Ainda que o arranque oficial tenha ocorrido na quarta-feira, os desfiles do Portugal Fashion (PF) começaram hoje (16) numa nova casa – uma antiga garagem, na Rua Latino Coelho. O “edifício completamente improvável”, como diz Mónica Neto, diretora do evento, ao JPN, mistura moda e um cenário vintage, de abandono e graffitis. O público é, portanto, convidado a entrar nesta atmosfera e numa nova era do certame.

Deixando o emblemático espaço da Alfândega do Porto, o Portugal Fashion apresenta o “quartel general num novo espaço”, explica a diretora. Desta forma, torna-se possível mostrar que a moda se apresenta de várias maneiras, sem perder força – até num antigo espaço abandonado.

A redução de orçamento e o clima instável da época são algumas das razões apontadas para a procura do novo palco – cedido graças à parceria com o proprietário. Ao JPN, Mónica Neto afirma que sabiam “que havia aqui um desafio de produção enorme”. “Havia a necessidade de trabalhar o espaço de uma forma mais crua, mais urbana e que podia não ser consensual”, acrescenta.

Conta que, “à primeira vista”, a organização sentiu que a garagem seria um dos espaços a usar nesta edição – acabando, no fim, por se tornar o palco principal. No entanto, mantiveram-se outros eventos espalhados pela cidade, dando continuidade à “estratégia de dispersão” iniciada na edição passada.

O objetivo é proporcionar “interação (da moda) com a cidade e, no fundo, trazer a moda para rua”, explica a representante do PF. Há, porém, novidades: como apresentações no NorteShopping, em Matosinhos, no El Corte Inglés de Gaia e no Porto Fashion Outlet, em Vila do Conde – que junta a alta costura e o fast fashion.

No final do primeiro dia de passerelles, que assinala o segundo do certame, o espaço superou as expectativas: tanto do público, como da diretora do certame. “O feedback que estamos a ter e o resultado que estamos a sentir também da parte dos profissionais envolvidos é positivo. Portanto, estamos contentes”, conclui. Aliás, o cenário citadino acabou por servir como complemento das exibições, sobretudo do BLOOM.

As chaves da inteligência artificial de House of Wildflowers

Os desfiles da plataforma BLOOM (iniciativa que surge para tornar exibições num ambiente mais informal, urbano, multiartístico e até performativo), conhecida como rampa de lançamento de jovens designers, fluíram em harmonia com o edifício durante a tarde.

O grande destaque do dia foi a coleção “O triunfo de Vénus” de Amir Shavit. É a segunda vez que o designer israelita participa e deu uso ao mote da campanha do Portugal Fashion – a inteligência artificial (IA).

“Amo-te porque foste a primeira pessoa que falou comigo, que me deu atenção. Foste a primeira pessoa que se preocupou”. Segundo o designer, estas são as palavras que um robô, com IA, disse a uma pessoa que falava por chat. E é aqui que surge a inspiração para a coleção. “Nos últimos tempos, a tecnologia tomou o centro das nossas vidas diárias. [É] uma hipnotização que se cruza com novas oportunidades, mas também com medos e questões éticas”, conta ao JPN.

 Amir Shavit, fundador da marca House of Wildflowers, fez várias pesquisas com um chat de IA “para descobrir que tipo de visuais criaria para personagens fictícias”. “O resultado está refletido na coleção, que combina este mundo, apaixonado e doce e de momentos despreocupados, colidindo com as imagens semi-perturbadoras” criadas pela plataforma, afirma.

A coleção mistura silhuetas, padrões, tons pastel e elementos de segunda-mão – peças de metal usadas e chaves de gavetas -, “para misturar o novo e o antigo”, explica. Mas a verdadeira chave foram os estampados, criados pelo designer usando a inteligência artificial. Assim, a coleção apresenta uma visão futurista retorcida com a identidade queer e suave, típica da marca. 

O universo masculino e a nostalgia de infância das vencedoras do BLOOM

Recorrendo ao cenário urbano da nova era do PF, também a vencedora  da edição de março do ano passado do concurso BLOOM, Andreia Reimão, voltou a apresentar um vestuário clássico, focado no menswear.

“A ideia era continuar com a mesma identidade, mas trazer um novo conceito”, afirma. A coleção foi inspirada em anúncios de roupa interior masculina e meias dos anos 1920 – com gravatas, pelo e rendas. Ao JPN, a designer explicou que “a lingerie masculina perdeu-se ao longo do tempo e quis explorar este universo”. Além disso, quis trazer algo novo, através de pérolas e brincos de corações. “A ideia foi brincar”, afirma.

Kaya Magalhães, que venceu a menção honrosa, apresentou agora a coleção “Only Lovers Left Behind” – inspirada na infância, mas no estilo romântico e oversized a que já nos habitou.

Os modelos apresentados são coloridos, com muitos folhos, laços e rendas. A designer afirma que “quis fazer a junção dos dois mundos”: “ a parte mais princesa aliada à parte mais vampira – a princesa que vai sair à noite”.

Ambas as designers apresentaram quatro modelos, enquadrando-se neste novo conceito de apresentação de coleções do Portugal Fashion. Ao invés de um desfile de moda convencional, os modelos de cada coleção estavam dispersos pelo espaço e em interação com o público.

Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira