Terceira edição foi encerrada na quinta-feira, com um espetáculo que reuniu no palco do Super Bock Arena - Pavilhão Rosa Mota centenas de jovens de 17 bairros do Porto. Beatbox, breaking, street basket, skate dance e surf são ferramentas para trabalhar confiança e ambição dos jovens.
O relógio marca 20h00, de quinta-feira (3). Perto do Palácio de Cristal, vê-se uma movimentação maior do que daquela que é comum num dia de semana. É dia de espetáculo na Super Bock Arena – Pavilhão Rosa Mota.
Os jovens e as crianças que fazem parte do programa municipal “Desporto no Bairro” sobem ao palco para mostrar o resultado final de um trabalho de quatro meses, em que diversas modalidades se unem numa só atuação.
Ao abrirem-se as portas, o público começa a entrar e a tomar lugar na plateia. O azul é a cor que ilumina o palco e reflete-se em todo o recinto. Pouco depois das 21h00, as luzes começam a apagar-se, o silêncio vai-se instalando na sala e é hora de dar início ao espetáculo.
Um espetáculo repleto de paixão e alegria
Ao ritmo da música, são apresentados os bairros que integram o programa. Este ano, são 17, mais três do que no ano anterior. Pouco depois, o público aplaude em uníssono os jovens finalistas da terceira edição do projeto. Cada modalidade do “Desporto no Bairro” – beatbox, breaking, street basket, skate dance e surf – é apresentada, numa fusão de coreografias onde o talento dos jovens é o foco.
Em palco, dezenas de miúdos e graúdos demonstram o trabalho que desenvolveram de junho a setembro deste ano. O resultado é fruto da partilha de conhecimento e de experiências entre mais de 900 jovens e crianças e alguns dos melhores profissionais das várias modalidades.
Os formadores que fazem parte do projeto são uma referência para os mais novos. Através do programa, propõem-se contribuir quer para a formação artística, quer para o desenvolvimento pessoal destes jovens. Paulo Maia é um desses professores. Conhecido por “Aiam”, pratica breaking “há genuinamente muitos anos” e, agora, tem a oportunidade de o ensinar a crianças e de “partilhar esta paixão com elas”, explica ao JPN.
Tendo sido, também, criado num bairro social no Porto, o professor de breaking encontrou no projeto um sentimento de nostalgia. Além disso, motivou-o a informalidade do programa, o “poder passar a mensagem de forma natural, sem incutir nenhum tipo de ‘eu sou o professor e tu és o aluno’, de uma forma tranquila”.
No decorrer do espetáculo, há música, boa disposição e muita energia. A conexão entre os jovens e a felicidade que sentem por estarem em palco são notórias. O sorriso de Micha é a prova disso. Faz parte do programa desde a primeira edição, sendo este um motivo de “muito orgulho” para o jovem de 13 anos. Pratica skate e breaking e confessa que, todo o processo o ajudou a “ter mais prática e mais talentos” para manobrar a tábua.
Também Risoleta Monteiro, de 18 anos, não deixa dúvidas da paixão que sente pela modalidade que pratica: “O breakdance é tudo”, diz ao JPN. Está no projeto desde a sua fundação e garante que o “Desporto no Bairro” é uma forma das crianças se “desviarem da realidade delas” e, com isso, “melhorarem coisas em si mesmas”.
Após as diversas atuações dos b-boys e das b-girls do projeto, as luzes enchem o palco de azul e amarelo. A Ukraine Breaking Team honra o seu país, com a coreografia “4 Better World”, numa apresentação que culminou ao som da música vencedora do festival da Eurovisão.
O espetáculo fechou com o espírito coletivo que faz parte do ADN do projeto: os grupos das diversas modalidades subiram ao palco para um flashmob de despedida de mais uma edição do “Desporto no Bairro”. O abraço coletivo e os sorrisos nos rostos dos jovens e dos formadores retratam o resultado final de um trabalho em que a partilha é a chave.
“Basta mudar a vida de um para valer a pena”
Com início em 2020, o projeto “Desporto no Bairro” começou por oferecer aulas de breaking em oito bairros sociais do Porto, envolvendo um total de 600 jovens. No segundo ano, juntou-se o surf e o skate, tendo o número de bairros subido para 14 e os participantes para 800. Este ano, o projeto chegou a ainda mais pessoas, contando com quase mil jovens.
No final do espetáculo, entre abraços e gargalhadas, crianças, jovens e formadores mostram a união que caracteriza o grupo. Para Max Oliveira, coordenador do projeto, o sentimento é de orgulho e “satisfação muito grande” ao presenciar a alegria dos jovens participantes. “Sinto-me honrado por poder ter este papel na cidade e na vida deles”, afirmou.
O coordenador do programa municipal realça, ainda, que o convívio de crianças e jovens é constante, sendo estes “de bairros que muitas vezes tinham até conflitos e rivalidades que aqui [no projeto] desaparecem completamente.”
No centro do grande grupo que salta enquanto grita pelo nome do projeto, está, também, Micha que partilha essa alegria: “Estou muito feliz e orgulhoso de mim mesmo”, realça o jovem. Risoleta, por sua vez, confessa que “foi uma longa caminhada”, tendo sido o espetáculo a prova de “evolução” de todo o grupo.
Embora o sentimento geral seja de satisfação, Max Oliveira considera que “o dever nunca é cumprido”. Para o coordenador, a parte mais desafiante é lidar com a “frustração inerente a este tipo de projetos”. “Em cada dois que ajudamos, há 20 que não conseguimos [ajudar]. É um processo lento”, no entanto, considera que “basta mudar a vida de um para valer a pena”.
Catarina Araújo, vereadora da Saúde e Qualidade de Vida, Juventude e Desporto, ao discursar no final do espetáculo, sublinhou que a iniciativa trabalha não só a autoestima e a confiança, como também “a parte do sonho”. A vereadora da Câmara Municipal do Porto acrescentou, ainda, que o programa pretende mostrar aos jovens que são “capazes de fazer um conjunto de coisas que se calhar não sonhavam fazer”.
A emoção de quem atua e de quem assiste
Já cá fora, assiste-se ao encontro entre os jovens e as suas famílias. O sentimento de alegria é geral, nos afetos que trocam com os familiares. Para Sandra Coelho, foi “extraordinário” ver os dois primos a atuar. “É um projeto fantástico para todas as crianças, não só sendo do bairro”, conclui.
Agora perto dos pais, Risoleta Monteiro não esconde a felicidade após o espetáculo: “Sinto-me orgulhosa de toda a equipa, de tudo aquilo que conquistamos até agora, porque foi a terceira edição.” “Todos melhoraram sempre alguma coisa, ainda mais com este espetáculo”, realçou a jovem. A mãe, ao lado, comenta o mesmo orgulho e conclui com um sorriso que “eles dão sempre o seu melhor”.
Promovido pela Câmara Municipal do Porto, através da Ágora – Cultura e Desporto, “Desporto no Bairro” mostrou à cidade, pela terceira vez, o talento que o programa consegue cultivar em tantos jovens. E, segundo Catarina Araújo, vai continuar a fazê-lo: “Para o ano vamos voltar”.
Artigo editado por Filipa Silva