João Falcão e Cunha é um dos quatro candidatos a reitor da Universidade do Porto. Em entrevista ao JPN, o diretor da Faculdade de Engenharia falou da sua motivação para a candidatura e aquela que é a sua visão para a UP. Ambiciona uma universidade "surpreendente", que valorize a comunidade académica e sirva a sociedade. Candidatos são ouvidos na sexta-feira.

Depois de vários anos como docente e, mais recentemente, diretor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), João Falcão e Cunha decidiu agora apontar mais alto. Acredita ter “o conhecimento e a experiência necessários” para construir uma universidade “surpreendente” como reitor da Universidade do Porto (UP).

O candidato a reitor é natural do Porto, onde fez a maior parte do seu percurso académico e profissional. Doutorado em Ciências Computacionais pelo Imperial College, de Londres, lecionou nos departamentos de Engenharia e Gestão Industrial (DEGI), de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial (DEMEGI) e de Engenharia Mecânica (DMEC) da FEUP.

Agora, com 62 anos, espera que o “muito” que aprendeu como diretor da FEUP lhe permita colocar “a universidade [a] servir a sociedade”. Está convicto de “que a universidade pode fazer mais e melhor do que atualmente faz”. É isso que o move a paragens mais altas.

Calendário
Sexta-feira, dia 29, tem lugar a Audição Pública dos candidatos. Segue-se a eleição do reitor pelo Conselho Geral da Universidade do Porto a 6 de maio.

Define como prioridades o desenvolvimento sustentável, a valorização da comunidade académica e a internacionalização. A partir de uma maior aposta nessas várias vertentes, conta ter uma universidade mais coesa e próxima.

No que toca à questão climática, quer que a universidade produza, através de painéis fotovoltaicos, 35% da energia que consome em 2026. Propõe ainda uma licenciatura em Estudos Gerais, que permita aos estudantes ter uma formação mais ampla e multidisciplinar. Nos seus planos, encontra-se também a criação de um Instituto de Investigação em Políticas Públicas.

Para que a UP ultrapasse fronteiras, quer que haja um centro no estrangeiro. Admite a ambição e os riscos envolvidos naquilo que planeia, mas “se não tiver riscos, não é interessante e surpreendente”. Afinal, quem corre por gosto não cansa. “É algo que eu sinto que gosto de fazer”, afirma.

Esta é a segunda de uma série de entrevistas que o JPN publica com os candidatos ao cargo de reitor. Sexta-feira, dia 29, tem lugar a Audição Pública dos candidatos, seguindo-se a eleição pelo Conselho Geral da UP a 6 de maio.

JPN – O que o fez decidir candidatar-se a reitor da Universidade do Porto?

João Falcão e Cunha (JFC) – A principal razão é achar que tenho o conhecimento e a experiência necessários para, com a equipa que conto formar, fazer mais e melhor pela universidade e que isso se reflita na sociedade e na economia. Portanto, sei que a universidade pode fazer mais e melhor do que atualmente faz.

JPN – Sente que o mandato do atual reitor, que está agora quase completo, foi insuficiente para resolver os problemas da universidade e ir mais longe?

JFC – No próximo mandato sei que posso fazer mais e melhor com toda a universidade e que a universidade tem potencial e capacidade para fazer mais e melhor. Sei que, com a equipa que eu vou constituir, posso fazer isso.

JPN – Sente que o que tem sido feito até agora não tem sido suficiente?

JFC – Eu não gostaria de me pronunciar sobre o passado, acho que temos de falar sobre o futuro.

Eu acho que tenho o conhecimento e a experiência necessários para, com a equipa que conto formar, fazer mais e melhor pela universidade.

JPN – Não tem nada a dizer relativamente aos objetivos que foram alcançados e que ficaram por alcançar?

JFC – A universidade, desde que foi criada e antes de ser criada, tem feito um percurso muito relevante e muito importante ao longo dos mais de 100 anos de história. Antes disso, as instituições que deram origem à universidade já tinham um percurso também importante. Portanto, acho que tem sido um percurso de melhoria contínua. Mas sei como fazer mais e melhor.

JPN – Já frequentou a universidade há muito tempo. Que conexão e ligação é que ainda mantém com a Universidade do Porto? O que é que mudou desde que foi estudante? Sente-se conectado da mesma forma?

JFC – Como sou diretor, sou professor e fui aluno, tenho uma relação muito próxima [com a Universidade] e sinto que estou em casa. Acho que temos de transmitir essa sensação a outros. Eu fui aluno de outras duas universidades e uma delas, onde fiz o doutoramento, que foi o Imperial College, todas as semanas recebo informações sobre o que a escola faz. Várias vezes por ano recebo uma revista, várias vezes por ano recebo informações sobre doações que eu posso fazer para vários projetos que a universidade tem. Eu sei que isso é fundamental também para a Universidade do Porto e, por isso, a ligação dos antigos alunos tem de ser muito mais reforçada e eles podem ajudar-nos muito, à universidade e aos atuais estudantes.

Acho que as Associações de Estudantes têm um papel fundamental e muitas delas envolvem antigos alunos, antigos dirigentes das Associações de Estudantes. A FAP, por exemplo, criou um Prémio que tem o nome do primeiro presidente da FAP. Eu acho que a Universidade do Porto tem pessoas que são extraordinárias, as que estão cá, desde estudantes a investigadores, e também pessoas que não estão cá, mas que estão próximas. Nós temos muito a beneficiar com manter essa proximidade e aprofundar essa proximidade. Acho que quem tem mais a beneficiar são os atuais estudantes. E essa ligação é absolutamente essencial para que a universidade possa compensar a estabilidade do financiamento público e as limitações que temos atualmente.

JPN – Sente então que a universidade não tem mantido um contacto próximo com os alumni, os antigos estudantes?

JFC – É uma situação que é muito diferente de faculdade para faculdade. Há faculdades que têm feito isso, há outras que não. Eu acho que é uma área onde o esforço tem de ser feito com muito mais profissionalismo e com muito mais envolvimento externo. Aliás, uma das estruturas que eu proponho que seja criada é o Conselho para o Desenvolvimento Sustentável da Universidade do Porto, que visa também promover esse relacionamento com os antigos alunos, que podem aconselhar a Universidade do Porto nas várias vertentes da sua missão.

A ligação dos antigos alunos tem de ser muito mais reforçada e eles podem ajudar-nos muito, à universidade e aos atuais estudantes.

JPN – Que feitos e realizações é que retira dos seus dois mandatos como diretor da FEUP com os quais possa aprender como reitor?

JFC – Aprendi muito como diretor da Faculdade de Engenharia. Aprendi muito com as pessoas da FEUP e da UP. Nós temos contacto com toda a universidade e com o exterior da universidade, com as empresas, com as organizações e com as instituições. Acho que o que mais aprendi foi que as pessoas da universidade, se forem bem tratadas e valorizadas, são capazes de fazer coisas surpreendentes. A universidade e as pessoas que a universidade tem, com a minha liderança, serão capazes de ser melhores a bem da sociedade, porque eu acho que o grande objetivo é a universidade servir a sociedade, não só por ser uma universidade pública, mas por ter também uma multidisciplinaridade, que cobre muitos domínios e tem uma capacidade de influenciar a sociedade muito grande. Portanto, juntamente com todas as pessoas, acho que o meu programa de ação é um bom enquadramento para aquilo que a universidade é capaz de fazer e é capaz de nos surpreender.

JPN – O que é que o distingue e o que é que acrescenta em relação aos outros candidatos para o tornar mais apto para atingir esses objetivos e alcançar essa missão?

JFC – Quem lê os programas de ação, pode ver qual é a diferença entre os candidatos. Também não gostaria de me estar a comparar aos outros candidatos. Portanto, gostaria de falar sobre aquilo que eu estou a propor que seja o objetivo para a universidade em 2026. Por isso é que eu achei que devia ser claro, sobre o que é que a universidade deve ser em 2026 e tenho os objetivos e depois tenho metas, o cenário que mostra o que a universidade tem sido, desde 2015 ou 2016 até 2020. E faço uma projeção com um cenário para 2026.

Portanto, tenho os objetivos, tenho as metas e tenho uma explicação de como é que eu acho que se consegue chegar lá. E para chegar lá é preciso, claro, cooperação de toda a universidade e do contexto. Ou seja, é preciso que as empresas, organizações e entidades públicas colaborem neste projeto que eu acho que é um projeto ambicioso, mas que é realizável. É para tornar a universidade surpreendente.

JPN – De que forma a Universidade é e pode ser surpreendente? O que é que como reitor pretende fazer para cumprir com essa premissa?

