“O que significa ter oito anos?”, foi com esta pergunta que Rui Tavares deu início à “Miniconferência sobre a Democracia“, uma iniciativa da 10.ª edição do Cultura em Expansão, organizada pela autarquia do Porto.

O colóquio destinava-se a crianças, mas ao Auditório do Grupo Musical de Miragaia, no passado domingo (dia 3 de abril), também acorreram muitos adultos que queriam ouvir o que o deputado da Assembleia da República e líder do partido LIVRE tinha a dizer sobre o tema.

Num palco com uma fotografia do planeta Terra no fundo, Rui Tavares, que é também professor, historiador e escritor, falou da história deste sistema político e de personalidades que fizeram parte dela, como os filósofos Al Farabi e Aristóteles, a dramaturga e ativista Olympe de Gouges, e Eleanor Roosevelt, antiga primeira dama dos Estados Unidos da América.

De uma forma acessível, Rui Tavares apresentou a ideia de que o ser humano é um ser político. Explicou que, de acordo com Aristóteles, este é um sistema onde os mais fortes podem acabar por “mandar” nos mais fracos, mas que, como realça Al Farabi, todos temos uma palavra a dizer na democracia, desde que seja reconhecida a dignidade humana – hoje conhecida como Direitos Humanos.

A democracia vale a pena mas enfrenta alguns riscos

Em conversa com o JPN, Rui Tavares afirma que a democracia é o melhor sistema político porque é “aquele que mais tem em conta a dignidade absoluta de cada ser humano“. Contudo, há sinais de que hoje existem alguns riscos para a democracia. A taxa de abstenção nas legislativas de 2022, por exemplo, foi de 42% segundo a Pordata, representando a terceira mais elevada de sempre.

Ao JPN, o historiador refere que “hoje em dia o principal risco que corremos é termos uma ideia demasiado simplista da democracia como sendo apenas e só centrada nas eleições e na maioria, e portanto a ideia de que porque a maioria manda, a maioria seja imutável”. Esta perceção errada dá “origem a regimes que, ainda que não sendo inteiramente ditatoriais, são regimes que podemos chamar de maioritáristas, e que desprezam tanto os direitos humanos como o Estado de Direito”, diz o professor universitário, dando o exemplo da Hungria.

Rui Tavares foi deputado no Parlamento Europeu de 2009 a 2014. Nesse ãmbito, apresentou um relatório sobre o caso político húngaro, em 2013, e tem alertado, nos últimos dez anos, para o crescimento destes poderes, pois podem levar a que se perca a democracia na Europa, tal como aconteceu na primera metáde do século XX. O político alerta ainda que estes sistemas são “contagiosos”, pois os países inspiram-se uns nos outros, e que a democracia é muito difícil de reconquistar uma vez perdida.

No final, o deputado afirmou que todas as pessoas têm algo a acrescentar na democracia, exemplificando com as ações que cada um pode fazer pelo clima.

O papel das universidades na construção da democracia

Relativamente aos jovens universitários, Rui Tavares afirmou que as universidades podem ser uma ponte para a democracia, em particular, se as instituições forem buscar “aquilo que é de mais fundamental numa universidade, que é ser um lugar para as ideias.”

O professor afirma que motiva os seus alunos e alunas a olhar para além das notas e do diploma, e a aperceberem-se que é um “privilégio” terem um “espaço e um tempo na nossa vida para as ideias”, e que a democracia também é uma ideia “de que nós nos conseguimos organizar e distribuir o poder da forma mais equilibrada possível, pelo máximo de pessoas possíveis”.

Quando questionado se vale a pena os jovens universitários ainda exercerem ativismo e democracia, o deputado respondeu: “Eu creio que só isso vale a pena”.

Rui Tavares mencionou também as pessoas que fizeram sacrifícios para chegarmos a este estado democrático, e como a democracia e o ativismo são “uma forma de conquistar um mundo desejável“. Acrescentou ainda que “se nós não exercermos a democracia, nós perdemos a democracia; e portanto ela precisa de cada um e cada uma de nós”. Rui Tavares acrescentou que falta diálogo sobre os objetos de desejo político e do que é, no seu entender, uma sociedade justa.

A “Miniconferência sobre a Democracia” foi apresentada pela primeira vez em 2019, no Teatro Luís de Camões, em Lisboa. A iniciativa tem como objetivo apresentar o mundo a um público mais jovem. A programação até dezembro de 2023 do Cultura em Expansão pode ser consultada no website oficial.

Artigo editado por Miguel Marques Ribeiro