Uma equipa de investigadores do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S) descobriu que alterações na composição dos glicanos (isto é, açúcares) à superfície das células confundem o sistema imunitário e desencadeiam doenças autoimunes, tais como o lúpus. Com o achado, a equipa, liderada pela cientista Salomé Pinho, coordenadora do grupo “Immunology, Cancer & GlycoMedicine”, demonstrou que há possibilidade em reparar esta alteração e, assim, prevenir o desenvolvimento da doença.

Em declarações ao JPN, Inês Alves, primeira autora do estudo, afirma que o um dos objetivos do estudo é “trazer melhor qualidade de vida aos pacientes”. Tratando-se de uma doença sem cura, existem apenas condutas de tratamento que auxiliam na redução de crises e na diminuição de recaídas, atenuando assim os sintomas. Com esta descoberta, surge a possibilidade de “trazer novas terapias para entreajudar as já existentes” e, desta forma, “tentar, ao menos, prevenir a recidiva [isto é, o retorno da atividade] da doença”, acrescenta a investigadora.

Em condições normais, o sistema imunitário protege o corpo humano de microrganismos invasores como vírus e bactérias, e de doenças em geral, através da produção de anticorpos e determinados tipos de células, como os linfócitos. Contudo, há casos atípicos em que o sistema imunitário “confunde” as células do próprio corpo com agentes invasores e ataca-as, em vez de as proteger, estimulando um processo inflamatório crónico – como é o caso do lúpus.

A patologia afeta milhões de pessoas pelo mundo e é uma doença autoimune complexa. Ataca qualquer parte do corpo, incluindo rins, cérebro, coração, pulmões, sangue, pele ou até articulações.

Dos pacientes diagnosticados com a doença autoimune, 90% são mulheres entre os 15 e os 45 anos – isto é, na sua fase mais ativa e produtiva. Inês Alves confessa que uma das principais razões que a motivou a participar no estudo foi, precisamente, “ser mulher”. “Sou investigadora mulher. Pessoalmente achei importante estudar uma doença que nos incapacita, maioritariamente, a nós, mulheres”, afirma.

Divulgação como prova que dinheiro das investigações “não é um fundo perdido”

O estudo foi publicado na revista científica Science Translational Medicine”. Mais ainda, foi-lhe atribuído um dos sete prémios de inovação, no valor de 280 mil euros, da associação norte-americana Lupus Research Alliance (LRA), a maior agência de financiamento não governamental, sem fins lucrativos, de investigação sobre lúpus a nível global.

Para Inês Alves, foi um “grande reconhecimento ser o único projeto europeu distinguido”, sendo que a associação “normalmente distingue grupos de investigação americanos”. A conquista deste prémio foi assumida com orgulho, mas acima de tudo acarreta “ uma grande responsabilidade”. “Pretendemos honrar com mais investigação e mais descobertas que permitam melhorar a qualidade de vida dos nossos pacientes”, assegura.

A investigadora salienta, ademais, a relevância da publicação do estudo numa revista científica prestigiada. “É mesmo importante mostrar que o dinheiro que vai para a investigação não é um fundo perdido”, conclui.

Artigo editado por Ângela Rodrigues Pereira