JFC – O financiamento público do Ensino Superior em Portugal é cerca de 1,2 mil milhões de euros. Todo este financiamento público ao sistema de ensino superior é equivalente ao de uma universidade inglesa, como é o caso do Imperial College. Por outro lado, isso significa, com o contexto que nós temos, que provavelmente as universidades não vão ter um aumento de orçamento público. Portanto, significa que, se a universidade quer ser mais e melhor, tem de conseguir captar projetos – os projetos que existem, do PRR, do Portugal 20-30 e do Horizonte Europa – mas também tem de conseguir uma maior ligação a empresas inovadoras. Empresas e organizações têm de nos ajudar e nós temos de as ajudar.

Acho que a Universidade do Porto tem de, em 2026, produzir pelo menos 35% da energia que consome através de painéis fotovoltaicos.

JPN – Essa colaboração pode ajudar a universidade a superar alguns problemas de financiamento?

JFC – Sim, sei que essa é a minha experiência na Faculdade de Engenharia, por exemplo. E sei que temos, no nosso contexto, antigos alunos que são muito bem-sucedidos e que eu tenho a certeza que estão disponíveis para, através de um mecenato significativo, contribuírem para que a Universidade do Porto seja surpreendente e consiga, por exemplo, dar bolsas a estudantes bons e que precisem para poder estudar, que consigam dar financiamento para projetos de infraestruturas sobretudo ligados aos estudantes, ligados à educação, mas também à investigação e à inovação. Tenho experiência disso aqui na FEUP e sei que, sendo a universidade muito maior do que a Faculdade de Engenharia, terá muitos mais antigos alunos disponíveis para fazerem esse complemento, porque acredito que eles terão todo o gosto, interesse e vontade em ajudar, em promover a Universidade do Porto a chegar mais longe.

JPN – Há algum projeto mais surpreendente, inovador e fora da caixa que tenha em mente para a Universidade?

JFC – Sim. Nós temos de ser orientados pelos objetivos de desenvolvimento sustentável. Eu acho que, por exemplo, a Universidade do Porto tem de, em 2026, produzir pelo menos 35% da energia que consome através de painéis fotovoltaicos. Nós já temos aqui, eu sei que há outras escolas que já têm, mas tem de ser uma ação mais concertada e mais proativa. Também devemos tratar os nossos afluentes para os podermos utilizar, como a água que vem da Águas e Energia do Porto em vez de a deitarmos fora. Devemos utilizá-la para regar ou para outros fins que possam ser úteis.

JPN – A universidade pode ser fundamental para o desenvolvimento sustentável e proteção do ambiente?

JFC – Tem de ser. Temos de trabalhar mais nessas áreas e temos de, nos nossos programas de educação, fomentar isso. Eu acho que isso é inevitável, mas tem de ser uma prioridade nossa.

JPN – Falou de desenvolvimento sustentável, que outras prioridades, se for eleito, vai ter em conta para um mandato como reitor?

JFC – Eu acho que devemos valorizar os nossos técnicos, os nossos investigadores e os nossos docentes. Têm de estar nas categorias mais elevadas. Por exemplo, acho que temos de ouvir mais toda a gente, temos de ouvir mais os nossos estudantes e temos de lhes dar mais opções nos programas de educação que têm. Ou seja, deixá-los escolher. No contexto da Universidade do Porto, um aluno de Letras poder fazer cursos em engenharia ou nas ciências ou em psicologia, um aluno de Engenharia poder fazer cursos noutras áreas.

Temos de ouvir mais os nossos estudantes e temos de lhes dar mais opções nos programas de educação que têm.

JPN – Esse projeto já está em curso, os estudantes podem escolher disciplinas de outros cursos.

JFC – Existe, mas acho que deveria ser reforçado. Uma das minhas propostas, aliás, é que se crie uma licenciatura que se chama licenciatura em Estudos Gerais, que envolva o maior número possível de faculdades, em que os estudantes possam escolher aquilo que querem fazer, aconselhados naturalmente.

JPN – Ou seja, cada estudante construiria o seu leque de unidades curriculares?

JFC – Sim, com alguma orientação. Por exemplo, um aluno que queira fazer um mestrado em Medicina, se quiser fazer essa licenciatura tem de fazer algumas coisas que sejam requeridas para depois poder fazer um mestrado em Medicina ou poder fazer um mestrado integrado em Medicina. É um objetivo difícil e por isso é que eu digo que é surpreendente. Eu assumo que o meu programa de ação tem riscos, mas acho que se não tiver riscos, não é interessante e surpreendente.

