Uns saíram, outros cresceram. Mas certa está a maioria absoluta do PS, desfecho inesperado destas Eleições Legislativas. Analisamos os principais resultados das eleições que mudam a cara do Parlamento.
António Costa pediu, o país deu. O Partido Socialista (PS) foi o vencedor das Eleições Legislativas 2022, contra todas as expectativas, que adivinhavam uma corrida muito mais intensa entre os socialistas e o PSD de Rui Rio.
Os sociais-democratas acabaram por não se aproximar tanto do PS como esperavam, mas há outras surpresas e cenários inesperados a sair destas eleições antecipadas. O PS garantiu quase mais 400 mil votos (379.972) do que em 2019 e, mesmo depois de dois governos, os eleitores voltaram a dar a confiança a Costa, que tinha começado por pedir a maioria, antes de se abster de a pedir nos últimos dias de campanha.
Também no centro dos acontecimentos que levaram a este ato eleitoral antecipado estavam o Bloco de Esquerda (BE) e a CDU (PCP-PEV), que acabaram por ser os grandes derrotados à esquerda: o Bloco e a CDU perderam, em conjunto, cerca de 344.861 votos face às eleições de 2019. Já à direita, a derrota foi do CDS-PP, que teve uma noite muito pouco popular: pela primeira vez na história das eleições em democracia, o partido não elegeu qualquer deputado.
Do lado das vitórias, à esquerda, o Livre conseguiu voltar a entrar na Assembleia da República; à direita, a Iniciativa Liberal ganha terreno, mas foi o Chega o partido que mais cresceu, ao ascender a terceira força política.
Analisamos os resultados e outros números, do Porto e do país, destas eleições, que vão mudar em muito a composição da Assembleia e definir o futuro próximo do país com agentes inesperados. Em primeiro lugar, este é o novo Parlamento:
Portugal pinta-se de rosa com maioria absoluta do PS
Os números fazem história nas legislaturas recentes, por vários motivos. Este é o resultado mais alto do PS desde 2005, quando José Sócrates conseguiu um valor que parecia impossível de alcançar – 45,05%, com 2.589.900 de votos, uma célebre maioria que deu ao PS 121 deputados. Não chegou lá, mas foi a primeira vez desde essa eleição que os socialistas ultrapassaram a marca dos 40%, neste caso com
António Costa segura, ainda, o cargo de primeiro-ministro pela terceira vez consecutiva, algo que só Cavaco Silva conseguiu atingir com o PSD, na altura com duas maiorias absolutas. Costa pode tornar-se o socialista que esteve mais tempo à frente de um executivo, já que Sócrates e António Guterres não ultrapassaram os sete anos no cargo.
Com estes números, António Costa ultrapassa os seus próprios resultados, de 2019 (36,34%, 1.908.036 votos e 108 deputados) e 2015 (32,31%, 1.747.685 votos e 86 deputados, o desfecho que acabou por dar origem à geringonça). É também, o segundo melhor resultado do partido no que toca a deputados eleitos – com 117 deputados já garantidos, podem ainda aumentar em mais dois ou três quando contados os consulados, aproximando-se dos 121 de Sócrates em 2005.
Os distritos laranja que ‘viraram’ para o PS
Se em 2015 e 2019, algumas manchas ‘laranja’ pintalgavam o mapa eleitoral do país, o domínio rosa foi, desta vez, generalizado a todos os círculos eleitorais do país mesmo nos tradicionais “bastiões” sociais-democratas.
O PS foi o mais votado em regiões como Vila Real, algo que aconteceu apenas mais uma vez em legislativas, e em Bragança. Este último caso é mais curioso, tendo em conta a tradição de voto no distrito, normalmente a eleger mais deputados do PSD – o que aconteceu mesmo na maioria de Sócrates. O distrito ‘virou’ para os socialistas, mas foi renhido: apenas 15 votos separaram o PS do PSD, com
6.480 votos, respetivamente. Esta curta diferença deu ao PS dois deputados, contra um do PSD, na primeira vez que o PS foi o partido com mais deputados eleitos neste círculo eleitoral.‘Virou’ também Viseu, e ainda com larga margem (41,55% dos votos para o PS, contra 36,79% do PSD), um distrito também tradicionalmente social-democrara e conhecido como “cavaquistão”. Não havia uma vitória socialista no distrito desde 2005.
