Dezoito é o número de estruturas, de norte a sul do país, que ficaram excluídas dos apoios bienais da Direção Geral das Artes (DGArtes). Treze das entidades lesadas avançaram com uma providência cautelar contra o Ministério da Cultura, alegando desequilíbrio na proporcionalidade do concurso e falta de imparcialidade nas decisões. 

O “Programa de Apoio a Projetos – Criação”, concebido pelo organismo do Ministério da Cultura (MC), encarregue pelas artes em Portugal,  foi lançado a 29 de dezembro do ano passado. As candidaturas abrangeram duas modalidades, a bienal e a quadrienal, e foram oficialmente encerradas no dia 6 de fevereiro. Em causa estava uma verba de 5 milhões e 250 mil euros, cuja distribuição seria feita pelas várias instituições candidatas.

A proposta bienal é aplicada às entidades profissionais com mais de quatro anos de atividade continuada. Já as entidades que se candidataram à proposta quadrienal, devem ter, pelo menos, seis anos de atividade profissional continuada, assim como beneficiar de apoio financeiro da DGArtes há pelo menos quatro anos e deter um espaço de criação e/ou apresentação.

Sobre a distribuição dos apoios, Fernando Pereira, um dos diretores da companhia portuense Astro Fingido, entidade envolvida na apresentação da providência cautelar, explica, em declarações ao JPN, que, a meio do processo, a DGArtes detetou um número de candidaturas aos quadros quadrienais muito superior aos bienais – “mais do que o normal”, inclusive.

A divisão percentual, estabelecida inicialmente, atribuía 60% para os apoios quadrienais e 40% para os bienais. Porém, dado o volume de candidaturas, o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, procedeu ao reforço da verba atribuída à modalidade quadrienal.

Por essa razão, de acordo com o comunicado cedido ao JPN pela companhia Cegada, também uma das envolvidas no processo, das referidas estruturas excluídas treze apresentaram uma “providência cautelar de suspensão parcial dos efeitos da decisão do concurso” – que foi já admitida pelo Tribunal de Lisboa.

O grupo de teatro Astro Fingido também participa na providência cautelar. (Imagem cedida pela companhia) Foto: DR Paulo Pimenta

As dezoito estruturas alegam, no referido comunicado, que a deliberação do ministro “foi tomada com base no conhecimento das candidaturas apresentadas, em violação do princípio da imparcialidade”. Rui Dionísio, diretor da companhia Cegada, aponta que o ministro “dobrou a dotação dos quadrienais” – e, desta forma, a medida “desequilibra o concurso durante o próprio concurso, porque não mantém a mesma proporcionalidade percentual inicial”, explica.

Uma luta contra a atual “realidade artística nacional” 

companhia Cegada, sediada em Lisboa, tinha inicialmente pensado elaborar uma candidatura para a dotação quadrienal, por reunir “todas as condições para isso”, segundo Rui Dionísio. A estrutura reside num Teatro Municipal, assegura postos de trabalho fixos e ascende os 17 trabalhadores. No entanto, para não incorrer “o risco de sofrer alguma interrupção no financiamento”, acabou por alterar o rumo da candidatura, concorrendo aos quadros bienais.

Porém, pela alteração do regime do concurso, ficaram de fora. Nas palavras do diretor, “a Cegada sente-se particularmente usada porque se tivesse concorrido aos quadrienais teria sido uma das entidades apoiadas”, até porque tem “uma classificação superior ao último classificado quadrienal”.

As estruturas excluídas dos apoios integram artes visuais, cruzamentos disciplinares, circo, artes de rua, dança, música, ópera, programação e teatro. Algumas estão ainda numa fase inicial do seu crescimento, ficando agora “com a vida completamente em suspenso, em termos de desenvolvimento da atividade continuada”, salienta o diretor da Astro Fingido. Mas a apreensão não fica por aqui: “o concurso pode ser prorrogado por mais quatro anos“, esclarece Fernando Pereira. 

Algumas das estruturas manifestaram interesse em assinar a providência cautelar, mas não o fizeram por questões de ordem económica. “Esta é a realidade artística nacional”, afirma o diretor da Astro Fingido. 

No Porto, em resposta aos jornalistas, Pedro Adão e Silva afirmou que as entidades apenas solicitaram um encontro depois de porem em prática a ação judicial, mas Fernando Pereira desmente a acusação. “Vários grupos, sem terem ainda a lógica da providência cautelar, tiveram reuniões, em que ele, entre sorrisos e uma atitude aparentemente muito correta, disse que não ia fazer nada. Não assumiu o erro”, conta o diretor.

O ministro da Cultura ressalva ainda, revela o Público, que o número de estruturas apoiadas pela Direção geral das Artes, este ano, passou de 186 para 212 e que o montante atribuído às entidades consagradas pelos apoios mais que duplicou. 

Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira