A startup portuense quer difundir hábitos alimentares saudáveis e desmistificar dietas vegan e vegetarianas. Para tal, a Venn Foods fornece kits com ingredientes e instruções passo-a-passo, motivando os clientes a aprender a cozinhar vegetais de forma criativa, sutentável e apoiando produtores regionais e nacionais. Criado por três jovens empreendedores, o projeto já faz entregas no Porto, Braga e Aveiro.

Uma dieta vegan ou vegetariana pode parecer complicada. Dos métodos de preparação aos custos, são muitas as questões que se colocam e os mitos que se criam, por exemplo, quanto à impossibilidade de ter uma alimentação saudável sem as fontes mais óbvias de proteína. Foi a pensar nisso que surgiu, no Porto, um projeto empreendedor que quer ensinar os portugueses a comer de forma sustentável, sem que falte nada.

A Venn Foods consiste num serviço online que fornece refeições vegan e vegetarianas. Mas não se trata de entregas de comida ao domicílio – o cliente recebe kits com ingredientes frescos, de origem local ou nacional, e instruções passo-a-passo para a confeção de receitas, também criadas e enviadas pela empresa.

“É suposto a comida ser cozinhada em casa: nós entregamos todos os ingredientes e a receita, mas já vem tudo nas quantidades certas. O processo fica mais simples”, explica Snider Rodrigues, um dos cofundadores da empresa, ao JPN.

Cada kit contém uma refeição para duas ou três pessoas. Com este formato de “mercearia híbrida”, a empresa quer incentivar uma mudança nos hábitos de consumo. “Da minha experiência, há muita gente que não sabe o que fazer com os vegetais ou como os cozinhar – porque nem sempre é um processo óbvio. Inclui uma variedade diferente de ingredientes, com passos diferentes, ao contrário da carne e do peixe, que com alguns temperos estão feitos”, completa.

Mas há mais: além de ensinar os clientes a confecionar alternativas de origem vegetal, a Venn Foods disponibiliza também “a culinária de diversos sítios do mundo que não é tão conhecida em Portugal”.

Todas as semanas, na segunda-feira, são disponibilizadas quatro receitas diferentes. Estas são preparadas pela chef e nutricionista da Venn Foods, a polaca Monika Bloch, que assegura que as refeições são completas e equilibradas.

“Cada pessoa pode escolher no mínimo dois kits, que podem ser da mesma receita ou de receitas diferentes, e um máximo de quatro; aí podem escolher um kit de cada receita”, explica Snider Rodrigues. As receitas ficam disponíveis até domingo, dia em que também encerra o prazo de encomenda. Na semana a seguir, recebem as caixas – isto porque, para evitar desperdícios, a Venn Foods encomenda os produtos aos fornecedores de acordo com o volume de pedidos.

As caixas são montadas e recheadas na sede da empresa, localizada na Rua de Fernandes Tomás, no Porto. A semana começa com trabalho logístico: nas segundas e terças, a equipa recebe e armazena os produtos entregues pelos fornecedores, sendo estes locais e nacionais. Nestes dias, tratam também de organizar e gerir os pedidos.

Quartas e quintas são os dias de montagem. No andar inferior da loja, os produtos que recebem são divididos, de acordo com as doses adequadas a cada receita, e distribuídos em embalagens próprias de vidro (que podem ser devolvidas, para depois serem reutilizadas) ou papel.

Na sede, manda a regra de “zero plástico” – por isso, até os cubos de gelo (que servem para acondicionar produtos que precisem de refrigeração) são envolvidos em papel. Na equipa de montagem costumam estar duas ou três pessoas: “Somos uma operação pequena, mas estamos à procura de formas de evoluirmos”, diz o cofundador.

As caixas seguem para os seus destinos às quintas e sextas, dependendo do volume de pedidos. A rede do movimento já cobre as áreas metropolitanas do Porto, Braga e Aveiro, tendo arrecadado uma lista de cerca de 300 clientes. Fora do Porto, as encomendas seguem através de distribuidoras, mas, na cidade, são feitas de bicicleta elétrica. É ainda possível levantar o kit na sede.

No que toca ao preço, dois kits ficam pelo valor de 25 euros; quatro, o número máximo de caixas possíveis de encomendar, custam 40 euros. No entanto, se o cliente optar por ir levantar o seu pedido presencialmente, recebe um desconto. Neste casos, a compra de dois kits fica pelo total de 22,50 euros e a de quatro a 36 euros.

