Zara Larsson já experimentou o metaverso. “É a vida real, de certa forma. Só que é online”, resumiu a cantora sueca a propósito da sua experiência na plataforma Roblox, partilhada numa sessão do último dia da Web Summit, em Lisboa. O metaverso é, resumidamente, o conceito que descreve um universo digital, que é coletivo e partilhado e no qual se misturam a realidade aumentada, a realidade virtual e a internet (lembram-se do Second Life?).

Em maio, a artista deu um concerto virtual na plataforma e mais de quatro milhões visitaram o seu “mundo”. Desde então, e apenas com a venda de merchandising virtual – asas, capas, avatares – a artista já somou mais de um milhão de dólares

A parceria com a Roblox, plataforma online que permite aos jogadores projetarem e viverem experiências dentro do seu mundo virtual, converteu Zara numa defensora desta nova forma de se conectar com os fãs. 

Em contraste com o tempo em que os artistas “tinham de visitar diferentes cidades e ir a estações de rádio” promover a sua música, a artista da pop acredita que agora isso pode ser feito “essencialmente da sala de estar e com a mesma conexão emocional”. “Como artista, eu amo ver a cara das pessoas para quem estou a atuar, mas acho que vamos chegar lá. É tudo uma questão de tempo”, articulou Zara. “Eu sinto que isto é só o início”, manifestou.

O responsável máximo pelo departamento de Música da Roblox, presente na sessão, apresentou a plataforma como a oportunidade perfeita para a nova geração de fãs descobrir, partilhar e se aproximar da música de que gosta. Jon Vlassopulos acrescentou que “no mundo real, muito poucas pessoas irão experienciar um meet and greet” com os artistas. “Na nossa plataforma, isso é possível”, garantiu.  

Jon Vlassopulos, diretor de música da Roblox. Foto: Web Summit/Flickr

Outro argumento apresentado em defesa do metaverso é a inclusividade. “Concertos são uma coisa de elite. São caros”, afirmou Vlassopulos. Por oposição, segundo o diretor, o metaverso permite que o utilizador esteja em qualquer lado, e o dinheiro, ou a falta dele, não têm que ser um impedimento.

A conjugação da música com o mundo virtual desencadeou uma série de possiblidades, outrora impensáveis, a começar por artistas somente virtuais, para além dos de carne e osso que podem aparecer no jogo. O representante da Roblox na Web Summit acredita ainda que “vão existir grandes artistas” a sair da plataforma, fruto da comunidade criativa que ali está a ser criada. 

O Tik Tok é o futuro da música?

Existirem artistas a surgir na Internet não é um fenómeno novo. Do tempo do MySpace ao do Youtube, passando pelo do Vine, acumulam-se os exemplos de músicos que iniciaram a sua carreira a partir da World Wide Web. Um fenómeno que tem evoluído e influenciado o panorama musical. Mas, atualmente, neste campeonato, não há nenhuma plataforma que supere o Tik Tok.

Para além das danças e desafios que se tornam virais e transformam músicas em êxitos, não são raros os casos de artistas que são descobertos através da aplicação. Assim, impõe-se a questão: o Tik Tok é o futuro da música? A pergunta foi título de uma sessão, no último dia da Web Summit, na qual subiu ao palco o diretor global de música do Tik Tok, Ole Obermann

Falando de redes sociais, surgem dúvidas relativamente a quem controla realmente o acesso e a escolha dos conteúdos: o utilizador ou o algoritmo. “Estamos sempre a tentar manter um equilíbrio saudável entre a programação e o fluxo orgânico e natural do que vai funcionar. Então, ao entrar no Tik Tok, a maior parte das atividades no feed ‘para ti’, nós não temos nada a ver com isso”, garantiu Ole Obermann. 

Ole Obermann, diretor global de música do Tik Tok. Foto: Web Summit/Flickr

Contudo, o diretor não escondeu: “Se nós gostarmos de algo, vamos fazer uma aposta nisso”. Ainda assim, quanto às músicas que têm grande sucesso, Ole assegurou que o sucesso tem “quase sempre um começo orgânico” e depois “nós [Tik Tok] podemos ajudar a impulsionar”. Isto porque, nas palavras do representante, o Tik Tok não se quer tornar numa “superfície editorializada”. 

Numa época em que as “barreiras geográficas estão a cair”, Obermann defendeu que hoje os artistas têm de competir “ainda mais pela audiência”. “Eu penso que isto é uma evolução de toda a indústria. Os artistas vão ter de trabalhar mais de cada vez que lançarem música”. Isto porque, agora, a “interação do artista” não tem só que ver com “a canção”, inclui também o “engajamento”.  

A busca pela independência dos artistas

Continuam a existir, no entanto, vozes que se opõem ao envolvimento das grandes plataformas no processo de transação que existe entre os artistas e os respetivos fãs. No mesmo palco onde se falou do domínio do Tik Tok, discutiu-se, mais tarde, a busca pela independência dos artistas. 

Logo no início da sessão, os oradores concordaram que a nova tecnologia e as constantes inovações estão a empoderar os criadores. A possibilidade de um artista criar, lançar e promover a própria música, sem relegar o controlo a agentes externos, nunca foi tão real. Ainda assim, será que os algoritmos e as plataformas restringem os conteúdos? Será que os artistas continuam a estar dependentes de grandes empresas?

“As grandes plataformas escolhem o que quiserem. Eles escolhem os vencedores e os perdedores”. Esta é a visão de Rasty Turek, o fundador e CEO da Pex, uma empresa tecnológica de direitos digitais, que defendeu a importância do licenciamento e apontou uma falta de literacia generalizada nesta matéria. “Existem cinco pessoas que compreendem [as leis de direitos de autor], e elas nunca se encontraram”, proferiu.

Rasty Turek, fundador e CEO da Pex Foto: Web Summit/Flickr

Já a diretora de operações da Believe, uma distribuidora digital independente, destacou o impacto positivo da evolução tecnológica: “Em França, existiam vinte pessoas que conseguiam viver da música. Agora são muito mais”, afirmou. Isabelle Andres vê na tecnologia uma aliada para os artistas: “A tecnologia também está aqui para ajudar os artistas a perceberem como ganhar dinheiro”, asseverou. 

A questão da monetização também foi explorada por Sam Feldt. O DJ criou a Fangage, uma plataforma “creator-owned” que permite que os artistas tenham controlo total sobre os dados dos seus fãs e a sua própria plataforma, por oposição ao que acontece nas redes sociais e nos jogos online, como o Tik Tok e a Roblox. 

Isabelle Andres, diretora de operações da Believe e Sam Feldt, fundador da Fangage. Foto: Web Summit/Flickr

Sam defendeu que os músicos “não se podem basear no streaming se tiverem o objetivo de “fazer dinheiro” com a sua arte. O DJ vê nas NFT’s a oportunidade para os artistas conseguirem chegar aos seus “super fãs”, porque esses vão “apoiar” os criadores “com mais do que alguns cêntimos por mês”. 

Já Zara Larsson tinha manifestado, na sessão com a Roblox, que o metaverso “vai mudar a forma como os artistas fazem dinheiro”. Tal como Sam Feldt, a cantora expressou que as “plataformas de streaming” dificultam a remuneração e reforçou que “as receitas” do metaverso, no qual os “fãs podem expressar” a sua simpatia pelos músicos através da compra de merchandising virtual, “vão diretamente para o artista”

“Diversidade”, “propriedade”, “independência”, “equidade”. No fecho da sessão, estas foram as palavras escolhidas pelos oradores para definir aquilo que será o futuro da música e da independência artística.

Artigo editado por Filipa Silva