O PSD aquém das expectativas de Rio
Durante dias a fio, as sondagens e inquéritos pré-eleitorais iam dando ao PSD uma perspetiva de melhoria dos resultados face às eleições anteriores (com possibilidade de ficar taco-a-taco com o PS ou até mesmo superá-lo). Aconteceu o contrário. Os sociais-democratas ficaram à frente apenas na Madeira, onde concorreram em coligação com o CDS.
Ao nível nacional, o PSD obteve 29,27% – 1.498.605 votos, aos quais se juntarão 79 mil das coligações com o CDS nas ilhas e mais alguns da emigração. Elege 76 deputados, uma quebra de quatro face a 2019. Ao nível de votos, teve (para já) mais 40 mil do que os 1.457.704 de 2019 (27,8%), apesar da perda de representação parlamentar. A diferença para o PS é de cerca de 12 pontos percentuais.
Rui Rio, que nos dias antes das eleições brincava nas redes sociais com as subidas e descidas nas sondagens, acabou por assumir a dimensão da derrota do partido, deixando em aberto a possibilidade de se demitir: “se se confirmar que o PS tem uma maioria absoluta tem um horizonte de governação de quatro anos, e eu não estou a ver como é que posso ser útil neste enquadramento”, disse no discurso em reação aos resultados, perante uma sede de campanha em silêncio e com os risos de há algumas horas já longe.
Apesar das ambições de vitória, foram muitos os votos a separar o PSD do PS: Rui Rio ficou a uma distancia de 668.724 votos face a António Costa, uma diferença também superior em larga margem à de 2019 (450.332).
A esquerda vence, mesmo com derrotas do BE e CDU
A esquerda da bancada parlamentar, em conjunto, voltou a levar a melhor sobre a ala direita. Mesmo assim, perdeu terreno em número de deputados, com vários fatores a contribuir para esta queda.
Há mudanças significativas à esquerda do PS para a próxima legislatura, com a maioria absoluta do PS a ocupar a maioria dos lugares do Parlamento.
Bloco sofre a maior queda
O Bloco de Esquerda sofre a maior queda nestas eleições face aos resultados anteriores, descendo de terceira para quinta força política (em lugares que foram partilhados por dois ‘novos’ partidos de direita). De um grupo parlamentar de 19 deputados conseguido em 2019 (9,52%), este ano, o Bloco elege apenas cinco, tendo reunido 4,46% dos votos, uma derrota assumida pela líder Catarina Martins no discurso pós-resultados.
Repete-se um caso semelhante ao que já tinha acontecido em 2011, quando passaram de 16 para oito deputados depois de recusado o “PEC4” de José Sócrates, algo que originou uma crise política semelhante à do ano passado. A situação, no entanto, foi-se alterando e, em 2015, o partido conseguia a sua maior votação de sempre.
O BE perdeu representantes de vários distritos – é o caso de José Manuel Pureza, Moisés Ferreira e José Gusmão, que não foram eleitos por Coimbra, Aveiro e Faro, respetivamente. Mantêm-se na bancada parlamentar Catarina Martins e José Soeiro, pelo Porto; Mariana Mortágua e Pedro Filipe Soares, por Lisboa; e Joana Mortágua, por Setúbal.
CDU perde deputados. PEV fica sem representação parlamentar
No caso da CDU (coligação do PCP com o PEV), passa de quarto a sexto partido. A bancada dos comunistas reduz-se para metade face a 2019: ao conseguir 4,39% dos votos, elegem seis deputados, face aos 12 da anterior eleição (6,33%). Estes são os piores resultados de sempre para o partido, que tinha já atingido mínimos históricos nas eleições de 2019 (332.473 votos, 6,3%).
Com 236.630 votos, só elegeram em quatro distritos, tendo perdido mandatos em Évora e Santarém. Ao perder estas regiões, perdem também dois nomes fortes da bancada parlamentar: João Oliveira, até agora líder parlamentar, não foi eleito por Évora; já o histórico António Filipe não regressa ao Parlamento por Santarém.