JPN – Acha que é altura de tomar riscos?

JFC – Eu acho que nós temos sempre de correr riscos.

JPN – Perante a atual situação, a inflação, a pandemia…

JFC – A guerra… É assim, nós há três anos não sabíamos que ia haver uma pandemia, há um ano não sabíamos que ia haver uma guerra. O futuro é incerto. Portanto, temos de nos preparar para que tudo mude ou algumas coisas mudem. Temos de nos adaptar. Portanto, os riscos fazem parte da nossa atividade. Temos é de ter mecanismos para gerir os riscos. E isto, por exemplo, da licenciatura em Estudos Gerais não é novo, mas eu não sofro da síndrome “o que foi inventado aqui não é bom”. Por exemplo, em diversas universidades a nível mundial este tipo de cursos existe. A Universidade de Lisboa tem uma licenciatura em Estudos Gerais há oito anos. Admira-me como é que a Universidade do Porto não tem.

JPN – Sente que será possível realizar isso tudo em quatro anos?

JFC – Acredito que sim. A minha experiência diz que é possível, mas, claro, é preciso contar com os apoios dos órgãos de governo e de aconselhamento da Universidade do Porto e com entidades externas. É para isso que serve um reitor também. É para conseguir que as ideias sejam negociadas, e admito que possam precisar de ser adaptadas, porque a universidade tem gente que pensa muito bem e que, portanto, pode enriquecer as ideias do meu programa de ação.

O futuro é incerto. Portanto, temos de nos preparar para que tudo mude ou algumas coisas mudem.

JPN – No seu programa tem ainda 26 objetivos, sendo eleito, se tivesse de começar por algum, qual seria?

JFC – Posso-lhe, por exemplo, referir um que eu acho que é importante, que contribuirá para a internacionalização, que será abrir um Centro da Universidade do Porto fora de Portugal, por exemplo em África, por exemplo em Angola. Eu tenho feito trabalho nessa área. Já há cursos da Universidade do Porto fora de Portugal a funcionarem, mas são casos isolados. Esses casos isolados mostram que é possível. É possível ser mais ambicioso e sei que existe interesse em alguns países. Eu acho que nós temos essa possibilidade e temos essa missão, que é, em cooperação, por exemplo com uma universidade em Angola, termos lá cursos certificados nossos. Temos muitos alunos nossos que vêm de países da CPLP e, em particular, de África que podem vir a ser professores lá ou cá. Nós teríamos vantagens e o país onde esse Centro estivesse com certeza que também teria vantagens.

Outro objetivo que coloquei é a criação de um Instituto de Investigação em Políticas Públicas, porque acho que esse é também um desígnio da universidade, sobretudo em assuntos que são difíceis. Portanto, esse Centro de Investigação em Políticas Públicas pode beneficiar do conhecimento e da experiência de pessoas da universidade e de fora desta. Deve ter parceiras internacionais e deve estudar problemas como por exemplo a pobreza ou as desigualdades sociais. Acho que um Instituto de Políticas Públicas da universidade seria importante porque esse conhecimento existe, está fragmentado e deveria ser colocado num foco. Tenho trabalhado também para esse projeto, já estou a trabalhar há alguns meses com pessoas que trabalham fora de Portugal, mas que querem trazê-lo para Portugal, juntamente com instituições de grande renome internacional. Portanto, isso também eu acho que pode ser algo que venha a surpreender a universidade. Eu acho que temos capacidade de influenciar as políticas públicas. Acho que essa é uma das grandes missões.

João Falcão e Cunha é diretor da FEUP desde 2014. Foto: Egídio Santos/D.R.

JPN – No Dia Nacional dos Estudantes, centenas de estudantes saíram às ruas em protesto por melhores condições. Criticam a questão das propinas e a falta de apoio social. Como é que um reitor poderá ajudar a aliviar economicamente aqueles que mais precisam?