Snider Rodrigues adianta que, num futuro próximo, têm em mente reformular o site. Para começar, pretendem incluir a opção de subscrição para que o cliente possa, se assim desejar, receber uma caixa semanal – uma alteração que entrará em vigor dentro de um mês, adianta Snider Rodrigues ao JPN. No horizonte está também a intenção de fazer entregas diárias, mas para isso ainda terão de ajustar o “modo de operação”.

Além disso, o jovem adianta que estão a trabalhar na construção de uma loja online para comercializar alimentos vegetarianos e vegan, “com enfoque em produtos portugueses, como manteiga de amendoim, fornecida por produtores locais, ou chocolate vegan”.  Nesta loja, também poderão vir a constar produtos pré-feitos, como molhos preparados pela chef da empresa, para “facilitar o processo de cozinhar” tanto nas receitas que concedem como noutras.

Empreendedorismo jovem por um país mais sustentável

A Venn Foods foi criada em 2020 e incubada na UPTEC – Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto, o que Snider Rodrigues diz ter sido “uma boa oportunidade para expandir o projeto” pela proximidade geográfica e com jovens estudantes. Tem apenas oito meses de funcionamento e nasceu de uma conversa entre três amigos, agora parceiros e gestores da plataformaSnider Rodrigues, natural do Dubai e residente no Porto, Julian Fernandes, natural do Canadá e Natacha Meunier, natural de Coimbra.

Conheceram-se num jantar no Porto e encontraram um objetivo comum: “pôr à distância do ecrã comida deliciosa, nutritiva e proveniente de origens éticas e sustentáveis”, uma missão que se pode agora ler no site.

Snider Rodrigues em frente à sede da Venn Foods, no Porto Ângela Pereira

Os jovens interessavam-se pela indústria agroalimentar e encontraram uma lacuna no mercado português. “A nossa filosofia é criar um serviço de comida sustentável, porque sentimos que é uma coisa cuja falta se nota muito em Portugal. Aquilo que existe vem pelo meio corporativo e de ‘greenwashing’, mas sinto que é uma mudança importante que deve ser feita a um nível basilar, envolvendo pequenos agricultores”, explica Snider Rodrigues.

Mas não se trata apenas da falta de um espírito verde na indústria da alimentação. “Neste momento, há uma tendência, um pouco por toda a Europa, onde as pessoas tentam comer mais comida vegan e vegetariana, ou comerem menos carne e peixe. São coisas importantes para o nosso sistema de alimentação, porque a forma como estamos a consumir agora não é sustentável“, explica.

Com formação em Administração de Empresas pela Wilfrid Laurier Univeristy, no Canadá, e em Engenharia do Ambiente pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), o cofundador da Venn Foods salienta que, neste aspeto, Portugal “não progride”, porque a “nossa cultura tem uma dieta muito rica em carne e peixe”. “Posso dar um exemplo: eu sou vegan e aqui no Porto não há muitas opções [para comer]. Claramente, a situação melhorou desde há cinco anos, mas continuo com poucas opções”, reitera.

Quanto à empresa, os vários objetivos passam, sobretudo, pela expansão. “Queremos chegar a Portugal inteiro, sobretudo a Lisboa. É um mercado amplo ao qual, neste momento, ainda não conseguimos aceder pelas limitações logísticas”, explica Snider Rodrigues. Contudo, sublinha que esperam conseguir condições em breve para atingir este fim.

Mas a Venn Foods garante ter preocupações que vão para lá do negócio em si – querem alterar mentalidades e hábitos de consumo. Como tal, para o futuro, têm como objetivo investir na tecnologia agroalimentar com a produção em ambientes controlados.

“Portugal tem sofrido com problemas relacionados com as alterações climáticas, como a seca”, diz o cofundador, referindo ainda que, à luz das situações criadas pela guerra, se gerou uma conversa internacional acerca da importância dos países terem produções independentes para não correrem riscos. “É possível recorrer a mecanismos como fazer crescer plantas dentro de água, no interior. E estamos a explorar estas opções como o passo seguinte a dar”, remata.

A longo prazo, é considerada a possibilidade de expandir para Espanha, uma decisão que depende da logística e dos fundos disponíveis, sobretudo devido ao tempo de vida dos frescos.

Artigo editado por Filipa Silva