O Teatro Nacional São João homenageou, no sábado (26), Ana Luísa Amaral com a leitura encenada de poemas que a poeta escreveu e traduziu. O JPN assistiu ao ensaio geral e esteve à conversa com o diretor e encenador, Afonso Santos, e com a atriz e amiga da escritora, Emília Silvestre.
No último sábado (26), as palavras da poeta Ana Luísa Amaral saíram do papel e ganharam vida no palco do Teatro Nacional São João (TNSJ), no Porto. “Diz toda a Verdade mas di-la oblíqua” foi um tributo à escritora falecida em agosto, aos 66 anos, que contou com a leitura encenada de alguns dos seus poemas e de obras que traduziu.
“É uma homenagem ao trabalho da autora, ao trabalho da tradutora e à pessoa: à sua humanidade e à forma como ela tocava os outros”, explica ao JPN Afonso Santos, responsável pela direção do espetáculo, após o ensaio geral da peça.
Para dar voz às palavras de Ana Luísa Amaral, estiveram em palco Emília Silvestre, Marta Bernardes, Pedro Mendonça e Pedro Barros, alguns dos atores do elenco de “Bruscamente no Verão Passado” – uma peça de Tennessee Williams, traduzida para português por Ana Luísa Amaral e que esteve em cena, pela primeira vez, no TNSJ, entre os dias 17 e 27 de novembro.
Os poemas lidos e interpretados na homenagem promovida pela Ensemble – Sociedade de Atores, juntamente com o TNSJ, foram selecionados pela ensaísta e professora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto Rosa Maria Martelo, “amiga pessoal e de infância da Ana Luísa”, como explicou também Afonso Santos.
Da compilação feita por Rosa Maria Martelo, fizeram parte poemas de autores “de quem a Ana Luísa gostava muito” e que “fez questão de traduzir”: Rainer Maria Rilke, Elizabeth Bishop, William Shakespeare e Emily Dickinson – autora da frase que deu título ao tributo e com quem Ana Luísa Amaral tinha “uma ligação muito forte”, tendo realizado a sua tese de doutoramento sobre a poesia da autora.
“Há um diálogo que está sempre a acontecer, entre os poemas dela e alguns poemas dessas autoras e autores”, afirma Afonso Santos.
“Uma pessoa culta, linda, ternurenta e absolutamente humana”
Emília Silvestre, atriz e amiga de Ana Luísa Amaral, acredita que dar voz às palavras da poeta passa por “interpretar o que ela [Ana Luísa Amaral] escreveu e dizê-lo o melhor possível, já que são poemas tão bonitos, que merecem o nosso [dos atores] cuidado e o nosso empenho”.
“Está tudo nas palavras dela, está tudo lá, e nós não temos grande coisa a fazer, a não ser transmiti-las ao público que nos ouve”, afirma a atriz, em conversa com o JPN, dois dias antes do espetáculo. Emília Silvestre confessa, ainda, ser “completamente fã da poesia” de Ana Luísa Amaral, referindo-se à amiga e colega como “um ser humano maravilhoso”.
Emocionada, a atriz lembra Ana Luísa Amaral como “uma pessoa culta, linda, ternurenta e absolutamente humana” e afirma ser “um prazer enorme” dar vida às palavras da poeta. “É pena perdemos as pessoas boas deste mundo e a Ana era uma pessoa muito especial, muito especial mesmo”, aponta Emília Silvestre.
“As palavras dela ficam, a poesia dela fica, as traduções dela ficam, o que significa que ela ficará sempre entre nós e isso é a grande vantagem de uma poeta como ela”, rematou Emília Silvestre.
Ana Luísa Amaral e uma vida dedicada às palavras
Nascida a 5 de abril de 1956, Ana Luísa Amaral nasceu em Lisboa mas viveu a maior parte da sua vida em Leça da Palmeira, Matosinhos. Além de poeta, foi também investigadora, ensaísta, ficcionista, tradutora e professora na Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
Durante a sua carreira, Ana Luísa Amaral fez um doutoramento sobre a poesia de Emily Dickinson e especializou-se em Poéticas Comparadas, Estudos Feministas e Estudos Queer.
A poeta foi distinguida com diversos prémios nacionais e internacionais, tais como o Prémio Vergílio Ferreira, o Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores e o Prémio Internazionale Fondazione Roma. Em 2021, foi-lhe atribuído o Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana.
A tradução de “Bruscamente no Verão Passado” será publicada em livro pelo TNSJ, naquele que poderá ter sido o último trabalho da poeta.
Como Emília Silvestre referiu ao JPN, Ana Luísa Amaral “bruscamente deixou-nos no verão passado”, tendo falecido a 6 de agosto deste ano, aos 66 anos, vítima de doença prolongada.
Artigo editado por Filipa Silva