JFC – Acho que só explicando às entidades públicas a situação e através de parcerias com entidades privadas, mecenas, que estejam disponíveis para apoiar. Por exemplo, nós temos aqui alguns projetos que apoiam estudantes, nomeadamente, por exemplo, a Fundação EDP e a Bondalti. Não são muitos, mas são alguns. A minha perspetiva é fazer crescer esse tipo de acordos e de parcerias, envolvendo antigos alunos, porque antigos alunos ainda se lembram da situação por que passaram, em particular antigos dirigentes associativos, que têm uma perspetiva alargada dos problemas, porque os viveram e, portanto, estão normalmente em posições agora que lhes permitem ter outra intervenção na sociedade, na economia e até na influência política.

JPN – Nos últimos anos houve um maior investimento em alojamento estudantil, sendo que estão planeadas 800 novas camas para o futuro próximo. Apesar disso, citando o atual reitor, este é ainda “um dos maiores problemas socioeconómicos dos estudantes do Ensino Superior”. Se eleito reitor, como planeia expandir o alojamento acessível?

JFC – Eu acho que aí há duas medidas. Uma tem de ser feita pelas entidades públicas, do ponto de vista da ação social. Nós temos apenas 22% dos estudantes com bolsas, o que é em termos europeus relativamente baixo. Também temos propinas elevadas em termos europeus e, portanto, essa combinação depende sobretudo do Governo. Nós não temos, como universidade, a missão nem a possibilidade de dar bolsas de ação social. Podemos fazê-lo através de parcerias com empresas, mas eu acho que nós temos de fazer o programa que está previsto a nível da qualificação das residências que a universidade tem e outros projetos em que está envolvida. E tem de conseguir também dar condições para facilitar o acesso a residências sobretudo para os alunos que entram na universidade vindos de fora, nos primeiros anos.

Acho que uma coisa que tem de ser mudada é a forma como o concurso geral de acesso é feito, em que um aluno sabe que entra na universidade praticamente no dia anterior a ter de se inscrever. Isso do ponto de vista de encontrar alojamento é mau, mas não depende de nós. Nós podemos é fazer com que o serviço da universidade certifique, com base na experiência passada, as residências que são oferecidas atualmente pelo sistema privado. Isso permite-nos influenciar a qualidade e eventualmente o preço que as residências oferecem, porque eu também não acredito que os financiamentos públicos sejam suficientes para isso. Preocupa-me não só os alunos do concurso nacional de acesso, que muitas vezes têm de vir de fora e têm de arranjar quarto de um dia para o outro e, portanto, a capacidade negocial é baixa, mas também os que vêm do estrangeiro. Eu acho que nós devíamos ter para estes alunos que chegam à Universidade do Porto um serviço muito melhor do que o que temos hoje em dia.

JPN – Sente que 800 novas camas neste momento é suficiente?

JFC – Não. Acho que não é suficiente, mas como digo, podem ser da universidade ou podem ser externas, mas deveriam ser, no fundo, acompanhadas por nós.

JPN – A universidade em cooperação com entidades externas e privadas poderá ser mais ambiciosa e providenciar mais camas?

JFC – Acho que sim. Há interesse, mas isso tem de ser, mais uma vez, negociado com as próprias estruturas associativas dos estudantes da Universidade do Porto e com a FAP. Eu acho que o papel dos estudantes é fundamental também nesta negociação, porque acho que a informação que os estudantes têm sobre as residências onde estão, quer sejam da universidade quer sejam de fora da universidade, deve ser aproveitada e gerida pela universidade para bem dos futuros estudantes da universidade.

Uma coisa que tem de ser mudada é a forma como o concurso geral de acesso é feito, em que um aluno sabe que entra na universidade no dia anterior a ter de se inscrever.

JPN – Recentemente, houve 70 denúncias de casos de assédio na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Na Universidade do Porto foram reportados quatro casos de assédio até ao momento por parte de docentes. Como é que considera que um reitor poderá enfrentar melhor estas situações e facilitar a sua denúncia?

JFC – Em primeiro lugar, acho que a nossa tolerância para essas situações deve ser zero. Não é admissível qualquer universidade, qualquer faculdade tolerar essas situações. Portanto, acho que faz parte do processo educativo, de um processo de comunicação e de um processo de gestão garantir que, em primeiro lugar, isso não deva acontecer e, quando acontece, que haja mecanismos para que sejam feitas as denúncias. Temos de ter esses mecanismos em vigor e disponíveis para que haja não só tolerância zero, mas também uma resposta rápida e efetiva e que, se houver esses casos, assim que sejam detetados, que se cumpra a lei.

JPN – Tem alguma medida em mente para facilitar o processo de denúncia?

