O projeto desenvolvido pelo INESC TEC, no Porto, vai ser aplicado em frotas de veículos pesados e visa detetar a sonolência e o cansaço nos condutores. O sistema visa apreender os padrões pessoais únicos de cada condutor e permite “deteções cada vez mais precisas”.

O projeto vai ser aplicado em frotas de veículos pesados e visa detetar a sonolência e a fadiga nos condutores. Foto: takahiro Taguchi/Unsplash

Detetar o sono e o cansaço dos condutores já é uma realidade em algumas marcas de automóveis. O projeto desenvolvido pelo Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESC TEC) foca-se em condutores de veículos pesados e pretende evitar “uma das principais causas de acidentes em Portugal”: a sonolência.

Os acidentes rodoviários têm “um impacto muito significativo na nossa sociedade”, explica a coordenadora do projeto, Ana Filipa Sequeira, e a sonolência é um dos principais motivos para tal, o que deu origem à criação deste projeto.

Em declarações à agência Lusa, a também investigadora do INESC TEC, afirma que o projeto é “centrado no condutor” e recorre a várias fontes de informação, como vídeos, sinais fisiológicos e sensores, para “melhorar a deteção de estados que possam pôr em causa a segurança da condução”.

Para tal, os investigadores criaram simuladores “realistas” para potenciar recolhas de dados mais completas, e desenvolveram algoritmos para a biometria, deteção de sonolência e reconhecimento de emoções. “Esta é uma área de investigação com muitos desafios e problemas em aberto”, salientou Ana Filipa Sequeira, dando como exemplo a inexistência de dados para a investigação.

Por detrás do “sistema robusto” de monitorização desenvolvido pelo projeto está a variabilidade cardíaca, sinal fisiológico que “permite identificar a sonolência no condutor”. A coordenadora garante à Lusa que “está comprovado que um estado de sonolência precede um episódio de sono” e que “se um estado de sonolência é detetado, o corpo está já em luta para permanecer acordado, possivelmente escapando para momentos de microssono no processo”. Ana Filipa Sequeira acrescenta, contudo, que a forma como a sonolência afeta o desempenho dos condutores é muito variável.

De qualquer forma, a investigadora da INESC TEC assegura que “em estado de sonolência o sistema cardíaco altera o comportamento. Quando um condutor está sonolento, a sua frequência cardíaca torna-se mais lenta e irregular, e a pressão arterial desce”.

Nesta linha, os investigadores desenvolveram duas plataformas de simuladores onde detetaram as métricas cardíacas (através de sensores embutidos no volante), 78 pontos de referência da face (através de um ‘vídeo face’), a aceleração e travagem, bem como o controlo de velocidade e acompanhamento de faixa de rodagem.

O AUTOMOTIVE vai permitir “integrar eventos específicos de tráfego e investigar a capacidade de reação do condutor”, assevera a investigadora, acrescentando que as tecnologias desenvolvidas vão permitir a “criação de sistemas de prevenção, deteção e alarme de eventos associados à sinistralidade”.

Sistema do projeto avalia a variabilidade cardíaca, sinal fisiológico que “permite identificar a sonolência no condutor”. Unsplash

Como pode ser implementado este alerta?

Ao JPN, Ana Filipa Sequeira afirma que, até agora, foram desenvolvidas tecnologias ao nível da deteção da análise dos dados “mas não propriamente do sistema a implementar” num sistema real. Ainda assim, quanto à forma como os condutores poderão, na prática, ser alertados, a coordenadora avança que o alerta poderá passar por “um sinal sonoro” ou “um aviso no monitor”, mas que isso é “dependente do caso de aplicação concreto”.

Questionada pelo JPN quanto à possível implementação de um alerta para outros condutores que se encontrem na via face ao condutor a quem foi detetada sonolência ou fadiga, a coordenadora do projeto menciona que “isto são questões muito complexas”, porque apesar de “parecer evidente uma utilidade desse alerta”, de forma que “outro condutor se precavesse”, é necessário ter “muito cuidado” com um possível estímulo que se provoque para garantir que não se causa “uma situação ainda mais complicada”.

Inicialmente, a tecnologia do INESC TEC, que também teve a participação de investigadores da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL) e da empresa CardioID, vai ser aplicada apenas em frotas de veículos pesados, mas os investigadores esperam que também possa vir a ser integrada em veículos ligeiros de passageiros.

Apesar das várias contribuições do projeto para o desenvolvimento de um “sistema robusto” que apreenda os padrões pessoais únicos de cada condutor, a coordenadora do AUTOMOTIVE assevera que ainda há muitos obstáculos que “não foram ultrapassados”.

Ana Filipa Sequeira garante que o “passo seguinte nesta investigação é reunir esforços dedicados à integração total desses algoritmos num sistema final de deteção de sonolência e fadiga”.

Ao JPN, a investigadora afirma que aquilo que espera é “continuar a ter novos financiamentos para dar continuidade ao estudo”. Explicita também que “não há ainda um protocolo já estabelecido para a implementação” do projeto, porque isso vai “exigir um planeamento rigoroso”. No entanto, garante que é isso que pretende “com o continuar da investigação”.

O projeto AUTOMOTIVE foi financiado pela União Europeia e por fundos públicos nacionais, num valor aproximado aos 250 mil euros.

Artigo editado por Tiago Serra Cunha