A derrota da CDU, reconhecida pelo secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, trouxe outras “perdas”, como descreveu. O Partido Ecologista Os Verdes, parte desta coligação, perde pela primeira vez a representação na Assembleia da República. O partido tinha já só dois lugares, o de José Luís Ferreira, por Setúbal, e Mariana Silva, por Lisboa, que deixam de estar presentes. O partido, lembre-se, nunca foi a votos sozinho.
As novas caras da direita – e o desaparecimento dos outrora Populares
A ascensão do Chega ao terceiro lugar – mas com menos votos que nas Presidenciais
Apenas dois anos depois da estreia no Parlamento, o Chega, de André Ventura, ascende a terceira força política. O partido, que esteve muitas vezes no centro do debate, com o PS a fechar-lhe a porta a quaisquer negociações e o PSD a rejeitá-lo num putativo Governo, passa a ter 12 deputados em vez de um, 11 homens e uma mulher. O partido elege por Lisboa, Porto, Aveiro, Braga, Faro, Leiria, Santarém e Setúbal.
A diferença nos números, porém, é significativa face ao segundo lugar do PSD, com 385.559 votos – 7,15%. Apesar da subida no número de deputados e no número de votos face às anteriores Legislativas (recebeu 67.826 votos em 2019), o partido de André Ventura perde mais de 111 mil votos face às Presidenciais de 2021, nas quais o líder concorria.
Liberais sobem do nono para o quarto lugar
A crescer esteve também a Iniciativa Liberal (IL), que se posiciona como a quarta força política. O partido de João Cotrim de Figueiredo elege oito deputados, por quatro distritos (quatro em Lisboa, dois no Porto, um em Setúbal e um em Braga), tendo garantido 268.414 votos (4,98%).
A IL faz, desta forma, mais que o CDS nas anteriores eleições (e certamente mais que nestas), apesar de se ter estreado no Parlamento apenas em 2019, com Cotrim de Figueiredo, até agora deputado único.
Os votos na IL foram mais fortes no litoral, em especial nos círculos eleitorais de Lisboa e do Porto.
CDS desaparece
O maior perdedor destas eleições foi o CDS-PP, de Francisco Rodrigues dos Santos. Desde as constituintes que o partido, considerado um dos fundadores da democracia, esteve sempre representado no Parlamento – até agora.
Com 86.578 votos (mais que o PAN, por exemplo, mas em localidades em que se elege menos), garantiu 1,61% dos votos, que não foram suficientes para eleger deputados. Depois de em 2011, com Paulo Portas, conseguir o segundo melhor resultado da sua história (653.987 votos), o CDS foi perdendo força até, em 2019, eleger quatro deputados com 221.774 votos, 4,2%.
Os resultados deste ano correspondem, sensivelmente, a um quarto dos votos da IL. Ao perceber a dimensão da derrota, Francisco Rodrigues dos Santos apresentou a demissão da liderança do partido no discurso de reação aos resultados, seguindo o que fez Assunção Cristas em 2019.
Livre volta a entrar no Parlamento
Apesar das movimentações da legislatura que agora termina, com o Livre a entrar no Parlamento e a perder essa representação meses depois, com a retirada de confiança política à deputada única Joacine Katar Moreira, o partido subiu ligeiramente os resultados nestas legislativas, o suficiente para eleger.
Rui Tavares, candidato por Lisboa, entra pela primeira vez no Parlamento depois de receber 68.975 votos (1,28 %), quase mais 14 mil que os 55.660 de 2019. As sondagens indicavam hipóteses mínimas de o Livre eleger uma segunda deputada (Isabel Mendes Lopes, número 2 em Lisboa), que não se vieram a concretizar.
De qualquer maneira, o partido regressa ao Parlamento e foi dos que melhor resistiu, quando comparado com outras forças, mesm0 depois de ter iniciado a campanha excluído dos debates televisivos.
PAN desce e só elege a líder
Em queda esteve o Pessoas Animais Natureza (PAN), que regrediu depois da subida conseguida há três anos. A líder, Inês de Sousa Real, foi a única eleita, por Lisboa, com 82.250 votos (1,53%), eleição apurada mesmo no final da contagem. Face aos quatro deputados conseguidos na anterior eleição (3,32% dos votos), os outros três, incluindo a líder parlamentar Bebiana Cunha, que concorria novamente pelo Porto, ficaram de fora.