JFC – Acho que é comunicação e termos canais de comunicação abertos, formais, para que se possa reagir rapidamente a essas situações. Isso envolve os serviços de comunicação e os serviços jurídicos, que têm de estar bem articulados para se poder receber as queixas, filtrá-las e atuar dentro da lei o mais rapidamente possível.

JPN – Como é que imagina a Universidade do Porto daqui a quatro anos?

JFC – Considero que vai ser mais coesa e que vai ouvir mais as pessoas da universidade. E, ouvindo-as, vai atuar dessa forma. Acho que uma das áreas importantes é não só o envolvimento com as unidades orgânicas e os serviços, mas também com as entidades em que a Universidade do Porto participa. Existe pouca interação. Há um Conselho, que reúne todos os meses, do reitor com os diretores das unidades orgânicas, mas não há reuniões, por exemplo, com os diretores ou os presidentes das entidades participadas em que a Universidade do Porto tem maioria e com quem consolida contas para benefício de todos. Eu acho que o facto das pessoas estarem juntas faz com que troquem experiências e beneficiem dos conhecimentos e das experiências dos outros. Está nos estatutos que a universidade deve ouvir as Associações de Estudantes. Não há nenhuma reunião regular com os presidentes das Associações de Estudantes, há com a FAP, por exemplo, mas eu acho que deveria haver com as direções das Associações de Estudantes também.

JPN – Sente que a comunicação e o contacto próximo e constante são a chave para uma universidade “surpreendente”, como adjetiva?

JFC – Acho que sim. Não só profissional, mas também social. Por exemplo, existe uma estrutura neste momento, que é o Círculo Universitário do Porto, no Campo Alegre, que tem essa possibilidade, tem esse fim, mas há outras que deveriam ser dinamizadas para poder haver mais contacto entre as várias instituições que constituem a Universidade do Porto. Essa riqueza deve ser melhor aproveitada. Para bem das próprias instituições, acho que todos os membros da Universidade do Porto, todos os membros da comunidade, onde eu incluo os antigos alunos também, devem ser ouvidos e devem ser integrados melhor nesta comunidade.

Eu acho que o facto das pessoas estarem juntas faz com que troquem experiências e beneficiem dos conhecimentos e das experiências dos outros.

JPN – E sente que daqui a quatro anos isso será uma realidade?

JFC – Eu sei que daqui a quatro anos isso vai ser uma realidade.

JPN – Relativamente às suas expectativas para as eleições, espera sair vencedor?

JFC – Eu tenho, obviamente, expectativas de ser o próximo reitor.

JPN – Tem confiança disso?

JFC – Isso vai depender do Conselho Geral. Tenho a certeza de que são pessoas com inteligência e bom-senso que vão escolher o melhor reitor para a Universidade do Porto.

JPN – Se não for eleito, já pensou no que se seguirá?

JFC – Para já, estou focado neste projeto. É onde estou a pôr toda a minha energia, para além das funções que tenho e de uma vida pessoal que todos temos de ter. Devo dizer que gosto muito do que faço e estou a gostar muito de fazer o que faço, pensar no que é que a Universidade do Porto pode vir a ser em 2026. É não só por achar que tenho a competência, o conhecimento e a experiência que são necessários para ser reitor, mas também por conhecer muito bem a universidade. Por exemplo, falei com todos os diretores das unidades orgânicas para perceber as principais preocupações e necessidades. Aprendi muito, mas, além de saber que a Universidade do Porto pode ser mais e melhor, é algo que eu sinto que gosto de fazer. Acho que, como reitor, e com a equipa e toda a comunidade, será, para além de uma honra se me escolherem, um serviço que irei prestar à universidade e um serviço que, no fim, a universidade tem de prestar à economia, à sociedade e ao ambiente. Juntam-se todas as componentes que eu acho necessárias para uma pessoa se candidatar a reitor. Acredito que os meus concorrentes também pensam desta maneira.

Aprendi muito, mas além de saber que a Universidade do Porto pode ser mais e melhor, é algo que eu sinto que gosto de fazer.

JPN – Joga todas as cartas nesta candidatura?

JFC – Tenho estado a trabalhar para que seja a melhor candidatura de todas. Agora, vai depender do julgamento do Conselho Geral e, de certeza, é melhor 23 pessoas a escolher o reitor do que uma. 23 pessoas pensam melhor do que uma.

Artigo editado por Tiago Serra Cunha