundo o grupo, “os resultados do estudo de procura reforçam esta convicção, porque qualquer hora sem transporte público representará várias centenas de passageiros por servir”.

O GARRA acrescenta que “a ideia de ter transporte público à semana e ecopista ao fim de semana obriga a mais investimento do que 100% transporte público (iluminação do túnel, sistema de segurança vídeo, sinalética, mobiliário urbano) e impede o serviço de transporte público dois dias por semana”.

O Grupo de Ação para a Reabilitação do Ramal da Alfândega reforça a ideia de que “no Ramal da Alfândega o custo de oportunidade é muito grande, porque para passarem peões e ciclistas impede-se a circulação dum transporte público entre dois polos de grande atração”. “Deixemos o Ramal para aquilo em que ele é imbatível e criemos espaços de fruição onde eles fazem falta”, salienta os membros do GARRA.

A Câmara do Porto criou ainda um microsite, onde disponibiliza informação sobre o Ramal da Alfândega, incluindo o debate público e os resultados do estudo de procura realizado pela FEUP.

Artigo editado por Filipa Silva