O partido regressa a números próximos aos de 2015, em que receberam 75.140 votos, correspondentes a 1,39%. Apesar de tudo, embora o cenário tenha ameaçado o partido durante algumas horas, o PAN não fica sem representação parlamentar.
Abstenção volta a baixar, mesmo em pandemia
Apesar de serem eleições realizadas em plena pandemia, numa altura em que o pico da variante Ómicron ainda nem foi atingido, a participação eleitoral voltou a aumentar face aos últimos anos. Os resultados, para já, ainda não estão totalmente fechados – falta juntar os números dos votos dos círculos da Europa e de Fora da Europa, que só chegam daqui a cerca de 10 dias -, mas já é possível analisar os resultados relativos aos residentes em Portugal.
Em 2019, atingiram-se valores recorde de abstenção. 45,5% dos eleitores residentes em Portugal (e 89,2% dos emigrantes) não foram votar, num total de 51,4% de abstenção. Depois destes números, qualquer subida seria uma vitória, que acabou por se cumprir com uma subida, contabilizada até ao momento, de 296.893 votos em território nacional, o que perfaz um total de 5.389.705 de eleitores a ir às urnas.
As contas são favoráveis e acredita-se que os números possam chegar perto dos de 2011, em que 5,5 milhões foram votar. Pode ver os resultados da abstenção de todas as eleições desde 1975 neste gráfico:
Mudanças nos resultados do Porto
No Porto, o cenário não mudou drasticamente, mas teve alterações significativas. O PS elegeu 19 deputados pelo distrito, mais dois que em 2019, vencendo a região com 42,53% dos votos – uma subida considerável face aos 36,65% de há dois anos. O PSD manteve-se relativamente estável (32,33% vs. 31,16%), mas perdeu um deputado pelo distrito, elegendo 14.
A terceira força política no distrito já não é o Bloco de Esquerda, que desce para quarto, e passa a ser a IL, que elege dois deputados, subindo de 1,52% dos votos para 5,11%. O Bloco (
, contudo, aguenta-se aqui acima do Chega, que na região é a quinta força mais votada (4,37%). Os partidos elegem dois deputados cada, com o BE a perder dois dos quatro que antes tinha pelo distrito.Ainda no capítulo das perdas, a CDU garante apenas uma deputada. Já o CDS-PP e o PAN perderam as únicas deputadas do Porto.
Os deputados eleitos pelo círculo do Porto
PS (19)
- Alexandre Tiedke Quintanilha
- Maria do Rosário Gamboa Lopes de Carvalho
- João Pedro Soeiro de Matos Fernandes
- Maria Isabel Solnado Porto Oneto
- João Paulo Moreira Correia
- Ana Paula Mata Bernardo
- João Veloso da Silva Torres
- Tiago Barbosa Ribeiro
- Cristina Maria Mendes da Silva
- Eduardo Nuno Rodrigues e Pinheiro
- Hugo Miguel da Costa Carvalho
- Joana Fernanda Ferreira de Lima
- Rui Carlos Morais Lage
- Carlos Alberto Silva Braz
- Patrícia Monte Pinto Ribeiro Faro
- Carla Alexandra Magalhães de Sousa
- Miguel dos Santos Rodrigues
- Isabel Sofia Alves de Andrade
- José Carlos Ribeiro Barbosa
PSD (14)
- Sofia Helena Correia Fernandes Sousa Matos
- Rui Fernando da Silva Rio
- Paulo César Rios de Oliveira
- Catarina Leite de Faria da Rocha Ferreira
- Afonso Gonçalves da Silva Oliveira
- Hugo Miguel Sousa Carneiro
- Márcia Isabel Duarte Passos Resende
- Paulo Fernando de Sousa Ramalho
- Rui Pedro Guimarães de Melo Carvalho Lopes
- Maria Germana de Sousa Rocha
- Paulo Miguel da Silva Santos
- Joaquim José Pinto Moreira
- Andreia Carina Machado da Silva Neto
- Firmino Jorge Anjos Pereira
IL (2)
- Carlos Manuel Guimarães Oliveira Pinto
- Ana Patrícia Costa Gilvaz
BE (2)
- Catarina Soares Martins
- José Borges de Araújo de Moura Soeiro
CH (2)
- Rui Pedro da Silva Afonso
- Diogo Velez Mouta Pacheco de Amorim
CDU (1)
- Diana Jorge Martins Ferreira