O dia que assinala o 117º aniversário da livraria Lello (esta sexta-feira) foi marcado pela inauguração de uma das 42 cartas de Bob Dylan adquiridas em leilão, no final do ano passado. Mas, mais que isso, serviu para deixar no ar o compromisso de um futuro mais atento ao planeta, ao ambiente e à comunidade.

O mote escolhido para guiar o novo ano de vida da livraria é a sustentabilidade. Nesse sentido, a cerimónia arrancou com a revelação de uma instalação artística, à porta, da World Wide Fund for Nature (WWF, ou Fundo Mundial da Natureza, em português) – o Fish Motel.

Trata-se da ativação simbólica de um espaço “para os peixes fazerem aquilo que vocês sabem”, como explicou Ângela Morgado, diretora executiva da WWF. No âmbito do programa “Água Doce”, a ação, criada a convite da livraria para celebrar este dia, visa sensibilizar os transeuntes para o problema das barreiras obsoletas, que comprometem a biodiversidade (e não permite aos peixes “encontrarem-se para fazer aquilo”).

Já no interior do edifício, Aurora Pedro Pinto lançou, no discurso de abertura, os principais objetivos e projetos da livraria para o ano que começou. Estes, incidem sobretudo em seguir o caminho da “sustentabilidade ambiental, económica, social e cultural”. Em conversa com o JPN, Aurora Pedro Pinto completa que “seguir o caminho da sutentabilidade” é uma forma de sentir que “efetivamente” têm um “objetivo” para o futuro, que pretendem aplicar na produção, nas coleções e na comunidade interna.

Da cerimónia, destaca-se a atribuição do Selo Borboleta, concedido a marcas de luxo, retalhistas e fornecedores que atendem aos padrões de desempenho sustentável (ESG+ verificado), pela Positive Luxury, uma organização que quer ajudar empresas a adaptarem-se à economia climática. “É um orgulho e uma felicidade porque somos a primeira marca em Portugal a alcançar este selo e a primeira do mundo na área cultural“, anuncia a administradora da livraria.

Com a atribuição deste selo, a livraria assume um aumento do compromisso e da responsabilidade por investir em alternativas sustentáveis e pela produção de livros em parceiros certificados.

Durante a celebração, foram ainda lançadas duas linhas de edições originais: a primeira, de romances distópicos (“1984” e “A Guerra dos Mundos”) com capas concebidas pelo artista norte-americano Mike Perry; a segunda, é o livro institucional da livraria.

A cerimónia contou ainda com a presença e discurso de Nuno Fazenda, secretário de Estado do Turismo, Comércio e Turismo, Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto e Diana Verde Nieto, fundadora e diretora da Positive Luxury.

O “sonho e paixão” de Bob Dylan que representam a Lello

Em novembro do ano passado, a livraria investiu mais de meio milhão de euros na compra de 42 cartas de amor escritas à mão pelo músico e prémio Nobel da literatura norte-americano Bob Dylan. Escritas na década de 1950, estes documentos, comprados num em leilão Nova Iorque, são dirigidos à sua namorada da época, Barbara Ann Hewitt.

Quando questionada sobre o que motivou a compra das cartas, Aurora Pedro Pinto respondeu prontamente “sonho e paixão”. Completa que “são os ingredientes que mais fazem parte do ADN desta casa”, da mesma forma que estão presentes nos manuscritos. Inauguram-se no mesmo dia que a livraria centenária celebra o seu aniversário porque, de acordo com a administradora, foram um dos “arrojos e sonhos de 2022”. Como tal, “fazia todo o sentido” ligar as celebrações e ver “a vida delas começar em 2023”.

O manuscrito, inserido numa instalação com o nome “From Dylan With Love”, vai estar exposto até abril. A campânula que o acolhe, repleta de reflexos, pretende dar vida ao conceito de “sendo um é-se muito, sendo um é-se infinito”.

Por agora, está exposta apenas uma carta, “para dar um cheirinho”.  Como “tesouro de valor incalculável”, não podem ser apresentadas todas “porque precisam de ser analisadas, compreendidas e curadas de um modo adequado”, diz.

Bob Dylan (na altura ainda Robert Allen Zimmerman) escrevia à parceira sobre coisas triviais, o que confere às cartas um caráter muito pessoal. “Ele está ali apresentado de uma forma íntima, crua, revelando-se ao mundo“, diz a administradora da livraria.

Nos documentos está descrito que “o seu maior sonho era viver da música, vender um milhão de discos, e ter um nome que fosse um nome bom para o mundo da música”, explica. Para Aurora Pedro Pinto, “têm uma forte premonição e são mesmo o embrião do que foi e do que é a música” do artista, que mesmo em adulto, continuou a ser “o mesmo jovem apaixonado e sonhador”.

Artigo editado por Paulo Frias