Em 2016, Jamala ganhou a Eurovisão com um tema alusivo à guerra. Passados cinco anos, a cantora ucraniana é uma entre os milhares que saem do país. Os ecos do conflito que eclodiu na Ucrânia também se ouvem no mundo da cultura.

Jamala venceu o Festival da Eurovisão em 2016. Foto: Eurovision/ANDRES PUTTING (EBU)

Em 2016, Jamala apresentou-se no Festival Eurovisão com o tema “1944”, ano em que aconteceu uma deportação em massa de tártaros (minoria ética muçulmana) da região da Crimeia. Na canção, a artista ucraniana deixava uma forte mensagem política e histórica sobre a guerra.

Cinco anos depois, a vencedora do festival europeu faz agora parte das centenas de milhares de ucranianos que fogem do país devido ao conflito gerado pela invasão das tropas russas.

A cantora deixou a Ucrânia no dia 24 de fevereiro, dia em que estalou a guerra no país.

Nas redes sociais, Jamala foi atualizando os seus seguidores e mostrando a realidade dos refugiados. Nos últimos dias, a artista tem utilizado a sua plataforma digital para sensibilizar e reportar a crise ucraniana.

Jamala contou na sua conta de Instagram que deixou o país no dia 24 juntamente com os filhos. “Na noite de 24, saímos de Kiev com as crianças, passámos quase quatro dias no carro, em filas, sem comida que, em estado de choque, nem sequer pensámos levar. Fizemos dois quilómetros em quatro horas”, conta.

Entre muitos vídeos e textos que deixou nas redes sociais, Jamala manifesta-se com uma grande tristeza ao ver a situação ucraniana. “Não entendo esse terror sangrento! Acredito no nosso presidente, no nosso exército, nos nossos homens e mulheres fortes e corajosos. Nós ganharemos! A Ucrânia não pode ser silenciada! A Ucrânia não pode ser derrotada”, escreveu a cantora nas redes sociais.

 

 

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Obras destruídas em museu

À medida que cresce o conflito na Ucrânia, são cada vez mais os impactos em diversas áreas, incluindo na Cultura. Desde obras de arte que terão sido destruídas no contexto da invasão, a artistas impedidos de trabalhar, até manifestações e boicotes de vário género que têm a Rússia como alvo.

No passado domingo, foram destruídas 25 obras da artista ucraniana Maria Prymachenko. Segundo o Ministério dos Negócios Estrangeiros ucraniano, as pinturas expostas no Museu da História local de Ivankiv terão ardido na sequência de um incêndio provocado pelos russos.

Prymachenko (1909-1997) era uma notável artista ucraniana, autodidata, que ilustrava a vida quotidiana e a natureza “fantástica e mística” no seu trabalho. A pintora foi-se tornando uma notada artista, tendo chegado a ser classificada como “brilhante” por Pablo Picasso. A sua obra e legado são marcos da cultura ucraniana.

De acordo com o governo ucraniano, todo o recheio do museu foi comprometido pelas chamas.

Maestro russo afastado

A título coletivo e individual, a Rússia tem sido sancionada também no plano cultural e do entretenimento. Logo na quinta-feira, o Festival Eurovisão da Canção confirmava a proibição de participação da Rússia. O país foi expulso da competição pelos atos de guerra cometidos ao invadir a Ucrânia.

Visado foi também Válery Gergiev. A Filarmónica de Munique, o Festival de Edimburgo e o Scala de Milão afastaram o maestro. Gergiev tinha o cargo de maestro principal em Munique, desde 2015, e foi afastado após se ter mantido em silêncio, depois de ter sido instado a demarcar-se, até segunda-feira, das ações de Vladimir Putin, e a sancionar publicamente a invasão da Ucrânia.

O mesmo aconteceu no Festival de Edimburgo e no La Scala de Milão. O maestro pró-Putin foi destituído de altos cargos em diversos teatros e viu serem cancelados vários espetáculos que tinha marcados em países ocidentais. Canadá, Nova Iorque, Viena, Milão, Munique, Edimburgo, são exemplos de locais cujas autoridades apontaram Válery Gergiev como persona non grata. É um dos mais prominentes maestros do século XXI e o seu alinhamento com o regime russo e posição pró-Putin podem estar a custar-lhe a carreira.

No mundo das artes, há também quem tenha optado por utilizar a falta de comparência como manifestação contra as ações tomadas pela Rússia. Os artistas selecionados para representarem a Rússia na Bienal de Veneza decidiram que não iriam comparecer em resposta ao conflito.

Alexandra Sukhareva e Kirill Savchenkov publicaram na rede social Facebook um post onde confirmavam a sua ausência na Bienal de Veneza, justificando a falta e condenando as ações de Putin. “Não há lugar para a arte quando estão a morrer civis sob o fogo de mísseis, quando os cidadãos da Ucrânia estão escondidos em abrigos, quando os opositores russos estão a ser silenciados”, escreveram. “Tendo nascido na Rússia, não irei apresentar o meu trabalho no pavilhão russo da Bienal de Veneza”, afirmou adicionalmente Sukhareva num comentário.

Os representantes russos já confirmaram a decisão dos dois artistas. “O pavilhão russo estará fechado”, escreveram num post na rede social Instagram.

Os boicotes ao setor artístico e cultural russo não se ficam por teatros e exposições. Também as plataformas de entretenimento por streaming se manifestaram condenando as ações de Putin e sancionando a Rússia.

Primeiro a Disney, que anunciou, esta segunda-feira, que não irá lançar novos filmes no território russo devido à invasão russa. Logo após a decisão tomada pela Disney, a Warner Bros. também se pronunciou. A empresa alertou que iria cancelar a estreia de “The Batman”, marcada para sexta-feira (4), no país.

A gigante Netflix confirmou que não irá cumprir a nova lei audiovisual da Rússia. A lei que exige a inclusão de cerca de 20 canais públicos não será cumprida pela Netflix como forma de protesto aos conflitos.

O Youtube também surfa na mesma onda dos restantes. A plataforma digital bloqueou o acesso dos canais russos Sputnik e RT em toda a Europa. A decisão do Youtube veio juntar-se à de outras plataformas digitais como o Facebook e o Instagram.

A Meta, detentora destas redes sociais, afirmou que iria banir toda e qualquer publicidade destes meios estatais russos bem como contas falsas, páginas e grupos que publicam argumentos pró-Putin. Segundo a empresa, “a RT e a Sputnik são tidas como parte da máquina de propaganda russa, que espalha perspetivas de apoio à invasão russa da Ucrânia”.

Artigo editado por Filipa Silva